Alicia não conseguia dormir. Mesmo com os olhos fechados, a imagem de Kael ainda estava lá, firme em sua mente, como uma sombra que a seguia. O cheiro dele — forte, selvagem — parecia impregnado em seu próprio corpo, como se ele tivesse deixado sua marca em cada parte de sua pele. A marca, a marca dourada que ainda queimava em seu ombro, lembrava-lhe constantemente que não podia fugir, não importava o quanto tentasse.
Ela virou de lado na cama, os lençóis amassados ao redor de seu corpo. O vento frio batia contra a janela, mas nada parecia capaz de acalmá-la. Por mais que tentasse racionalizar a situação, uma parte de si se recusava a acreditar no que sua mãe havia dito. Era demais para absorver de uma vez. Ela, filha de uma loba exilada da matilha Draven? O destino, a linhagem dos “Lobos da Lua”? Isso era loucura, não podia ser verdade.
Mas a dor da marca não mentia.
Alicia se levantou, andando pela casa em silêncio. A casa estava vazia, como de costume. Sua mãe havia saído, provavelmente para algum tipo de reunião, como sempre fazia quando queria evitar uma conversa difícil. Ela se sentiu sozinha, mais isolada do que nunca.
O frio da noite parecia mais pesado à medida que a mente de Alicia continuava a girar. Ela precisava entender o que estava acontecendo com ela, entender sua origem, e o que Kael queria dela. Ele não era apenas um alfa qualquer — ele era o líder de uma matilha poderosa, uma força implacável. E ela não sabia como lidar com isso.
Foi então que ela ouviu o som. Algo suave, um estalo vindo da porta dos fundos. Alicia congelou, seus sentidos imediatamente alertas. O silêncio da casa desapareceu, substituído por uma tensão palpável.
Ela caminhou lentamente até a porta, os dedos envolvendo a maçaneta. Estava prestes a abri-la quando parou, o instinto a fazendo hesitar. Algo não estava certo. A sensação de estar sendo observada novamente — como se estivesse sendo observada de longe, por olhos que conheciam cada movimento seu.
Ela abriu a porta com um impulso, e o que viu fez seu coração saltar no peito.
Kael estava ali, parado na escuridão do lado de fora, sua figura alta e imponente como uma sombra. Ele não se moveu, apenas a observou com aqueles olhos intensos, profundos e imutáveis. Mas havia algo no ar, uma vibração de poder, de perigo, que Alicia não podia ignorar.
— O que você quer, Kael? — A voz dela estava carregada de desafio, mas também de confusão. Ela não sabia o que ele queria, mas o medo de se render àquela atração brutal fazia sua respiração ficar pesada.
Kael deu um passo à frente, seus passos ecoando na noite silenciosa.
— Eu quero que você entenda. — A voz dele, profunda, carregada de algo que Alicia não conseguia nomear, cortou a distância entre eles. — Que você pare de fugir de quem você realmente é.
Ela deu um passo para trás, a tensão subindo. O que ele estava dizendo? Ela estava fugindo de si mesma? Ou estava fugindo dele?
— Eu não sou nada disso, Kael. Não sou um animal selvagem que se submete à sua vontade. Eu sou Alicia Blake, e não vou ser parte da sua matilha — a palavra saiu de seus lábios com uma força que ela não sabia que tinha.
Ele sorriu, e esse sorriso era tudo, menos gentil. Era um sorriso que falava de algo mais profundo, de algo que ela ainda não entendia. Ele avançou um passo, agora tão perto dela que Alicia podia sentir a energia que emanava dele.
— Você não tem escolha, Alicia. — Ele se aproximou ainda mais, seus olhos agora quase tocando os dela. — O vínculo está em você, está em seu sangue. Não adianta resistir ao que você já é.
Alicia queria gritar, queria empurrá-lo para longe, mas seu corpo não respondia como ela queria. Em vez disso, ela sentiu algo que não podia negar. O calor dentro dela, a pulsação da marca, tudo aquilo estava crescendo, se expandindo, se tornando uma parte dela de uma maneira que não podia ignorar.
— Não… — ela sussurrou, a voz quebrando com a tensão. — Isso não é possível. Eu não sou sua.
Kael a observou em silêncio, os olhos penetrando-a como se estivesse tentando ver através de suas palavras, de suas defesas. E naquele momento, Alicia percebeu que ele não estava ali apenas como o Alfa da matilha. Ele estava ali porque havia algo mais entre eles. Algo que ela não queria aceitar.
O silêncio se fez pesado, enquanto as palavras de Kael ecoavam na mente de Alicia: "Você não tem escolha".
Ela queria negar, queria gritar que estava errada. Mas uma parte de seu ser, uma parte escondida e primal, sabia que Kael falava a verdade. O destino a chamava, e, como tudo na vida, não havia como escapar de seu poder.
