Eu senti um arrepio percorrer minha espinha ao ouvir a voz firme de Ronaldo atrás de mim. O sentimento inesperado de calma e... paz... invadiu meu peito, uma âncora em meio ao turbilhão. Mas João não compartilhava dessa tranquilidade. Seu rosto crispado se fechou ainda mais enquanto ele soltava meu braço, como se o toque tivesse o queimado. Ronaldo avançou com a confiança de quem está sempre no controle, sua mão grande e firme pousando em meu ombro em um gesto de posse. — Está tudo bem por aqui? — Sua voz era um desafio disfarçado de cortesia. João abriu a boca, a irritação evidente em cada sílaba cuspida: — Eu só estava perguntando o que ela está fazendo... Ronaldo o interrompeu com a frieza cortante de uma lâmina: — Não perguntei para você. Estou falando com a minha mulher. — Seus olhos me encontraram, intensos e cheios de um poder inegável. — Você está bem? A resposta escapou antes que eu pudesse hesitar: — Sim, eu estou bem. Vamos voltar à mesa. João ainda me olh
Ronaldo — Me daria a honra dessa dança? — estendi a mão para Margarida. Ela hesitou por um instante. Seus olhos carregavam um brilho inquieto, reflexo da recente interação com João. Eu percebia tudo. Ele não desviava o olhar dela nem por um segundo, enquanto sua acompanhante, claramente incomodada, tentava a todo custo chamar sua atenção. — Claro — ela sorriu, mas seu sorriso carregava algo a mais. O salão estava repleto de casais rodopiando sob a luz suave dos lustres. A melodia que preenchia o ambiente era tranquila, quase hipnótica. Segurei suas mãos delicadas, sua pele quente enviando uma descarga elétrica pelo meu corpo. Era como se o universo nos puxasse um para o outro, numa conexão silenciosa. Deslizei minha mão para sua cintura, puxando-a com delicadeza. Começamos a nos mover em sintonia, cada passo milimetricamente alinhado com a batida da música. — Tente não ficar ansiosa — murmurei, meu rosto próximo ao dela. — Eu estou... — ela suspirou, franzindo levemente
Margarida Em meus sonhos, meu amiguinho de infância veio me visitar. Brincamos novamente, rimos como antes, e ele me abraçou forte. Disse que voltaríamos a ser amigos, que voltaria para mim. Era a mesma promessa da nossa última lembrança juntos.Foi por isso que acordei com um sorriso no rosto.Talvez também porque a noite passada tenha sido cheia de surpresas. Algumas ruins, como meu encontro com João e Gabriella, mas outras incrivelmente boas, como a forma como eu e Ronaldo estamos nos dando bem, como Emma é uma criança muito gentil e amorosa comigo. Nosso casamento pode não ter sido convencional, mas sermos amigos é uma grande vantagem.O aroma de café fresco se espalhava pelo ar, convidativo. Depois de me arrumar, desci as escadas e encontrei Ronaldo na sala de jantar, já sentado à mesa. Ele folheava alguns documentos, mas ao me ver, pousou as folhas de lado e esboçou um leve sorriso. Emma já estava com ele, também animada ao me ver. — Bom dia, Margarida. — falou sorridente. —
Algumas coisas em nossa vida não têm explicação. Eu estava em um local que, em meu coração, parecia familiar. Eu tinha certeza de que amava aquele lugar, mas minha mente ainda não estava clara. — Isso é lindo — afirmei, encantada. Havia uma propriedade rural com uma casa grande. Atrás das árvores que a cercavam, um rio e uma cachoeira compunham a paisagem. Mais ao longe, um curral onde vários cavalos corriam livres. O cenário parecia saído de um sonho. — Meu Deus, que lugar incrível — murmurei novamente, admirada. — É uma propriedade da família. Eu vinha muito aqui quando era criança — Ronaldo comentou, pensativo. — Meus pais pensaram em vender quando nos mudamos, mas eu implorei para deixarem para mim. Desde então, venho sempre que quero ficar sozinho. — E então, o que eu estou fazendo aqui? — sorri, brincando. — Você está aqui porque agora eu quero ficar sozinho com você... — Ele deu de ombros, mas ao ver meu olhar surpreso, pigarreou e corrigiu: — Com a sua companhia.
