Gravida do Cowboy
Gravida do Cowboy
Por: DANI VENCES
Prólogo

Antony 

Meu celular vibra, cortando o silêncio da noite como uma faca. O visor pisca com o nome de Brian. Eu pisco, o sono grudando nos olhos, o relógio na mesa de cabeceira marcando 2:17 da manhã. Resmungo, o cansaço pesando como chumbo nos ossos. Ele não desiste, o zumbido insistente do telefone ecoando no quarto escuro do rancho.

— Antony , me pega no bar — a voz de Brian soa trêmula, diferente, quase engolida pelo barulho de vozes e música ao fundo. — Preciso te contar uma coisa. É sério.

Eu esfrego os olhos, a irritação misturada com preocupação. Brian tem 23 anos, mas às vezes age como se tivesse 16, sempre se metendo em confusão. Provavelmente está bêbado de novo, perdido em algum bar de Raylidan, esperando que o irmão mais velho venha resgatá-lo.

— Brian, não dá, cara. Tenho uma competição amanhã cedo — digo, a voz rouca, tentando esconder a impaciência. — Para de beber e se vira. Pega um táxi.

— Antony , por favor... — ele começa, mas o tom de súplica é abafado pelo som de uma garrafa quebrando ao fundo. Um nó aperta meu estômago, mas ignoro. Ele sempre exagera. Sempre.

— Boa noite, Brian — corto, desligando com um suspiro. O silêncio volta, pesado, e eu me viro na cama, tentando apagar a sensação de que fiz algo errado. Ele vai ficar bem, penso, enquanto o sono me puxa de volta.

Horas depois, estou na estrada. A chuva b**e no capô da minha caminhonete, os limpadores de para-brisa lutando contra a tempestade. Sirenes piscam à frente, vermelhas e azuis, cortando a escuridão como facadas. Meu coração dispara antes mesmo de eu entender o que está acontecendo. Desço do carro, as botas afundando na lama, o ar frio mordendo minha pele.

Gideon, o novo xerife, caminha até mim, o chapéu de cowboy pingando água, a cicatriz em sua bochecha brilhando sob a luz dos faróis. Ele tem 32 anos, mas a expressão dele agora o faz parecer mais velho, carregada de algo que me deixa gelado.

— Antony , você precisa ser forte — ele diz, a voz grave, quase abafada pela chuva.

— Forte? Por quê? — Minha voz sai rouca, o coração batendo tão alto que mal ouço a resposta.

Ele aponta para uma maca ao lado da ambulância, um plástico preto cobrindo um corpo. O mundo para. Eu sei quem é antes mesmo de me aproximar. Minhas pernas fraquejam, e eu caio de joelhos na lama, a chuva encharcando minha camisa.

— Não, não, não — murmuro, as mãos tremendo enquanto agarro a terra.

Então, eu acordo.

Estou na minha cama, no rancho, suando frio. Meu peito sobe e desce, pego o copo d’água na mesa de cabeceira, o copo tremendo na minha mão enquanto bebo. A escuridão do quarto parece sufocante, o teto baixo demais. Não foi só um pesadelo. Brian está morto. A culpa me engole como um buraco negro, tão profundo que sinto ele me rasgar por dentro. Ele ligou pedindo ajuda, e eu não fui. Só porque achei que era mais uma bebedeira. 

— Droga, Brian — sussurro, a voz falhando. — A única vez que te deixei na mão, e você...

Soco a parede, a dor no punho um eco fraco da raiva que queima meu peito. O gesso racha sob meus dedos, mas não alivia. Nada alivia. Ouço o choro baixo da minha mãe, vindo do andar de baixo, afiado como uma faca. Ela perdeu meu pai há alguns anos, e agora perdeu Brian. E eu, o irmão mais velho, falhei com os dois. Eu deveria ter ido. Deveria ter ouvido. Deveria ter sido o irmão que ele precisava.

Levanto-me da cama, as tábuas do chão rangendo sob meus pés descalços. O rancho está quieto, mas a dor da casa é quase palpável, como se as paredes guardassem o luto. Desço as escadas, o som do choro de minha mãe ficando mais claro. Ela está na sala, sentada no sofá, um xale preto cobrindo os ombros, os cabelos loiros caindo em mechas desarrumadas. Não digo nada. Não há palavras que consertem isso.

