Capítulo 42LunaO nome que vi impresso na nova identidade não era o meu. “Lorena Vidal.” Um nome bonito, forte, quase elegante demais pra quem aprendeu a sobreviver com o mínimo. O documento parecia real. Assinatura, RG, CPF. Tudo limpo, novo, como se eu tivesse renascido sem os pesos do passado.— Lorena Vidal? — murmurei, olhando para Dante, que observava minha reação com um cigarro apagado entre os dedos. — É assim que eu me chamo agora?— Em público, sim. — Ele assentiu com um leve movimento de cabeça. — A consultora da Moretti Solutions. Especialista em contenção de crises, contratada diretamente por mim.— E o que exatamente a “consultora” faz?— Sabe ouvir. Sabe ler intenções. Sabe onde cutucar pra fazer alguém se entregar. — Ele se aproximou e colocou uma pasta na minha frente, sobre a mesa. — E você, Luna, sempre foi boa em farejar mentiras.Abri a pasta com cuidado. Nela, estavam os primeiros nomes dos aliados que eu deveria conhecer, cumprimentar, entender. Mafiosos de out
Capítulo 43LunaA madrugada parecia mais escura do que o normal. Nem mesmo as luzes da cidade que entravam pelas janelas tinham força suficiente para cortar o peso que tomava o ar naquela sala.Dante conectou o pen drive no laptop e os arquivos começaram a carregar. Vídeos. Áudios. Planilhas. Mapas. Tudo meticulosamente organizado. Não era só uma denúncia, era um dossiê. E cada clique nos levava mais fundo num poço que parecia não ter fim.Eu me sentei ao lado dele, os olhos atentos à tela, tentando absorver cada detalhe. As rotas marcadas em vermelho cruzavam áreas estratégicas da cidade. Algumas a gente já suspeitava. Outras... nem imaginávamos.— Ele tava montando isso há meses — murmurei, cruzando os braços. — Marcelo não improvisa. Ele planeja. Calcula. E sempre com alguém pra executar por ele.Dante assentiu, a mandíbula rígida. A cada nova pasta aberta, sua expressão escurecia. Até que um vídeo específico chamou a atenção dele.— Pera.Ele clicou.A imagem tremia, captada por
Capítulo 44LunaQuando Dante chamou a equipe para uma reunião emergencial a mesa de operações já se encontrava montada, os mapas atualizados, os celulares criptografados ligados e monitorando cada movimento. Rubens chegou com sua postura impecável, barba feita, blazer alinhado, e aquela tranquilidade que só os traidores sabem carregar no peito.— Situação? — ele perguntou, como se não soubesse que era o alvo central daquela manhã.Dante o olhou brevemente e depois se virou para o grupo reunido. Eu estava ali, disfarçada de consultora, como sempre, com os olhos atentos e o coração à beira do abismo.— Temos um possível vazamento — Dante disse, a voz firme. — Um dos nossos entregou coordenadas da última rota. Perdemos dois carregamentos. Três mortos.Silêncio. Rubens mordeu o lábio, balançou a cabeça com pesar.— Malditos bastardos — disse ele. — Se alguém estiver vendendo informação, vai pagar caro.Eu forcei um sorriso discreto. Ele era bom. Muito bom. Mas Dante e eu estávamos um pas
Capítulo 45LunaO relógio marcava 21h47 quando os carros começaram a se posicionar em volta do Armazém 19, o local da entrega falsa que Dante havia planejado com precisão cirúrgica. O ar da noite parecia mais denso, carregado de tensão. Cada membro da equipe sabia seu papel. Cada respiração contida aguardava o momento certo de agir.Rubens chegou três minutos antes do previsto, pontual como sempre. O carro preto deslizou pelo portão semiaberto e parou bem no centro da estrutura abandonada. Do lado de fora, Dante e eu assistíamos tudo das câmeras instaladas no perímetro. Ele estava sozinho, como esperávamos. Mas o celular dele… era o verdadeiro foco.— Ativa o sinal — Dante murmurou, os olhos fixos na tela.Em segundos, o rastreador capturou a conexão com o dispositivo que Rubens usava para falar com o contato de Rivas. Era um número criptografado, sem identificação direta — mas, com o acesso completo agora em nossas mãos, as mensagens estavam vindo em tempo real.Rubens digitava rápi
