Isadora cresceu isolada, marcada por uma identidade que a separava de todos ao seu redor. Como uma criança órfã, ela e sua loba mística, Freiren — uma rara loba branca — foram forçadas a viver longe do Clã Lunar, longe dos outros lobos. Desde muito jovem, Isadora foi ensinada a esconder sua verdadeira natureza, temendo que sua conexão com Freiren e sua linhagem especial a tornassem alvo da sociedade dos lobos. Agora, aos 18 anos, ela vive como empregada na mansão do líder do Clã Lunar, Rafael, o alfa que, após anos de dor silenciosa, se revela ser seu companheiro predestinado — mas que a rejeita sem hesitar. Rafael está comprometido com Selene, uma loba com quem mantém um relacionamento há anos, e Isadora, sobrecarregada pela dor do vínculo, é forçada a observar o amor entre eles, enquanto ele a proíbe de buscar sua própria felicidade. Quando Rafael anuncia seu casamento com Selene, um evento grandioso que selará sua união, Isadora se vê à beira do abismo. É nesse momento que Freiren, sua loba, quebra o silêncio e sugere a única saída: fugir. A cerimônia será a distração perfeita, e Isadora finalmente encontrará a oportunidade de se libertar da prisão que é sua vida no Clã Lunar. Mas a fuga não será simples. Com o peso do vínculo e a presença constante do Clã, ela terá que lutar contra suas próprias inseguranças, os perigos da floresta e, talvez, contra si mesma. Em busca de liberdade, Isadora enfrentará o desconhecido, se perguntando até onde ela pode ir para se encontrar e se tornar dona de seu próprio destino.
Leer másO vento cortava a floresta como uma lâmina invisível, uivando entre as árvores altas, como se fosse uma criatura à procura de algo que perdera há muito tempo. Eu era pequena demais para entender o que acontecia, mas naquela noite tudo parecia estranho. Era como se a própria terra respirasse errado, inquieta. O medo se espalhava no ar, tocando cada folha, cada ramo, enquanto eu observava meus pais com os olhos arregalados.
Meu pai, Alistar, o antigo líder do Clã Lunar, mantinha os ombros rígidos, os olhos fixos no horizonte. Minha mãe, Lira, aparentava calma, mas sua expressão carregava uma gravidade que deixava meu peito apertado. Não compreendia o peso das palavras sussurradas dentro da nossa cabana de madeira, isolada no coração da floresta, mas sabia — com a certeza que só os instintos oferecem — que algo estava errado. A noite estava mais escura. Mais pesada. Como se o próprio céu conspirasse contra nós.
— Eles vão nos encontrar, Alistar— disse minha mãe, a voz baixa, mas carregada de presságio.
— Eu sei — ele respondeu, sombrio como a noite que se adensava ao nosso redor.
Ele se abaixou até mim e, ao tocar meu rosto, senti a força contida no gesto.
— Izzy, fique tranquila. Estamos fazendo o melhor por você. A Lua… ela nos guia.
Meus pais sempre diziam que eu era diferente. Especial. Mas nunca explicavam por quê. Naquela noite, no entanto, percebi que os segredos não poderiam ser guardados por muito mais tempo. O olhar de meu pai era grave, como quem prepara alguém para carregar um destino maior do que os próprios ombros podem suportar.
O medo era quase palpável. Eu não sabia o que ele significava, mas sentia que algo grande se aproximava. Algo irreversível. A escuridão parecia devorar a pouca luz ao redor, criando um mundo onde o desconhecido ditava as regras.
Tudo começara quando completei três anos. Foi naquela idade que ela apareceu — minha loba. Freiren. Uma criatura de pelagem branca como a neve e olhos profundos como o inverno. Diziam que não era comum os Lycans se conectarem tão cedo aos seus lobos interiores. Mas comigo… foi diferente. Sempre foi.
A primeira vez que a vi, soube imediatamente que minha vida jamais voltaria a ser a mesma. Ela se aproximou em silêncio, mística, como se tivesse esperado o momento exato para surgir. Nosso vínculo foi instantâneo. Intenso. Uma conexão que escapava ao natural. E, por isso mesmo, foi vista como aberração.
O clã, mesmo os mais sábios, rejeitou o que não compreendia. Meus pais, marcados pelo medo e pela coragem, decidiram me proteger da única forma que podiam: fugindo. Deixaram para trás o clã, a liderança, a vida em comunidade. Construíram uma cabana na floresta, longe de olhares curiosos, onde me ensinaram a esconder o que eu era. A ocultar Freiren. A fingir que não havia lobo dentro de mim. E então um dia, eu simplesmente a deixei de ouvi-lá dentro de mim.
