Reginald acordou com água escorrendo pelo rosto, o frio latejando em sua pele como agulhas de gelo. Piscou algumas vezes, tentando entender onde estava. A luz que anunciava o fim da manhã penetrava por entre as copas das árvores e iluminava parcialmente o rosto de Damián, que o observava com um sorriso triunfante. Mas havia algo nos olhos dele — um leve tremor, uma hesitação escondida sob a máscara de arrogância.— Finalmente acordou, lorde miserável... — murmurou Damián, puxando-o brutalmente pelos cabelos, forçando-o a ficar de joelhos no chão úmido. A arma de fogo pressionada contra sua têmpora com força, e dois brutamontes o vigiavam a poucos passos, imóveis como estátuas sombrias.Reginald tentou reagir, mas as mãos estavam presas com lacres de plástico. O gosto metálico do sangue invadia sua boca, oriundo de um corte no lábio inferior. Sentia também um leve latejar na nuca — provavelmente fora nocauteado antes de acordar ali.O local onde eles se enco
Uma força invisível não quis que Reginald morresse. Talvez o acaso, ou quem sabe o destino, o tenha favorecido naquele instante em que decidiu guardar o canivete no bolso de trás da calça. Foi esse pequeno gesto que lhe deu uma chance. Quando tudo parecia perdido, conseguiu escapar. Vagou pela mata, exausto, faminto, o corpo machucado, mas a mente fixa em sobreviver. Até que um motorista passou pela estrada e, sem fazer perguntas, lhe ofereceu carona. Apenas ajudou. E isso bastou.Ao chegar à mansão, Reginald entrou pelos fundos, os passos trêmulos, o corpo à beira do colapso. Diante do quarto onde Geoffrey estava abrigado, desmaiou. Quando acordou, já estava deitado na cama que antes pertencia a Geoffrey. Estava coberto, limpo e com água ao lado. Os dias seguintes foram de recuperação. A febre cedeu, as forças começaram a retornar. Cada refeição era um passo de volta à vida.No apartamento, os dias de Evelyn passavam em silêncio. Dias em que até o som do vento parecia
Evelyn aprendeu cedo que o mundo não oferece garantias — apenas escolhas difíceis e silêncios que gritam. Órfã desde a infância, ela carregava no peito a solidão como uma segunda pele. Trabalhava incansavelmente em uma lanchonete na cidade, servindo cafés e hambúrgueres para clientes que nunca olhavam duas vezes. À noite, estudava com a luz fraca de uma lâmpada emprestada e dormia em um quarto minúsculo, cujas paredes finas não abafavam os sons alheios. Então, em um dia de chuva, conheceu Donovan.Ele começou a frequentar a lanchonete, aparecia sempre ao final do expediente, com seu capacete sujo de poeira e um sorriso que parecia pertencer a um mundo melhor. Os encontros começaram com trocas tímidas de palavras. Depois vieram os cafés divididos, os risos fáceis, e por fim, os beijos escondidos nos becos iluminados apenas pela lua. Evelyn se apaixonou com a entrega desesperada de quem já não acreditava que aquilo fosse possível. Donovan era o único farol em sua escuridão constante.Ca
"O FUTURO ÀS VEZES CHEGA DISFARÇADO: DE CAFÉ OU DE SORRISO" C.R.SANTOS Evelyn acordou com a chuva forte batendo na janela do pequeno quarto que alugava no subúrbio de Bell Buckle, no Tennessee. Olhou as horas no pequeno relógio da mesa de cabeceira e percebeu que ainda faltava meia hora para se levantar, mas já não conseguia mais dormir. Levantou-se e foi tomar um banho.Uma hora depois, estava dentro do trem a caminho do Daisy's, uma charmosa lanchonete com estilo anos oitenta, onde trabalhava. Olhando pela janela, avistou uma mulher com duas crianças caminhando pela calçada. O grande guarda-chuva protegia os três. A menina mais nova carregava uma mochila rosa nas costas, o objeto parecia maior que ela, deixando-a um pouco curvada para frente. Órfã de pai e mãe, Evelyn nunca conheceu aquela sensação de proteção que toda mãe deveria ter po
