Mundo ficciónIniciar sesiónVoss se apoiou em um escombro próximo, os braços cruzados, observando Yaskara enquanto ela lançava as bolhas temporais sobre os feridos.
O brilho dourado se espalhava em ondas calmas, envolvendo cada corpo. As feridas regrediam com precisão quase cirúrgica — o tipo de controle que nem ele via com frequência.
— Huh… quente, você disse? — murmurou, um sorriso torto no rosto. Os olhos azul-prateados acompanhavam cada movimento dela. — Não, não é o clima. — fez uma breve pausa, o tom leve. — É você. Mexendo com o tempo desse jeito… até o ar parece pegar fogo.
Ele se inclinou um pouco, estudando o efeito das bolhas com genuína curiosidade.
— Sério, Yaskara… — balançou a cabeça, um meio sorriso escapando — cada gesto seu é calculado. Nenhum desperdício, nenhum movimento fora do lugar.
O olhar dele permanecia fixo nela, avaliando e se divertindo ao mesmo tempo.
— Me diga… isso é sempre tão divertido pra você? — fez aspas com os dedos. — Mexer com o tempo dos outros como se fosse… um brinquedo de criança?
Yaskara ergueu os olhos para ele. Por um instante, a luz dourada das bolhas refletiu em suas íris azuis, dando-lhes um brilho frio e cortante.
— Divertido? — repetiu, o tom neutro, mas firme. — Isso é trabalho.
Desviou o olhar de volta aos feridos.
— Não há nada de divertido em estar no meio de um massacre. — As mãos continuavam em movimento, o Éter fluindo em sincronia com a respiração dela.
— Mas é reconfortante — completou em voz baixa — quando consigo cuidar de todos assim.
Voss arqueiou uma sobrancelha, o sorriso permanecendo no canto dos lábios enquanto observava o brilho intenso dos olhos dela. Por um instante, ele ficou em silêncio — algo raro.
— Trabalho, hein? — repetiu, o tom mais suave agora, quase como se saboreasse a palavra. — Então quer dizer que mesmo alguém que dobra o tempo ainda tem dias “comuns de expediente”? — ele soltou uma risadinha curta, inclinando a cabeça para o lado.
Ele se aproximou devagar, as mãos nos bolsos do sobretudo, sem invadir o espaço dela, mas o bastante para observar as bolhas douradas refletindo na pele de Yaskara.
— “Reconfortante”, você disse… — repetiu, estudando o rosto dela como quem lê uma fórmula complexa. — Interessante. Quando eu cuido de todos, geralmente é porque já não sobrou mais ninguém pra me atrapalhar. —sorriu de modo atrevido, mas o tom é calmo, curioso.
— Me pergunto… — ele inclinou o rosto levemente, tentando alcançar o olhar dela de novo — O que te motiva mais: salvar as pessoas ou vencer o tempo?
Há um breve silêncio. A pergunta pairou no ar, meio brincadeira, meio provocação — mas carregada de interesse genuíno.
Yaskara arqueou uma sobrancelha diante da pergunta, o olhar se voltando brevemente para ele.
— Que pergunta estranha... — murmurou, pensativa.
Por um instante, pareceu realmente considerar a resposta.
— Eu apenas salvo as pessoas vencendo o tempo. — disse com simplicidade, como quem explica algo óbvio demais.
— Nunca pensei nisso de forma isolada.
Quando o último ferido retomou a respiração normal, ela baixou lentamente o braço.
As bolhas temporais se desfizeram em fragmentos de luz, desaparecendo uma a uma — o tempo retomando seu curso natural.
Voss observou as últimas bolhas douradas se desfazer no ar, a luz refletindo em seus olhos azul-prateados enquanto ela falava.
Por um instante, o habitual sorriso debochado se apagou — substituído por algo quase contemplativo.
Ela o observou em silêncio, o olhar acompanhando aquele sorriso que surgia fácil demais. Havia algo irritantemente natural naquilo — como se ele soubesse exatamente o efeito que causava e ainda se divertisse com isso.
Arrogante, pensou.
Mas, apesar da irritação inicial, não conseguiu negar: havia algo bonito ali. Os sorrisos dele tinham uma leveza rara, livre, quase descuidada — e talvez fosse isso que a desarmava.
