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Capítulo 5 – Máscaras em seda

POV Isabela Costa

Pedi que o motorista me levasse direto à sede da Associação Mulheres de Nova Augusta. Uma mansão convertida em espaço cultural, onde algumas das mulheres mais influentes da cidade jogavam conversa fora sob a desculpa de empoderamento feminino. E eu era uma delas, a mais fotografada, a mais seguida, a mais intocável. Ou pelo menos era isso que todas achavam.

— Senhora Costa, bem-vinda — disse a recepcionista assim que cheguei. — A Dra. Fabiana está no jardim com as outras.

Fabiana Tavares. A presidente da associação. Uma mulher que usava saltos de mil reais para esconder as pegadas de corrupção. E uma das três que dividiam a cama do meu marido. Em dias alternados, provavelmente. Atravessei o hall de mármore com postura de vitrine. Toda mulher sabe: quando está sangrando por dentro, mantenha o queixo erguido e os ombros firmes. O resto é performance. O jardim estava impecável. Bougainvilles floridos, cadeiras coloniais ao redor de uma mesa de chá montada como em um filme britânico. Elas estavam todas lá.

Fabiana, de tailleur branco e óculos escuros. Rebeca, a influencer de risada fácil, tirando selfies com o bule de prata. E Lívia. Sentada ao centro. Como se já tivesse conquistado o trono. Todas viraram quando me aproximei.— Isa! — Fabiana se levantou, me abraçando com aquele perfume caro que cheirava a mentira. — Estávamos falando de você!

— Espero que bem — respondi, sorrindo.

— Sempre. Você é o rosto da nova mulher pública. Bela, discreta e letal — disse Rebeca, como se tivesse ensaiado a frase num espelho.

— Letal? — Lívia perguntou, rindo. — A Isa é um anjo. É por isso que ela brilha tanto.

— Às vezes, os anjos também caem — respondi, pegando a taça de chá.

Lívia me lançou um olhar breve. Fabiana fingiu não ouvir. Rebeca se distraiu com o celular. Mas eu vi. Todas estremeceram, por dentro. Mesmo que ainda não soubessem por quê.

— Estávamos comentando sobre o jantar de gala — disse Fabiana. — Você vai deslumbrar, como sempre. Daniel deve estar orgulhoso.

Sorri.

— Ele sempre está. Principalmente quando eu o surpreendo.

Rebeca deu risada. Lívia mexeu o colar. Fabiana mudou de assunto rápido demais.

— Estamos pensando em lançar uma nova frente de apoio a mulheres empreendedoras. Você toparia liderar?

— Claro — respondi sem hesitar. — Mulheres apoiando mulheres... é um dos meus valores mais profundos.

O deboche foi sutil. Quase invisível. Mas quando olhei para Lívia, ela desviou os olhos. O instinto falou antes da razão. Ela sabia que algo não batia. Mas ainda não sabia o quê. E era assim que eu gostava.

No fim da reunião, tirei uma foto com as três. Meu braço em volta da cintura de Lívia. Meu sorriso impecável. E o post pronto na legenda da influencer: “As mulheres mais fortes são as que se unem. #sororidade #liderança #poderfeminino”

Mal sabiam elas... que a mulher ao centro da foto já tinha decidido quem iria cair primeiro.

Me despdi das três com abraços polidos e sorrisos ensaiados. Fabiana me lançou um olhar que parecia mais uma pergunta do que um adeus, mas não disse nada. Lívia saiu com muita pressa, pois recebeu uma ligação. Rebeca já estava tirando fotos para postar. Caminhei sozinha pela lateral do casarão da associação, onde o motorista me esperava. Mas antes de chegar ao portão, um reflexo me chamou atenção.

Daniel, ao lado do seu carro. Lembro que ele estava em uma reunião no prédio ao lado da Associção das Mulheres.  Ele estava do outro lado da rua, parcialmente escondido por uma árvore. Parado. Vidros semiabertos. Ele não viu que eu o vi. Inclinei-me discretamente atrás do muro de pedra coberto de trepadeiras. Minha respiração ficou contida. Quase suspensa. Daniel falava ao telefone. Voz baixa, tom firme. E, por sorte ou ironia, o painel do carro acendeu por segundos: “Lívia trabalho”.

— Não, você não vai faltar hoje. Preciso que esteja lá. Perto de mim. Ela não sabe de nada.

Ele fez uma pausa. Riu.

— Confia em mim, amor. É só mais um teatro. Ela nasceu para ser fachada.

Meu coração bateu seco. A raiva me percorreu como eletricidade estática debaixo da pele. E mesmo assim, continuei ouvindo.

— Não quero mais beijos escondidos. Depois da eleição, tudo muda. Você sabe. Eu vou tirar a máscara... por você.

Desligou.

Fiquei parada por mais alguns segundos, como se meu corpo precisasse de permissão pra se mover. A frase martelava: "Depois da eleição, tudo muda." Claro que muda. Porque até lá, eu ainda sou útil.

Respirei fundo. Endireitei os ombros. E saí de trás do muro como se nada tivesse acontecido. Caminhei com calma até meu carro. Quando entrei, o motorista já estava pronto para dar partida.

