Mundo ficciónIniciar sesiónCapítulo 4
O carro preto permanecia parado do outro lado da rua, seu motor desligado. Beatriz observava da janela, o coração batendo contra as costelas como se quisesse escapar de seu peito. Ela sabia que Denis estava ali, ou pelo menos seus capangas. Ele nunca fazia o trabalho sujo sozinho, preferia enviar homens para intimidar, ameaçar, e quando necessário, destruir. — Eles não vão demorar para agir — Yago murmurou ao lado dela, com a voz firme e baixa. Ele já havia passado por situações assim antes, e sabia que o tempo agora era um recurso tão precioso quanto a munição que carregava. Beatriz engoliu em seco e afastou-se da janela. Ela não queria parecer fraca, mas o medo era como um animal faminto dentro dela. — O que vamos fazer? — perguntou, sua voz soando mais forte do que ela se sentia. Yago se virou para ela, segurando a arma com firmeza. Ele não queria que ela se envolvesse mais do que o necessário, mas também sabia que Beatriz não era mais a mulher assustada que fugia de Denis sem um plano. — Precisamos de uma saída alternativa. Eles acham que estamos encurralados aqui dentro, então vamos usar isso contra eles — ele disse, seus olhos castanhos faiscando com determinação. Beatriz respirou fundo, tentando manter o foco. Sua mente trabalhou rapidamente, relembrando os detalhes da casa. Ela havia reparado em uma porta nos fundos, que levava a um beco estreito. Talvez fosse uma chance. — Tem uma saída atrás da cozinha — disse, apontando na direção. Yago assentiu. Ele confiava na observação dela. Antes que pudessem se mover, no entanto, o som de passos ecoou do lado de fora. Toc. Toc. Toc. Alguém bateu na porta da frente. Beatriz estremeceu e trocou um olhar rápido com Yago. Ela já conhecia aquele tipo de batida. Não era um pedido para entrar. Era um aviso. — Eu sei que vocês estão aí. A voz grave e carregada de arrogância fez Beatriz se encolher instintivamente. Denis. Ele mesmo. Ele não havia mandado apenas seus capangas. Estava ali, do lado de fora, como um predador esperando pacientemente sua presa sair da toca. Yago apertou os lábios. Ele odiava o tipo de homem que Denis era. O tipo que usava o medo como arma, que acreditava que tudo e todos lhe pertenciam. Mas ele também sabia que, para lidar com homens assim, era preciso mais do que coragem. Era preciso estratégia. — Você não precisa fazer isso, Denis — Yago respondeu, erguendo a voz para que fosse ouvido. Um riso curto e cruel veio do outro lado da porta. — Você acha que pode me dar lições, mendigo? Você não tem ideia do que está enfrentando. Yago olhou para Beatriz. Seus olhos estavam cheios de pavor, mas também de uma chama que ele não havia visto antes. Ela estava assustada, mas não quebrada. — Beatriz, querida — Denis continuou, sua voz adotando um tom falso de doçura — você não pode fugir de mim. Você sabe disso. Você sempre soube. Beatriz fechou os olhos por um momento, sentindo a raiva subir em sua garganta como um grito preso. Ela abriu os olhos novamente e deu um passo para a frente. — Eu não sou mais sua prisioneira, Denis — disse, sua voz soando mais firme do que ela imaginava. Do lado de fora, o silêncio foi absoluto por um segundo. Então, um ruído baixo e ameaçador se fez ouvir. — Tão ingrata… — Denis murmurou. — Mas tudo bem. Eu sempre soube que teria que te ensinar sua lição novamente. Um estrondo sacudiu a porta. Denis e seus capangas estavam tentando arrombá-la. — Vamos! — Yago puxou Beatriz pela mão e correu para os fundos da casa. Eles atravessaram a cozinha apressadamente, Yago já destrancando a porta dos fundos. Mas antes que pudessem sair, um segundo estrondo soou, e a madeira da porta da frente se partiu. — Depressa! — ele sussurrou, puxando-a para fora. O beco era apertado, com muros altos de ambos os lados. O cheiro de lixo velho se misturava com o ar frio da noite. Beatriz engoliu