Enquanto ela passava a vida controlando o tempo, ele parecia simplesmente viver dentro dele, sem pedir permissão a ninguém.
— Hm… — murmurou ele baixo, mais para si do que para ela. — “Salva as pessoas vencendo o tempo.” Bonito isso. Poético até.
Voltou o olhar para ela, e o sorriso reapareceu, agora com um toque de respeito genuíno.
Ele deu um passo à frente, o som das botas esmagando fragmentos de concreto pelo chão destruído de Liberdade.
— Você sabe, ...Yaskara… a maioria das pessoas que eu conheço tenta salvar o mundo lutando contra o impossível. Mas você — gesticulou com a mão, desenhando o conceito no ar — literalmente o reescreve.— Isso te coloca em uma categoria bem diferente.
Por um breve instante, o tom dele se tornou sério — raro, vindo de Voss.
— E talvez seja por isso que você não deva aparecer muito. — o olhar azul se estreitou, pensativo. — Gente assim… atrai olhares errados.
Em seguida, o sorriso despreocupado voltou, leve como uma brisa.
— Mas é bom saber que, quando o tempo decide brincar contra a gente, tem alguém que sabe brincar melhor.
Ele piscou para ela, o sarcasmo habitual voltando à voz:
— Agora, senhorita… que tal me dizer onde é que andava escondida todo esse tempo?
Yaskara levantou o olhar, observando o céu.
O dia nem parecia tão quente — e, mesmo assim, sentia o corpo arder.
“Será que usei poder demais?” — pensou, sentindo o ar vibrar levemente ao redor.
— Te conto — respondeu, voltando o olhar para ele — só se me levar para um lugar fresco e me oferecer algo gelado.
Antes que ele respondesse, seus olhos captaram uma movimentação no perímetro.
Ela inclinou levemente a cabeça na direção oposta, o tom mudando para o prático.
— Ah… — murmurou. — Vejo que seu pessoal chegou para limpar a bagunça.
Voss seguiu o olhar dela, observando os grupos de magos de suporte chegando às pressas.
O som dos rádios, das botas contra o asfalto rachado e das magias de contenção ecoava entre os destroços.
Ele suspirou — alívio contido — mas o sorriso continuava, preguiçoso e provocante.
— É… o reforço chegou. — comentou num tom despreocupado, ajustando o colarinho do uniforme. — Finalmente alguém pra varrer o caos que eu deixei por aqui.
Virou-se de volta para Yaskara.
Os olhos azul-prateados capturaram o brilho dourado que ainda pairava no ar ao redor dela, luz e poeira se misturando como ecos de um poder que o intrigava.
— Um lugar fresco e algo gelado, huh? — disse com uma risada curta, meio divertida, meio cansada. — Sabe, senhorita Borh, você fala isso como se não tivesse acabado de reverter o tempo e curar meia dúzia de magos gravemente feridos.
Deu de ombros, o sorriso se curvando num tom quase afetuoso. — Qualquer outro no seu lugar estaria desmaiado agora.
Ele deu um passo mais perto, as mãos ainda nos bolsos, inclinando-se ligeiramente para o lado — a voz baixou, num tom quase confidencial:
— Mas quer saber? Aceito o convite. — o sorrisinho de canto apareceu, brincalhão, mas com genuína curiosidade nos olhos. — Um lugar fresco, algo gelado… e uma conversa sobre como uma maga que brinca com o tempo aparecendo do nada e salva o homem mais poderoso do mundo.
Endireitou-se, lançando um olhar para o fim da rua destruída e indicando com a cabeça.
— Vamos, antes que esses “meus” comecem a fazer perguntas demais. — fez uma pausa breve, voltando o olhar para ela. — E, por favor… — um meio sorriso de canto — nada de me colocar em outra dessas bolhas. Ainda tô tentando entender como é que voltei inteiro.
Amaga soltou uma risadinha curta, divertida com o último comentário dele, e o seguiu.
— Pode deixar… — respondeu, o tom leve, quase brincalhão. — Prometo não brincar mais com o seu tempo… por hoje.
Voss caminhava à frente, desviando preguiçosamente dos destroços, as mãos nos bolsos e o tom descontraído voltando ao rosto.