Mas então o celular vibrou. Tela acesa. Número desconhecido. Nenhuma foto. Nenhum nome. “Você não faz ideia do quanto ele mente. Mas eu posso mostrar.” Olhei ao redor. Ninguém por perto. A mensagem desapareceu segundos depois. Apagada automaticamente. Fechei os olhos por um instante, sentindo a adrenalina percorrer cada vértebra. Daniel achava que eu era a mulher perfeita. A decoração da fachada. A estátua de porcelana que ele podia exibir. Mas porcelana também corta. E eu estava pronta para sangrar quem fosse necessário.

***

20h - Jantar de Gala

A escadaria do Hotel Elysée parecia feita de vidro líquido. Luzes douradas, câmeras piscando, sorrisos em cada canto. Todos ali esperavam por algo: uma declaração, uma foto perfeita, um tropeço. Eu entregaria só o que quisesse. Nada mais. Daniel estendeu a mão quando descemos do carro. Peguei, claro. O show havia começado.

— Está maravilhosa — ele sussurrou, como quem fala para o público, não para mim.

— Sempre estou — respondi sem sorrir, sem virar o rosto.

Fotógrafos se amontoavam. Gritavam nossos nomes como se fôssemos os protagonistas de um épico. E talvez fôssemos. Só que eles ainda não sabiam que era um épico de vingança. Entramos no salão principal. Lustres de cristal, pianista ao vivo, garçons servindo champanhe como se fosse água. A elite inteira estava ali. E todas as máscaras também.

— Isabela! — ouvi a voz de Fabiana ao longe. — Que entrada divina. Você é o próprio pôr do sol!

Virei com um sorriso estudado e caminhei até a mesa da associação. E lá estava ela. Lívia. Vestido preto com decote nas costas. Batom vinho. Cabelos soltos. A amante tentando parecer a dama.

— Que bom que veio — falei, me aproximando. — Você precisava estar aqui.

Ela arregalou os olhos por um segundo. Só um. Mas foi suficiente para que eu soubesse: algo dentro dela tremeu.

— Eu... claro. É uma honra estar com vocês.

— O Daniel vai adorar ver você — completei. — Afinal, vocês dois têm se encontrado bastante ultimamente, né?

O silêncio durou meio segundo a mais do que o aceitável. Mas ela se recompôs. Riu.

— Reuniões da associação. Coisa de bastidores, você sabe.

Eu assenti. Bastidores. Era tudo o que ela seria em breve. De longe, vi Leonel conversando com dois empresários. Mas seus olhos estavam em mim. Não como um homem olha uma mulher bonita. Era diferente. Como alguém que observa o movimento de uma cobra prestes a dar o bote. Ele sabe que tem algo acontecendo. E parece pronto para escolher um lado. Só não sei qual ainda.

— Filha, venha — chamou meu pai, impaciente, indicando nossa mesa.

A família perfeita precisava sentar unida. Antes de ir, olhei para Lívia.

— Te espero no lounge depois. Precisamos conversar. Mulheres influentes... têm que se manter unidas, não acha?

Ela forçou um sorriso.

— Claro, Isa. O que você quiser.

Mal sabe ela que a única coisa que eu quero agora... é ver esse teatro desmoronar com ela no centro do palco.

— E com vocês, Lívia Ribeiro! — anunciou o mestre de cerimônias.

Luzes sobre ela. Vestido preto, pose estudada. Lívia subiu ao palco com aquele ar de mulher que acredita que chegou ali pelo mérito e não pelo banco de trás de um carro com vidros escuros. O salão aplaudiu com elegância moderada. Eu, apenas bati palmas com as pontas dos dedos. Sem levantar da cadeira. Sem desviar o olhar.

— Esta medalha representa um esforço coletivo, mas também pessoal — começou ela, já com a medalha no peito. — Por isso, quero dedicar a uma mulher que me inspira... Isabela Costa.

A mesa se virou para mim. Os olhares, o murmúrio, os celulares sendo levantados para filmar minha reação. Eu respirei fundo, levantei a taça e sorri como quem ganha um prêmio que nunca quis.

— Que honra — respondi, erguendo levemente o copo. — Acho admirável ver mulheres que sabem reconhecer... influência.

Daniel olhou para mim com aquele brilho artificial nos olhos. Tentou rir. Mas não passou da garganta.

— Vocês duas mal se conhecem, né? — disse ele, entre dentes, enquanto voltava a se sentar.

— E mesmo assim, ela me admira. Vai ver você também causa esse efeito por aí.

Ele não respondeu. Lívia desceu do palco e voltou para a mesa da associação. Fingiu não me olhar. Mas eu sabia que cada palavra que eu dizia era um anzol lançado direto no ego dela.

— Preciso te apresentar uma amiga depois, Isa — ela disse, quando passei perto da mesa delas.

— Claro — respondi. — Mas só se ela também admirar gente casada. Acho que é o critério da casa.

O grupo riu. Rebeca, sem entender, achou que era piada. Fabiana estreitou os olhos. Lívia travou por meio segundo, o suficiente para saber que ela entendeu. Mas ninguém ali poderia acusar nada. Não havia nomes. Nem acusações. Só... camadas. Veneno por entre o champanhe. E esse era o meu novo jogo.

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