Amanda nunca imaginou que passaria sua noite de núpcias em silêncio, dividindo o mesmo carro com um homem praticamente desconhecido. O vestido branco pesava em seu corpo. A maquiagem já havia desbotado com o calor, o nervosismo e a humilhação. Mas Lucca Mancini seguia ali, inabalável, como se aquele casamento improvisado fosse só mais uma cláusula em um contrato qualquer.
A limusine parou diante do hotel cinco estrelas pertencente à família dele — ou melhor, deles agora. Um dos empreendimentos mais luxuosos da cidade. O motorista abriu a porta e Lucca saiu primeiro, estendendo a mão para ela. Amanda hesitou, mas aceitou. A mão dele era firme, quente, segura. O saguão estava vazio, como pedido. Lucca não queria olhares. E ela muito menos. Subiram em silêncio até a cobertura. Quando a porta do elevador se abriu, Amanda ficou sem palavras. O lugar era imenso. Moderno. Vidros panorâmicos revelavam as luzes da cidade. Um piano de cauda decorava a sala. Flores brancas estavam espalhadas em vasos elegantes. — Isso é... bonito demais pra ser real — ela murmurou, largando os saltos no tapete. — É a suíte presidencial. Meu pai mandou preparar pra noite de núpcias — ele respondeu, soltando a gravata. Amanda virou-se para ele, os olhos carregados. — E você aceitou como se tudo isso fosse normal. Lucca soltou um suspiro. — Não foi normal. Mas foi necessário. — Necessário pra você. Pra sua empresa. Pra sua imagem. Eu fui só a solução conveniente. Ele caminhou até o bar, pegou duas taças e encheu com champanhe. — Pra mim, Amanda, você foi a única saída viável. Se preferir pensar que eu me aproveitei... tudo bem. Mas você também se beneficiou. Ela bufou. — Beneficiei? Fui humilhada em frente a duzentas pessoas! Meu noivo fugiu! E agora sou esposa de um homem que nunca me deu mais que dois minutos de conversa! Lucca se aproximou com a taça. — E ainda assim, você disse “sim”. — Ele entregou a bebida. — Isso diz muito mais sobre você do que sobre mim. Amanda pegou a taça, mas não bebeu. O olhar dela fixo nele. — Por que você fez isso? De verdade. Não me venha com a desculpa dos negócios. Você podia muito bem deixar tudo desmoronar. O Daniel já fez isso. Você também podia. Lucca bebeu um gole do próprio champanhe, depois andou até a varanda. Ficou alguns segundos em silêncio antes de responder: — Porque eu não fujo, Amanda. Nunca fugi de nada. Nem dos meus erros, nem das minhas responsabilidades. O Daniel é impulsivo. Inconstante. Eu sou o contrário. Faço o que tem que ser feito. — Mesmo que envolva enganar todo mundo? — Ninguém foi enganado. Você aceitou. Eu aceitei. A cerimônia aconteceu. Isso é mais do que muitos casamentos por amor conseguem. Amanda se encostou no sofá. A cabeça latejava. — E agora? Vamos dormir no mesmo quarto? Fingir que tá tudo bem? Que somos um casal apaixonado? Ele se virou, cruzando os braços. — A gente pode dormir em quartos separados. Eu não vou te tocar, Amanda. Não sou como o meu irmão. Ela mordeu o lábio, sentindo um gosto amargo. Queria gritar, chorar, sumir daquele lugar. Mas não podia. Já tinha assinado o acordo. Já tinha dado o nome. Já era uma Mancini — mesmo que só no papel. — Você é sempre assim? Frio? Calculista? — Só quando preciso proteger o que é meu. — E eu sou “o que é seu” agora? Ele não respondeu. Mas os olhos dele disseram tudo. E isso a arrepiou. § No dia seguinte, Amanda acordou cedo. Dormira sozinha em um dos quartos da suíte, mas mal fechou os olhos. Ainda estava de vestido — agora amarrotado. Tomou um banho longo, vestiu um roupão do hotel e saiu pela suíte procurando café. Lucca estava na sala, de terno completo, falando ao telefone. Quando a viu, apenas ergueu a mão em sinal de “bom dia” e continuou a ligação. — Sim, a coletiva será hoje às 11h... Não, não houve cancelamento. Só uma mudança nos planos... Sim, a Amanda está ciente... A imprensa vai receber o comunicado ainda esta manhã. Ela parou à porta, indignada. — Coletiva? Ele desligou e se aproximou com calma. — Precisamos controlar a narrativa. Vamos dizer que o Daniel teve um problema de saúde e me pediu pra substituí-lo. Um gesto de lealdade entre irmãos. Romântico, não acha? — Isso é doentio. — É estratégia. Amanda cerrou os punhos. — Você realmente vai me usar como uma peça de marketing? — Não estou te usando. Estou te incluindo. Se quiser sair disso, pode pedir o divórcio em um ano. Até lá, temos que manter as aparências. Ela respirou fundo, depois caminhou até a cozinha da suíte. Encontrou uma cafeteira moderna e se ocupou com ela. Enquanto o café passava, sua mente girava. Um ano. Um ano de convivência com um homem que era tudo o que ela desprezava — e ao mesmo tempo, tudo o que seu pai admiraria. Ela voltou com a caneca na mão. — E se eu quiser seguir minha vida? Sair, trabalhar, me apaixonar por outra pessoa? Lucca cruzou os braços, encostado na parede. — Enquanto formos oficialmente casados, espero respeito. Nada de escândalos. Depois, você está livre. — E você? Vai sair com suas modelos enquanto posa de marido perfeito? Ele ergueu uma sobrancelha. — Eu sei manter a discrição. Amanda bebeu o café amargo e olhou bem fundo nos olhos dele. — Pois eu não sei fingir. Então que fique bem claro: eu posso ter aceitado esse acordo, mas não sou sua. Lucca sorriu pela primeira vez. — Ainda não. § A coletiva aconteceu em um salão do próprio hotel. Amanda estava impecável, vestida com um conjunto branco e saltos nude. Lucca ao seu lado, como um verdadeiro executivo de sucesso. As câmeras capturavam cada gesto, cada olhar. Os jornalistas disparavam perguntas. Lucca conduzia com maestria. — O casamento entre mim e Amanda foi uma decisão tomada com muito carinho e responsabilidade. Daniel teve um problema inesperado e me pediu que cuidasse de tudo. Estou honrado em dizer que agora tenho ao meu lado uma mulher extraordinária. Amanda forçou um sorriso. Suas mãos suavam. Quando a coletiva terminou, o mundo já sabia: Lucca Mancini havia se casado com a noiva do irmão. Mas ninguém sabia da verdade. Naquela noite, de volta à suíte, Amanda se jogou no sofá exausta. — Você é bom nisso — ela disse. — Em mentir? — Em manipular tudo ao seu favor. Lucca a olhou sério. — Eu só fiz o que era necessário. — E você acha mesmo que isso vai dar certo? Ele se aproximou devagar, parando à frente dela. — Não sei. Mas vou tentar. — Por quê? Ele hesitou. Depois respondeu, mais baixo: — Porque, pela primeira vez em muito tempo, estou apostando em algo que não posso controlar. Amanda o olhou confusa. Mas antes que pudesse perguntar o que ele queria dizer, Lucca se virou e entrou no quarto dele. Ela ficou ali, sozinha. Confusa. E com uma sensação nova nascendo no peito. Medo. E curiosidade. O que Lucca Mancini escondia por trás daquela fachada perfeita? Ela estava prestes a descobrir.