Guilherme
A Estela me chamou para ir ao cinema, e eu aceitei na hora. Além de estar a fim de dar uma volta, achei uma boa ideia deixar o Luca e a Maria Júlia sozinhos por um tempo. Eles mereciam aproveitar, ter um momento só deles.
Quando chegamos ao shopping, já fomos direto comprar tudo o que iríamos precisar: pipoca, refrigerante, chocolate, nachos... A bandeja ficou tão cheia que parecia que a gente ia alimentar um batalhão.
Mas, quando estávamos quase entrando na sala, duas meninas passaram por mim e me chamaram. Estavam todas empolgadas, mexendo no cabelo, sorrindo daquele jeito malicioso.
— Oi, gatinho. Boa noite, disseram juntas, praticamente em uníssono.
— Oi, lindas. Boa noite, respondi com meu charme natural. Aquele que, modéstia à parte, mulher nenhuma costuma resistir.— Quer dar uma voltinha com a gente, gatinho?
Dei uma risadinha.
— Minhas lindas, hoje não posso. Estou de babá, disse apontando para a bandeja e o refrigerante da Estela. — Mas a gente pode marcar outro dia.
— Humm... já tô dentro, uma delas respondeu com um sorriso atrevido.
— Vou indo, viu? Minha companhia já entrou pra assistir o filme.
Quando me virei, vi que a Estela nem tinha me esperado. Entrou na sala sem nem olhar pra trás. Será que ficou chateada?
Corri até ela, entrando na fileira de poltronas com dificuldade por causa da bandeja.
— Estelinha, você nem me esperou?
— Não queria atrapalhar… respondeu, sem me encarar. — Se quiser ir com elas, pode ir. Eu volto dirigindo pra fazenda ou, sei lá, pego um quarto na pousada aqui do centro.
— Nada disso! A gente veio assistir ao filme juntos e é o que vamos fazer.
— Eu não quero atrapalhar sua noite.
— Você não atrapalha. Nunca.
Ela apenas assentiu e continuou olhando pra tela. Mas algo estava diferente. Estela não estava mais empolgada como antes. Mal tocou na pipoca, e olha que ela é viciada. Parecia distante, desconfortável. E isso me incomodou.
Durante o filme, olhei pra ela várias vezes. Notei uma mecha do cabelo caindo sobre os olhos e, sem pensar, estendi a mão e a afastei com delicadeza.
Ela virou o rosto devagar, me olhando de um jeito que eu não entendi. Parecia… magoada?
— Desculpa, bonequinha, sussurrei, meio sem jeito.
Ela não respondeu. Apenas ficou ali, me olhando em silêncio. A concentração no filme foi embora. A única coisa que ocupava minha cabeça agora era entender o motivo da Estela estar agindo assim. Ela sempre foi divertida, alto-astral. Ela é como uma irmã pra mim… mas hoje, pela primeira vez, duvidei disso.
Quando o filme acabou, fomos direto pro carro. O caminho de volta até a fazenda foi silencioso. Só o som da estrada, e meus pensamentos rodando sem parar.
Chegando lá, encontramos o clima mais romântico do mundo no ar. Luca e Maria Júlia estavam completamente conectados. Sorrisos, olhares... dava até vontade de suspirar só de ver.
Resolvemos deixá-los a sós e subimos.
Já no corredor, chamei por ela antes que entrasse no quarto.
— Estelinha… você ficou chateada comigo? Desculpa se não gostou daquelas meninas falando comigo. Eu juro que não quis estragar nossa noite.
Ela ficou parada por alguns segundos. Depois, se virou pra mim.
— Eu não queria ter atrapalhado a sua noite, Gui…
— Não atrapalhou. Você é como uma irmã pra mim.
Na hora que falei isso, vi. Ela abaixou os olhos, e naquele breve segundo… eu vi tristeza. Aquela tristeza muda, que grita mesmo em silêncio.
— Tá bom, Gui… eu vou dormir. Boa noite.
Sem dar tempo pra resposta, ela entrou no quarto e fechou a porta.
Fiquei parado ali por alguns instantes, sem saber o que pensar.
Entrei no meu quarto, me troquei, ficando só de cueca, e me joguei na cama.
Mas o sono não vinha. A imagem dela me encarando no cinema, os olhos marejados... tudo isso ficou girando na minha cabeça.
Por que Estela agiu assim? E por que eu fiquei tão incomodado?
Ela é como uma irmã.