Era uma quinta-feira.
Mais uma cirurgia encerrada. Tirei as luvas, a touca, o avental. Lavei as mãos em silêncio. Já no fim do procedimento, ouvi a voz de Heitor ecoando pelo corredor. Conhecia aquele timbre de longe. Cumprimentava os funcionários, simpático como sempre — e, por isso mesmo, eu sabia que ele queria algo.
Continuei ali, focado no ritual pós-cirúrgico. As técnicas preparavam o paciente para a transferência. Eu seguia em direção à saída da ala quando senti a presença dele ao meu lado.
Silêncio.
Nem um cumprimento. Só passos sincronizados. Ele entrou comigo na sala, como quem sabia que tinha o direito. Peguei a prancheta, fiz as anotações da cirurgia, devagar.
— Conversaram? — ele perguntou, cortando o ar como uma lâmina.
Inspirei fundo, a caneta ainda entre os dedos.
— Não há o que conversar, Heitor. Eu sou um homem. A sua filha é uma mulher. E, sinceramente, não lembro de ninguém te interrogando sobre quem você leva pra cama. Tem?
Ele ficou em silêncio, mexendo na manga