Alicia finalmente afastou o olhar de Kael, seu corpo tenso, suas mãos tremendo.
— O que você vai fazer agora? — ela perguntou, a raiva e o medo se misturando em sua voz. — Me forçar a aceitar isso?
Kael não respondeu imediatamente. Em vez disso, ele observou, seu olhar se suavizando por um breve momento, como se estivesse vendo mais do que apenas a resistência de Alicia. Como se estivesse reconhecendo algo nela.
— Não. — Ele fez uma pausa, sua voz mais suave. — Eu vou esperar. E você vai ceder, Alicia Blake. Eu sei que você vai. O destino, o vínculo, o sangue… nada vai impedir isso.
O que ele disse, as palavras vazias de significado imediato, causaram um arrepio profundo nela. Mas o pior de tudo foi que, no fundo, algo dentro dela sabia que ele estava certo.
Com um último olhar, Kael se afastou, deixando Alicia sozinha na noite silenciosa, seu coração pulsando com a pressão de um futuro que ela não conseguia controlar.
Era apenas o começo.
O sol mal começava a aparecer no horizonte quando Alicia acordou. O pesadelo da noite anterior ainda a assombrava, as palavras de Kael reverberando em sua mente, como uma melodia sombria que ela não podia tirar da cabeça. Eu vou esperar. Você vai ceder.Ela se levantou da cama, sentindo o peso de cada movimento, como se as forças de seu próprio corpo estivessem contra ela. O cheiro da terra molhada entrava pela janela, trazendo consigo um leve alívio. Mas isso não foi o suficiente para dissipar o tormento que se instalava em seu peito. A marca dourada no seu ombro parecia pulsar a cada batida de seu coração, e embora tivesse tentado ignorá-la, não podia negar que algo em seu interior começava a responder a isso — como se a marca tivesse vida própria.Ela desceu as escadas, os pensamentos tumultuados. Não queria aceitar, não queria ceder. Mas algo dentro dela sabia que era uma luta que estava fadada ao fracasso. O destino... o sangue... a matilha...A casa estava vazia, mas o ar pesado
Alicia não sabia mais se estava correndo ou apenas vagando sem rumo. As sombras da floresta à sua volta pareciam se esticar e se mover com ela, como se estivessem vivas, pulsando ao ritmo de seu coração descompassado. O vento cortava sua pele, trazendo consigo o cheiro da terra molhada e o sussurro de algo distante. Algo que a chamava.Ela havia se afastado da casa, sem um destino claro, mas não conseguiu ignorar o impulso crescente de seguir para o coração da floresta. Havia algo lá. Algo que ela não podia mais evitar. E, apesar de toda a confusão que a consumia, algo em seu interior a guiava, como um fio invisível puxando-a para longe da segurança do familiar e em direção ao desconhecido.A marca dourada em seu ombro ardia com cada passo, e ela apertou a mão sobre o local, tentando aliviar a sensação incômoda. Mas era como se a marca estivesse viva, pulsando com a energia de algo mais antigo, mais poderoso.Ela sabia que Kael estava em algum lugar por perto, sentindo sua presença, m
O amanhecer chegou tímido, com a luz da lua ainda pintando a floresta de um tom prateado, mas já era possível ver o contorno das árvores que se estendiam ao longe, como sentinelas silentes. Alicia estava ali, sozinha no campo, com o peso da noite ainda pressionando sua mente. O lobo, Kael, a floresta… tudo parecia uma dança fora de controle, onde ela era forçada a dar passos que não queria.Ela se afastou da clareira onde havia enfrentado o lobo, suas pernas ainda pesadas pela experiência. A marca no ombro pulsava de forma constante, como um lembrete cruel do que ela não podia ignorar, mesmo que quisesse. Algo dentro dela, talvez o sangue que agora fluía com uma força que não conhecia, gritava para que ela aceitasse. Mas ela se recusava. Não seria uma peça no jogo dele, não seria parte da matilha de Kael Draven.Ainda assim, o silêncio ao seu redor a incomodava. A floresta, que antes parecia cheia de mistério e vida, agora parecia observá-la, esperando por algo que ela ainda não enten
O silêncio pairava pesado sobre a clareira, quebrado apenas pelo som abafado das folhas sob os pés de Kael.Alicia ainda sentia a pele quente, onde a marca dourada agora repousava, quase adormecida, sob o tecido de sua blusa. Ela se afastou dele com um passo hesitante, como se cada centímetro de distância fosse uma pequena vitória sobre o turbilhão que se formava dentro de si.— Isso não significa nada — ela sussurrou, com a voz mais firme do que esperava. — Eu não te conheço. Não conheço esse lugar. Essa marca… não muda quem eu sou.Kael não respondeu de imediato. O olhar dele a atravessava, escuro, intenso. Como se pudesse vê-la além da carne, além da teimosia.— Ainda não. — A voz dele era baixa, mas carregada de uma certeza perigosa. — Mas vai mudar.Alicia cruzou os braços. Era um gesto defensivo, mas também desafiador. Algo nela se recusava a ceder. Mesmo quando tudo gritava para que ela se entregasse.— Me leve de volta. Quero ir embora.Kael a observou por mais um momento ante