O vento quente de Liberdade soprava pelos cabelos brancos enquanto ele olhava de canto para Yaskara, notando o contraste entre o dourado suave do Éter que ainda se dissipava e o azul sereno dos olhos dela.
— Sabe… — comentou, a voz leve, mas carregada daquele humor característico — é meio estranho estar andando depois de literalmente ter sido cortado ao meio.
Fez um gesto com as mãos, como quem mostra o próprio corpo.
— Mas olha só, cá estou eu: inteiro, andando, falando besteira. Acho que o tempo realmente estava ao meu favor.
Riu baixo, o som misturando-se ao ruído distante das sirenes e dos passos apressados que ecoavam mais atrás.
Discreto, olhou por sobre o ombro — o brilho azul em seus olhos acendeu o ar como uma fenda.
“É”, pensou, “o Conclave já sentiu o cheiro.”
Respirou fundo, o sorriso voltando de forma quase preguiçosa.
— E eu que achava que já tinha visto de tudo… ecos, espaço, infinito… — lançou um olhar divertido para ela. — Mas alguém que dobra o tempo? Isso é novo até pra mim.
Depois de alguns metros, ergueu o queixo em direção a um pequeno café parcialmente intacto do outro lado da rua — as portas de vidro ainda de pé, cobertas de poeira e rachaduras.
— Aí está. Um milagre em meio ao caos. — Fez um gesto brincalhão com a mão, como se apresentasse um prêmio. — Um café ainda de pé… e, se tivermos sorte, talvez até gelo.
Virou-se para ela com um sorriso mais suave, quase genuíno.
— Depois de tudo isso… acho que você merece ser a primeira a escolher o que vamos beber, senhorita “Não-brinco-com-o-tempo.”
Ela se sentou em uma das mesinhas próximas ao ar-condicionado, respirando fundo ao sentir o ar fresco. Tentou não demonstrar o cansaço, cruzando as pernas e ajeitando o cabelo com naturalidade.
Quando a garçonete se aproximou, Yaskara respondeu com calma:
— Eu quero um café gelado — disse, gesticulando com a mão, como se desenhasse a cena no ar — daqueles com bastante creme.
Depois, voltou o olhar para ele, o canto dos lábios curvando-se levemente.
— E você, senhor Voss? — perguntou, com a voz tranquila, mas um brilho sutil de provocação. — Quer algo?
Voss se encostou preguiçosamente na cadeira à frente dela, deixando o sobretudo pender sobre o encosto.
A garçonete se virou, caneta em mãos.
Ele sorriu — aquele sorriso que misturava charme e descuido calculado.
— Hm… um café gelado também, então. — fez um gesto com os dedos, como se medisse o exagero. — Mas pode caprichar no açúcar. Muito açúcar. Quero garantir que vou continuar tão doce quanto dizem por aí.
A garçonete riu, anotou o pedido e se afastou.
Voss apoiou o cotovelo na mesa e o queixo sobre a mão, o olhar fixo em Yaskara.
Não era o olhar de um homem analisando uma inimiga — mas de alguém tentando entender um enigma divertido.
— Sabe o que é engraçado, Yaskara? — começou, o tom leve, mas com aquele brilho astuto nos olhos. — Eu sempre achei que ninguém deveria ter poder suficiente pra brincar com conceitos como tempo ou realidade.
Fez uma pausa curta, observando o reflexo dourado do Éter ainda preso às pontas do cabelo dela.
— Mas você faz parecer… natural.
Riu baixo, inclinando a cabeça.
— Aposto que foram os velhotes que te mandaram pra cá. Devem estar morrendo de medo. — forçou uma voz grave e carrancuda: — “Cuidado, Eiran Voss, essa mulher é perigosa, ela pode apagar o passado inteiro se quiser.”
Voltando ao tom normal, deu um meio sorriso.
— Mas aqui está você. Tomando café gelado, calma, rindo, depois de encarar o Amaruq de frente.
Por um instante, o humor dele cedeu lugar à curiosidade genuína.
O olhar azul se manteve sobre ela, firme, mais sério.
— Então, senhorita Borh… o que te trouxe até aqui de verdade?
— Não me convence que foi só um favor aos velhotes. Pessoas como você não se movem por obrigações — se movem por escolhas.