No dia do enterro, a chuva fina molha meu chapéu de cowboy, que trago ao peito. Em todas as vezes que imaginei tirando o chapéu diante de um caixão, nunca imaginei que Brian estaria dentro dele. A ordem das coisas foi invertida. O mais velho nunca deveria enterrar o mais novo. Meus olhos fixam-se no caixão descendo à terra, cada pá de terra jogada pelos coveiros um peso a mais no meu peito. A cidade inteira está aqui, guarda-chuvas pretos espalhados como uma sombra sobre o cemitério de Raylidan.

Minha mãe está ao lado, o rosto pálido contra o vestido preto, os ombros tremendo enquanto chora. Manson, o ex-xerife e avô de Gideon, a segura com firmeza, seus cabelos grisalhos molhados, o olhar gentil tentando oferecer algum conforto. Ele perdeu amigos, viu tragédias, mas mesmo assim parece não saber o que dizer. Ninguém sabe.

Caleb se aproxima, os cabelos negros brilhando sob a chuva, os olhos verdes cheios de um remorso que aperta meu coração. Ele era o melhor amigo de Brian, sempre por perto, sempre com um sorriso fácil. Agora, sua expressão está quebrada, a voz embargada.

— Eu disse pra ele parar de beber, Antony  — ele murmura, quase como se estivesse confessando. — Devia ter levado ele pra casa. Me sinto um lixo por falhar como amigo. Não consigo nem olhar pra sua mãe.

Eu coloco a mão no ombro dele, cego pela minha própria culpa. Caleb tentou. Eu não. Brian só me ouvia, e eu o deixei na mão.

— Não havia nada que você pudesse fazer, Caleb — digo, a voz firme, mas oca. — Brian só me ouvia. Ela é forte — continuo, olhando para minha mãe, ainda apoiada em Manson. — Os amigos da família estão com ela. Fica em paz, cara.

Caleb assente, um sorriso triste nos lábios, e se afasta, caminhando até Jackson, outro amigo nosso. Jackson está parado sob um carvalho, segurando um guarda-chuva pequeno, os olhos fixos no caixão. A dor em seu rosto é familiar, um eco do luto que compartilhamos anos atrás, quando sua esposa, Ellen, morreu em um acidente de carro, deixando-o com seu filho. Ele ficou viúvo pouco depois que meu pai morreu, e nos últimos anos nossa pequena cidade parece amaldiçoada, como se Deus tivesse parado de olhar para nós.

— Ele era um moleque incrível — Jackson fala, a voz baixa, quase engolida pela chuva. Ele tira o chapéu, os olhos castanhos carregados de tristeza. — Brian sempre aparecia lá em casa, roubava os cavalos apenas para me irritar e me fazer correr atrás dele, ele amava bagunçar a vida de todos. Vou sentir falta de suas travessuras.

— Ele gostava muito de você — respondo, a garganta apertada.

Jackson se inclina, como se o peso das palavras fosse demais.

— Vai precisar ser forte por sua mãe, Antony . Ela só tem você agora.

Eu balanço a cabeça concordando, mas as palavras dele cortam fundo. Olho para o caixão, a chuva misturando-se às lágrimas que não deixo cair. A culpa é uma corrente, me puxando para baixo. Brian era impulsivo, sim, mas era meu irmão. Ele confiava em mim. E ele pediu ajuda, eu disse não. Fui punido por isso, e a punição é carregar esse vazio pelo resto da vida.

A cerimônia termina, e os guarda-chuvas começam a se dispersar. Minha mãe caminha até o carro, apoiada em Manson, sem olhar para trás. Caleb fica por perto, conversando com outros amigos, sua expressão ainda está carregada. Jackson aperta meu ombro antes de ir embora, prometendo passar no rancho mais tarde com seu filho. Eu fico ali, sozinho, encarando o túmulo de Brian, a terra fresca coberta por flores. A chuva para, mas o peso no meu peito não.

— Nunca mais vou deixar alguém que amo se machucar — juro, a voz firme, como se Brian pudesse me ouvir. É uma promessa para ele, para minha mãe, para mim mesmo. Não sei como vou cumprir, mas sei que vou tentar. Mesmo que isso me custe tudo.

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