Capítulo 46MarceloRubens estava morto.A notícia chegou até mim em um envelope selado, deixado em cima da mesa do café como se fosse apenas mais um relatório da manhã. Mas não era. Abri o papel com um estalo seco, os olhos correndo pela caligrafia irregular de Matteo. Algumas palavras riscadas, outras sublinhadas com raiva. O homem estava instável. Nervoso. Isso, por si só, já dizia tudo.“Rubens sumiu. Encontramos o carro abandonado. Nenhuma comunicação desde ontem. Eles sabiam. Alguém entregou.”Dobrei o papel e deixei de lado. O café amargo ainda fumegava na caneca de porcelana. Peguei-a com calma, como se o mundo não tivesse virado do avesso em menos de três frases. Dei um gole, olhando pela janela. A cidade ainda respirava. Mas eu sentia o cheiro da guerra no ar.Rubens, aquele rato covarde, tinha dado tudo o que tinha em troca de nada. Traiu, espionou, mentiu — tudo com a esperança absurda de que Dante o perdoaria. Ou, pior ainda, de que ela o perdoaria. A idiota da Luna. A me
Capítulo 47LunaA carta chegou dobrada com precisão. Nenhuma assinatura, nenhum cheiro. Apenas uma folha branca, escrita com tinta vermelha, e uma foto que me fez sentir como se o chão tivesse desaparecido sob meus pés.Ela parecia comigo.Não era parecida como uma sósia de rua. Era parecida como um reflexo no espelho distorcido apenas pela cor dos cabelos. Eu, com meu castanho escuro sempre em desalinho. Ela, ruiva, os fios vibrando como chamas, mas com o mesmo queixo anguloso, a mesma boca teimosa, o mesmo olhar feroz — ou perdido. Eu não sabia ao certo.O alvo vermelho estampado no meio da testa dela era o que mais me prendia os olhos. E abaixo da imagem, rabiscadas com fúria e ameaça, as palavras:“Me entregue Luna, ou a irmã gêmea de Luna morrerá.”Gêmea?Ri. Um riso curto, quase nervoso. Era isso. Mais uma jogada suja de Rivas, tentando me desestabilizar. Era uma montagem. Uma provocação. Nada além de uma mentira bem arquitetada.Fechei a mão ao redor da carta e da foto, sentin
Capítulo 48LunaAs luzes do escritório estavam apagadas. O mundo lá fora dormia, mas eu não. Nem Dante. Desde que recebemos a carta, algo em nós mudou, como se o tempo tivesse se tornado mais precioso e, ao mesmo tempo, mais cruel. A mulher da foto ainda estava ali, em cima da mesa. Seus olhos me seguiam. Idênticos aos meus. A única diferença era o cabelo ruivo como fogo. Eu não sabia o nome dela. Não sabia se estava viva, se estava sofrendo, se era realmente minha irmã... mas a imagem dela me perseguia como um grito que não tinha som.Dante entrou no escritório trazendo dois copos de café. Colocou um na minha frente, em silêncio. Nós não estávamos dormindo, não comendo direito. Vivíamos no modo sobrevivência desde que Rivas decidiu brincar de marionetista com nossas vidas.— Fiz o levantamento da rede de clínicas e hospitais clandestinos nos arredores de São Paulo que operavam na época do seu nascimento — ele disse, direto. — Se houve separação, ela não foi legal. Alguém vendeu ess
Capítulo 49LunaA localização apareceu no mapa depois de quase uma hora de triangulação: uma zona industrial desativada no extremo leste de São Paulo, próxima ao rio, onde a maioria dos galpões estava abandonada ou em reforma. Um ponto cego para as câmeras da cidade. Um lugar onde ninguém ouve gritos.Dante entrou na sala no momento exato em que o ponto final piscava em vermelho.— Conseguiu?— Consegui. — Apontei a tela. — Galpão 34, distrito industrial. As frequências sonoras do microfone captaram o som de um sino em intervalos regulares. Depois comparei com o mapeamento sonoro da região... e só tem uma igreja ativa ali por perto. O sino bate de hora em hora.— E isso bate com o tempo do áudio. Você é boa.— Não sei se sou boa ou só tô com raiva.Ele se aproximou, puxando uma das armas da gaveta. A tensão era palpável, como eletricidade no ar antes da tempestade. Vesti o colete tático que Chiara havia deixado preparado pra mim e prendi o cabelo num rabo de cavalo firme.— Rafael tá