Aprendi cedo a usar máscaras. A domar minha essência. Eles me diziam que era para o meu bem, mas eu sentia o peso de cada mentira. À medida que os anos passavam, crescia a certeza de que havia algo em mim que nem mesmo eles conseguiam entender — ou enfrentar.
Aos oito anos, já carregava a angústia de viver uma verdade silenciada. A floresta, com suas sombras e sussurros, era o único lugar onde eu sentia que poderia ser quem realmente era. E mesmo ela parecia respirar diferente nas noites de lua cheia. Nessas ocasiões, o medo em casa se tornava uma presença sólida, quase visível. Algo espreitava. Algo aguardava.
E naquela noite… o momento chegou.
Os primeiros rugidos vieram como ecos distantes. Mas logo se tornaram próximos. Vorazes. Senti meu corpo se tensionar, o instinto de Freiren despertando como uma labareda. Olhei para meus pais, que já se preparavam. Havia desespero nos olhos de mãe. Determinação sombria no rosto de meu pai.
— Eles estão aqui — ele murmurou, com a voz partida ao meio.
Me encarou então, e eu nunca esquecerei aquele olhar. Era despedida e amor em um só gesto.
— Corra, Isadora. Agora. Não olhe para trás.
Meu coração explodiu no peito. As pernas hesitaram, mas obedeci. O vento frio da noite mordia meu rosto enquanto eu corria floresta adentro. Queria gritar, voltar, abraçá-los… mas tudo que ouvia era a ordem em sua voz: corra.
Atrás de mim, o som da batalha se desenrolava num pesadelo de sangue e fúria. As criaturas surgiam como sombras, olhos dourados e vermelhos brilhando na escuridão. Meus pais resistiram como puderam. Mas sabíamos… sabíamos que não havia vitória naquela luta.
Quando o silêncio caiu, foi como se o mundo tivesse sido engolido. Um silêncio denso, profundo, final.
Continuei correndo. O corpo em choque, os pés movendo-se por instinto. Não sabia para onde ia. Só sabia que precisava fugir. Quando cheguei a um riacho, as pernas cederam. Cai de joelhos. As lágrimas vieram, quentes e salgadas, misturando-se à água gelada. Não sabia se chorava pelos que perdi… ou pelo vazio que se abria dentro de mim.
Horas depois, fui encontrada à beira da floresta. Quase inconsciente. O Clã Lunar me acolheu sem saber o que carregava comigo. Sem entender o laço profundo entre mim e a loba branca que um dia os aterrorizou. Me trataram como órfã. Como sobrevivente. Mas o destino… ah, ele sempre soube a verdade.
Cresci entre eles, protegida pelas mesmas leis que um dia expulsaram meus pais. Mas dentro de mim, Freiren uivava por liberdade. Por verdade. Por justiça. Um dia, me tornaria alguém que desafiaria os próprios deuses, que rasgaria os fios do destino com as garras da vontade.
Mas o preço seria alto.
E a Lua… a Lua sempre soube. Ela apenas esperava. Esperava o momento certo para revelar seu verdadeiro rosto. E o que estava por vir, eu sequer ousava imaginar.
Dez anos depois O vento sopra suave no alto das colinas, trazendo consigo o perfume das flores silvestres que cobrem o campo. O céu está limpo, azul como as águas sagradas do lago da Lua, e o sol brilha com generosidade. As crianças correm entre as árvores, gargalhando, e seus risos se misturam ao som distante de tambores em celebração. Hoje é um dia de festa. Hoje celebramos paz. Estou de pé na varanda da mansão, observando os pequenos pés descalços cortarem a relva. Meus filhos, agora com dez anos, crescem com a força da linhagem que carregam no sangue e o brilho da magia ancestral nos olhos. Aurora tem o olhar de Caelum — firme, profundo — mas a sensibilidade da minha linhagem, capaz de sentir a energia do mundo como se fosse um segundo coração. Ela ainda prefere as flores às armas, mas Lis já a treina com feitiços antigos. Sua conexão com a Lua é intensa. Quando ela dança sob o luar, até os espíritos silenciam para assistir. Já Auren... ele é pura chama. Um guerreiro em cada
O silêncio depois da batalha era mais ensurdecedor que o próprio caos da guerra. Meus passos eram lentos enquanto caminhava de volta pela trilha marcada por magia queimada e terra revirada. O cheiro de sangue ainda pairava no ar, misturado ao aroma mais sutil das ervas que Lis deixara atrás de si — sinais da proteção mágica que ela conjurara para manter o campo seguro. Atrás de mim, cambaleante, o feiticeiro seguia preso por correntes encantadas. As runas brilhavam num tom prateado-violeta, selos ancestrais trançados por minha magia com a força de gerações. Ele não dizia uma palavra. O olhar vazio, como se finalmente compreendesse o peso de sua derrota. Ao longe, ouvi os primeiros sons do nosso acampamento. Vozes. Risos abafados. O choro de um bebê que provavelmente havia sido retirado às pressas durante o ataque. O som da vida persistindo, mesmo diante da morte. Respirei fundo. Atravessamos o último trecho de floresta até emergir na clareira onde nossos aliados estavam reuni