Acordar naquela manhã foi como emergir de um sonho que ainda agarrava sua pele. Alicia sentia o corpo dolorido, os músculos tensos, como se tivesse corrido por horas — ou lutado com algo que ainda não compreendia.A marca em seu ombro latejava. Pulsava como um segundo coração.Ela se vestiu com roupas que haviam deixado para ela — calça de tecido grosso, uma blusa justa de mangas compridas e botas reforçadas. Roupas de treino, aparentemente. E quando desceu as escadas da casa, encontrou uma mulher à porta, esperando-a com os braços cruzados e um sorriso enviesado no rosto.— Bom dia, princesa da lua. — A voz era irônica, mas não hostil. — Eu sou Thalia. Beta da matilha. E hoje a gente vai descobrir se você serve pra mais do que carregar uma marca bonita.Alicia arqueou a sobrancelha.— Sempre tão acolhedores por aqui?Thalia soltou uma risada baixa.— Você não faz ideia.A clareira de treino ficava num platô elevado, cercado por árvores grossas e o som constante da floresta viva. Vári
O cheiro de sangue cortava o ar.Alicia corria atrás de Kael, os galhos batendo em seus braços como chicotes, mas ela mal sentia. Seu corpo estava alerta, os sentidos aguçados como se uma parte dela — uma parte antiga, selvagem — tivesse despertado.Eles chegaram à clareira e a cena diante deles fez seu estômago revirar.Três lobos estavam caídos. Dois guerreiros da matilha e um outro… um invasor. O pelo dele era negro como a noite, os olhos vidrados, arregalados em ódio mesmo depois da morte. O símbolo dos renegados estava cravado em seu peito — um X cortando a marca da própria linhagem. Um juramento de exílio. E de vingança.— Renegados? — Alicia murmurou, tentando entender o que estava acontecendo.Kael já estava ajoelhado ao lado de um dos lobos feridos. Seus olhos estreitos, os punhos cerrados. — Eles não atravessavam nossas fronteiras há meses. Isso foi um recado.— Um recado pra quem?Ele se virou para ela. O olhar afiado como lâmina.— Pra você.O silêncio caiu como uma senten
O som dos uivos rasgou a madrugada.Alicia despertou ofegante, os lençóis colados à pele pelo suor. O quarto estava escuro, mas o brilho da lua atravessava as frestas da janela, banhando o chão com um feixe prateado. O mesmo brilho que agora pulsava em sua marca, queimando com uma intensidade que ela nunca havia sentido.Ela se levantou com pressa. Algo estava errado.Do lado de fora, vozes se misturavam aos rosnados. Lobos em alerta. Passos apressados ecoavam pelo vilarejo. Alicia correu, vestindo às pressas a calça e a jaqueta que estavam sobre a cadeira. Assim que abriu a porta, Thalia apareceu à frente, os olhos arregalados.— Eles voltaram. Mais lobos renegados. Vieram em maior número desta vez.— Onde está Kael? — Alicia perguntou, já descendo os degraus.— No limite da floresta. Ele ordenou evacuar os jovens e os idosos. Vamos segurá-los até que todos estejam seguros.Alicia assentiu, mas algo dentro dela se rebelava. Ela não queria apenas fugir. Não queria apenas se esconder.
O calor da lareira não alcançava a tempestade dentro de Alicia.Mesmo envolta em cobertores, com uma xícara fumegante nas mãos, ela não conseguia se aquecer. O corpo ainda pulsava com a lembrança da transformação — da força crua, da fúria em sua carne, do instinto que havia tomado o controle.Ela havia matado.Mas, mais do que isso, havia despertado algo que não compreendia. Algo que não era totalmente lobo… nem humano.— Ainda está tremendo? — Thalia sentou-se ao lado dela, oferecendo um segundo cobertor. — Sua energia está instável. O despertar mexe com tudo — mente, corpo… alma.Alicia balançou a cabeça, os olhos fixos nas chamas.— Eu me vi de fora, sabe? Por um momento. Como se eu não fosse eu.Thalia suspirou. — Isso acontece com os que carregam o sangue da Lua. Seu poder não é comum. Nem deveria estar adormecido por tanto tempo. Quando despertou… veio como uma avalanche.— E minha mãe? — Alicia perguntou, sem rodeios. — Ela também era assim?Thalia hesitou. Olhou em direção à p