o desconforto e continuou seguindo Yago. Atrás deles, vozes iradas ecoavam dentro da casa. — Eles fugiram! — Encontrem os dois! Yago apertou o passo, guiando Beatriz por entre as sombras. Ele conhecia os becos daquela cidade como a palma da mão e sabia que, se conseguissem chegar até um dos armazéns abandonados, teriam tempo para se reagrupar. — Você está bem? — perguntou, sem parar de andar. Beatriz assentiu, ainda sentindo o coração disparado. — Sim. Mas não podemos continuar fugindo para sempre. Yago olhou para ela de soslaio. Havia verdade naquela afirmação. Denis não pararia. Ele não aceitaria a derrota. — Eu sei — ele murmurou. Eles continuaram correndo até que, finalmente, chegaram a um armazém abandonado no fim do beco. Yago empurrou a porta de metal enferrujada e a fechou atrás deles. Beatriz se encostou em uma pilha de caixotes velhos, tentando recuperar o fôlego. — O que fazemos agora? — perguntou, olhando para Yago. Ele passou a mão pelo cabelo, pensativo. — Nós nos preparamos. Isso não acabou. Na verdade, está apenas começando. Do lado de fora, Denis e seus homens caminhavam pelas vielas escuras, seus olhos atentos a qualquer movimento. A lua iluminava fracamente os becos sujos da cidade, onde sombras se estendiam como espectros ameaçadores. O som distante de sirenes ecoava na noite, mas nenhum deles se importava. Estavam focados em um único objetivo: encontrar Beatriz. Um dos capangas, um homem de cabelos desgrenhados e olhar inquieto, parou e olhou para Denis. — Eles não podem ter ido longe — murmurou, varrendo a área com os olhos. Denis respirou fundo, absorvendo o cheiro da umidade e da sujeira ao seu redor. Ele não estava com pressa. Beatriz poderia fugir, se esconder, correr para onde quisesse. Mas, no fim, ele sabia a verdade: ela nunca estaria livre. Um sorriso cruel surgiu em seus lábios enquanto ele percorria o olhar pelas sombras que se estendiam nas ruas. — Pode correr o quanto quiser, Beatriz — ele murmurou, com a voz carregada de arrogância e certeza. — Mas eu sempre vou te encontrar. O capanga ao seu lado engoliu em seco, reconhecendo a determinação implacável no tom do chefe. Denis não aceitava fracasso. Não aceitava desobediência. E, acima de tudo, não aceitava perder. Ele se virou para o grupo de homens que aguardavam suas ordens. Cada um deles sabia o que estava em jogo. Beatriz não era apenas uma mulher fugindo de um casamento infernal. Para Denis, ela era uma posse. Um troféu que ele se recusava a deixar escapar. — Se ela pensa que pode recomeçar em outro lugar — ele continuou, sua voz fria e cortante como lâmina —, está enganada. Então, ergueu a mão, indicando a casa onde ela e Yago haviam se escondido. A porta arrombada balançava levemente ao vento, e as janelas escancaradas refletiam a luz fraca dos postes da rua. — Incendeiem a casa — ordenou, sem hesitar. Os homens se entreolharam por um breve instante antes de agir. Pegaram latas de gasolina que haviam trazido, despejando o líquido inflamável no interior da casa, encharcando as paredes de madeira velha e o sofá surrado que Beatriz havia usado para descansar horas antes. O cheiro forte se espalhou pelo ar, e Denis ficou parado do lado de fora, observando tudo com um olhar impassível. Um dos capangas acendeu um isqueiro e, sem cerimônia, lançou a chama sobre o rastro de gasolina. O fogo se ergueu como uma fera desperta. Em questão de segundos, as chamas se espalharam, lambendo as paredes com uma fúria devoradora. Vidros estalaram e se estilhaçaram, e a fumaça escura subiu para o céu, anunciando a destruição. Denis assistiu à cena sem piscar. Para ele, aquilo não era apenas um incêndio. Era um aviso. Beatriz não tinha mais para onde voltar. A cidade poderia escondê-la por um tempo, mas não para sempre. Ela teria que enfrentá-lo. E quando esse momento chegasse, ele garantiria que fosse do seu jeito.