A terra parecia pulsar sob meus pés. O cheiro de magia corrompida se espalhava como veneno, encharcando o ar, pressionando contra minha pele como um peso invisível. Eu sentia Freiren se agitar sob minha carne, inquieta, pronta. Meus dedos apertavam com firmeza os cabos das espadas gêmeas, cada uma pulsando com minha energia, respondendo ao chamado do sangue. À minha frente, o campo se abria em um círculo silencioso. Os sons da guerra haviam se distanciado, como se o mundo entendesse que aquele instante exigia respeito. E ali, no centro de tudo, ele me esperava. O feiticeiro. Alto, magro como um galho seco, com olhos tão negros que pareciam fendas no tecido do mundo. Seu manto esvoaçava sem vento. A presença dele curvava o ar ao redor. Havia algo de impossível em sua forma — como se ele pertencesse a outro tempo, ou a nenhum. — Finalmente — ele disse, a voz ressoando como um sussurro dentro do meu crânio. — A herdeira do sangue antigo. A mãe das luas renascidas. Dei um passo
O cheiro de magia corrompida enchia o ar. Denso. Podre. Uma neblina púrpura rastejava pelo campo de batalha como uma serpente viva. Eu a sentia tentar se enroscar nas raízes da minha alma, mas a empurrei de volta com um rugido vindo do meu centro. Meu olhar atravessou o caos até encontrá-lo. Ele. O homem que um dia partilhou comigo o ventre. O mesmo rosto, os mesmos olhos. Mas tão diferentes agora. Eu era lobo. Ele era sombra. Ele me viu também. E sorriu. Aquela curva fria dos lábios, que nunca pertenceu a mim. O sorriso que um irmão não deveria dar ao outro. Ele caminhou entre os corpos, abrindo espaço como se o próprio campo de batalha o temesse. — Caelum. — Sua voz era baixa, mas ressoava nos ossos. — Eu sabia que nos encontraríamos aqui. Parei à sua frente, firme. Os sons da guerra sumiram. Como se o mundo prendesse o fôlego. — Sempre soube que terminaria assim entre nós, irmão. — Ah, você sempre foi bom em prever tragédias, não é? — Ele deu um passo adiante. — Mas nunca
O primeiro clarão no céu não veio de raios naturais — mas de magia. Um estrondo ressoou como se o próprio firmamento estivesse rachando. Um feixe de energia púrpura e escarlate desceu da colina onde os inimigos estavam agrupados, cortando o ar como uma lâmina dos deuses. Era o primeiro ataque. E um aviso. — Escudos agora! — gritou Lis. As bruxas ao nosso lado — as aliadas que atenderam ao chamado de Lis — levantaram as mãos em uníssono. Círculos rúnicos surgiram no ar, formando camadas de luz dourada e prateada. Uma cúpula mágica envolveu a linha de frente do nosso exército momentos antes da explosão atingir. O impacto fez a terra tremer. Eu senti a vibração subir pelas minhas botas, ecoar nos ossos, sacudir os galhos ao nosso redor. Mas a barreira resistiu. As bruxas aliadas, lideradas por uma mulher de olhos de âmbar e cabelos trançados com penas lunares, mantinham as mãos erguidas, os olhos brilhando. Cânticos antigos saíam de suas bocas em uníssono, enquanto uma delas sangra
O som dos cascos ecoava pela terra úmida como um tambor de guerra que se aproximava mais a cada batida. A névoa matinal ainda rastejava sobre o chão, envolvendo as árvores em véus de silêncio. Mas não havia mais paz. Não havia mais tempo. Eu caminhava com os outros, sentindo o peso da armadura sobre meus ombros, ajustada ao meu corpo pela forja de Freiren e encantada com runas traçadas por Lis. Era negra como obsidiana, com detalhes prateados que cintilavam à luz mortiça. Nas costas, as duas espadas cruzadas pulsavam com a minha magia — lâminas que respondiam à fúria que eu carregava no peito. Ao meu lado, Lis caminhava em silêncio, a capa azul prateada esvoaçando atrás dela. Seu diadema com os símbolos da Lua brilhava sobre a testa, e seus olhos estavam tão atentos quanto os de um predador. Ela carregava seu bastão rúnico em uma das mãos e algumas poções presas ao cinto. Sua magia vibrava no ar, tão viva quanto o fogo de uma estrela. Caelum liderava a linha, imponente em sua arma
Último capítulo