Quando estacionei o carro no jardim, Margarida demorou alguns segundos para sair, sua boca abriu e eu sei que ela queria dizer algo, mas nenhum de nós estava preparado para falar qualquer coisa. É verdade. Eu quase a beijei, e se não fosse o celular e depois o caseiro, só Deus sabe o que teria acontecido depois.Finalmente, saímos do carro. Erick havia ligado e avisado que um dos maiores acionistas do grupo JS havia aceitado conversar comigo a respeito de suas ações na empresa. — Eu preciso ir a um restaurante, vou jantar com Abraham Wilson, você conhece? — perguntei quando chegamos em casa. — Sim, ele era muito amigo do meu pai. Faz muito tempo que não o vejo, você acha que posso ser necessária? Porque eu posso ajudar. — falou, seus olhos parecendo muito esperançosos. — Sim, eu acho que você será muito necessária, venha comigo. — chamei. — Sairemos as sete.— Está bem, até lá. E... Obrigada pelas flores, eu amei, elas são lindas. — falou, sorrindo e cheirando o buquê que ela não
Duas semanas haviam se passado desde o jantar com Abraham. Agora, faltava apenas uma semana para o evento annual da companhia RV.A maior parte dos meus dias era passada em casa, mergulhada em documentos, procurando qualquer brecha, qualquer evidência que pudesse tirar João do controle da JS. Enquanto isso, Ronaldo já havia garantido mais duas parcerias — um avanço significativo, mas o clima ainda era de tensão constante.Naquela manhã, despertei com vozes no andar de baixo. Elas soavam intensas, apressadas. Por um instante, temi que fosse algum convidado indesejado. Meus sentidos se aguçaram. No entanto, logo depois, risos preencheram o ambiente. Risos? Aquilo, sim, era inesperado.Desci com cautela. Ao alcançar a sala, meus olhos encontraram um casal sentado no sofá, de frente para Ronaldo, com Emma nos braços do homem. Quando perceberam minha presença, a surpresa foi instantânea. A mulher se levantou de um salto e caminhou apressada até mim.—Margarida… — murmurou, quase sem ar,
O restaurante que escolhi, pertence ao meu amigo Erick, eu nao me sentaria na mesma mesa que um homem como João se não conhecesse o ambiente. O lugar era de luxo, mas o clima entre nós estava longe de ser refinado. Luzes suaves, garçom discreto, vinho caro… um cenário cuidadosamente escolhido para parecer civilizado. Mas eu sabia exatamente o que João queria com aquele convite: confronto. Ele estava sentado à cabeceira da mesa como se ainda comandasse o mundo. Terno impecável, sorriso ensaiado. Mas os olhos… os olhos traíam sua verdadeira intenção: raiva. — Ronaldo — disse, estendendo a mão com aquela arrogância natural —, obrigado por vir. Apertei sua mão com firmeza, mantendo o olhar. Meu sorriso foi mínimo. Cordialidade, apenas o suficiente. — Quando um concorrente nos convida para jantar, é sempre por um bom motivo — respondi, puxando a cadeira. João riu, tentando disfarçar o incômodo. Mas não demorou. — Vou direto ao ponto — disse ele, recostando-se —. Você casou com
Margarida Não posso dizer que a presença dos pais de Ronaldo me incomodou. Pelo contrário, senti-me acolhida. A mãe dele tem a mesma gentileza cativante que vejo em Emma, mas com um toque curioso — ela age como se já me conhecesse de outras vidas. Seus olhos me observam com um calor que ultrapassa a mera cordialidade. É como se ela enxergasse em mim algo que nem eu mesma consigo ver. Emma… ah, essa pequena dama! Ela tem o dom de transformar qualquer manhã cinzenta em primavera. Seu jeito doce, suas risadas espontâneas, o modo como segura minha mão como se fosse a coisa mais natural do mundo… ela está me conquistando mais do que jamais imaginei possível. Hoje, bem cedo, Ronaldo recebeu uma ligação urgente. Antes mesmo do café da manhã, ele se aproximou com um ar de pressa. — Preciso sair agora — disse, com aquele olhar que tenta disfarçar a culpa por nos deixar tão de repente. Notei os olhos atentos dos pais dele, perscrutando cada detalhe, cada gesto. Entendi o que esperavam.