Eram quase oito e meia da manhã quando Donavan despertou. O calor do corpo de Evelyn ainda envolvia seus sentidos, e a lembrança da noite maravilhosa de amor o fez sorrir. Há muito tempo não sentia aquela mistura de liberdade e autonomia. Com cuidado para não acordá-la, saiu da cama, calçou os chinelos e vestiu o roupão. Antes de sair do quarto, ficou ali, parado, admirando-a. Evelyn dormia tranquilamente, sua respiração suave, os fios de cabelo espalhados pelo travesseiro. Uma pontada no estômago o atingiu. O peso do passado sempre voltava, e ele se condenava por não ter contado toda a verdade a ela.— Espero que um dia você me perdoe, minha Evelyn... Queria ter te conhecido antes das decisões que tomei — sussurrou, sua voz carregada de arrependimento.Seguiu para a cozinha, sentindo falta dos cafés da manhã londrinos. Por mais que quisesse esquecer sua vida passada, certos hábitos eram difíceis de abandonar.Enquanto preparava o café, Evelyn acordou ao escu
O tempo passava lentamente, e Evelyn se arrastava com ele. Alguns dias depois, retornou ao trabalho, tentando esquecer sua dor. Mas a saudade rasgava seu peito a cada manhã, a cada vez que se levantava, e nas longas noites mal dormidas. Alguns fregueses a olhavam com dó, outros trocavam palavras de encorajamento. O xerife entrava todos os dias para tomar um café e perguntar como ela estava indo. "Conforme o tempo", ela respondia, agradecida, mas vazia.Os dias seguiam, e as contas começaram a se acumular. A conta do hospital, o aluguel da casa, as dívidas... Sem seguro e sem conseguir localizar o responsável pela tragédia, tudo estava se agravando. O dono da casa onde morava exigiu que ela desocupasse o imóvel. Sem alternativas, Evelyn retornou ao antigo quarto alugado, aquele lugar onde nunca imaginara que voltaria.Ainda fechada em sua dor, tentando lidar com a perda, algo inesperado aconteceu. Após um longo expediente na lanchonete, Evelyn desmaiou. A out
Os dias pareciam se arrastar na rotina árdua de Evelyn. Depois do telefonema que a abalou, ela havia decidido não fazer o aborto. Algo em seu interior dizia que os sobrenomes coincidiam por mais do que simples acaso. Havia algo mais por trás disso, algo que ela precisava descobrir. A verdade estava ao seu alcance, e ela sentia que não poderia ignorá-la.Era uma manhã comum, e Evelyn estava preparando o café, quando o som da campainha quebrou sua concentração. Um freguês havia chegado. Ela não se virou, mas, com a voz firme, falou:— Pode sentar, já irei atendê-lo.Ela viu Beth, a atendente mais velha, ajeitando os cabelos e passando batom, como sempre fazia antes de ir para o atendimento. Com rapidez, ela pegou o bloco de notas e foi até o cliente, mas retornou logo depois, com um olhar carregado de desagrado.— Ele quer ser atendido por você — disse, seu tom de incompreensão evidente. — E ainda falou o seu nome.Evelyn franziu a testa, um desconforto imediato a percorrendo. Ela olhou
Lorde Reginald Alistair Ashbourne entrou na pequena delegacia da cidade com passos firmes e decididos. O lugar era simples, com poucas mesas e uma cela nos fundos. Um homem que estava preso olhou para ele, fez uma careta de desagrado e se virou, fechando os olhos contra a parede, como se preferisse ignorá-lo.O xerife, um homem de aparência robusta e já envelhecido, levantou os olhos e o observou de cima a baixo, tentando entender o que alguém tão bem vestido faria em uma cidade tão pacata como aquela.— Pois não, senhor? — perguntou, com um tom de curiosidade, avaliando cada detalhe do visitante.— Boa tarde, xerife. Meu nome é Reginald Ashbourne — disse ele, com uma voz grave e autoritária. — Estou à procura de meu sobrinho... E, de acordo com a garçonete, o homem enterrado... — Ele hesitou, como se ainda tentasse acreditar no que estava dizendo. — Donovan Motter Ashbourne. Preciso que exumem o corpo para realizar um teste de DNA.O xerife levantou-se da cadeira, colocou as mãos nos