Expulsa de casa pelo pai abusivo, Delancy não teve escolha a não ser procurar abrigo com a mãe, Isla, uma mulher que ela não via havia anos. Isla agora trabalha como governanta na mansão dos Russell, servindo ao enigmático e poderoso CEO bilionário, Liam Russell. Delancy acreditava que finalmente teria um lar. Mas sua chegada fazia parte de um plano sórdido. Sem o consentimento da filha, Isla planejou uma inseminação artificial usando o material genético de Liam, com o objetivo de engravidá-la e forçar o ricaço a se casar com Delancy. Mas esse casamento forçado e a gravidez inesperada dão a Liam um motivo para odiar a filha de sua governanta.
Ler maisMais um dia no inferno…
Delancy empurrou a porta com o ombro e entrou em casa, chutando os tênis para o canto do corredor. O cheiro azedo de gordura velha e desinfetante barato a envolveu como sempre fazia.
Ela jogou a mochila no chão da sala e seguiu direto para a cozinha. Enrolou as mangas do moletom e acendeu a boca do fogão com a mesma apatia de sempre. Macarrão instantâneo de novo. Era o que sempre tinha.
Delancy estava mexendo a água na panela quando ouviu a porta da frente bater com força. Os saltos de Brenda ecoaram pelos azulejos como um aviso. "Você chegou cedo hoje", disse ela, parando na soleira da cozinha.
A maquiagem estava derretida, o batom borrado nos cantos da boca, e a bolsa pendia frouxa no braço. Brenda sempre parecia uma perua bêbada.
"A professora me deixou sair mais cedo", respondeu Delancy, sem tirar os olhos da panela.
"Preciso de duzentos reais", disse Brenda, indo direto ao ponto. "O aluguel vence amanhã."
"Não tenho", respondeu Delancy, seca. Ela sabia que o dinheiro não seria para aluguel, e sim para uma madrugada no bar mais próximo.
Brenda arqueou uma sobrancelha e cruzou os braços. "Você trabalha naquele bar imundo toda noite. Não gasta com nada. Onde enfiou o dinheiro?"
Delancy fechou os olhos e respirou fundo. "Usei pra pagar meu celular, comprar material da escola... comida. Só isso."
"Você é um maldito estorvo nessa casa", disse Brenda, a voz subindo um tom. "Não ajuda com nada, não paga nada. Mora de graça e ainda acha que tem o direito de levantar a voz."
Delancy largou a colher na pia com mais força do que gostaria e se virou devagar. "Eu tenho dezessete anos. Isso nem deveria ser minha responsabilidade."
"Se não pode ajudar com as contas, nem devia ter nascido.” cuspiu Brenda. “Aposto que sua mãe pensou isso antes de mim, já que te abandonou aqui.” Ela se virou e saiu da cozinha com passos duros, como se a casa fosse dela por direito.
Claro que aquelas palavras machucaram Delancy, mas não era a primeira vez que Brenda dizia algo do tipo. A menina estava acostumada com os insultos de sua madrasta, principalmente quando estava embriagada.
Em segundos, o barulho de gavetas sendo abertas e portas batendo começou a ecoar da direção do quarto.
Delancy correu pelo corredor, o coração batendo tão forte que abafava até os sons lá fora. Quando chegou à porta do quarto, parou, ofegante, e viu Brenda destruindo metade da cômoda. Gavetas foram puxadas com tanta força que uma delas caiu no chão, espalhando roupas que voavam desordenadas pelo quarto. A mala, aberta sobre a cama, parecia engolir tudo que Brenda arrancava de dentro dos móveis.
"Brenda, para! Não encosta nas minhas coisas!" Delancy avançou, os olhos ardendo de raiva.
"Vai sair da minha frente ou quer que eu chame a polícia?" rosnou Brenda, sem desviar o olhar, e lançou mais uma blusa para dentro da mala. "Quer bancar a adulta? Vai viver como uma, então. Na rua."
Delancy não hesitou. Jogou o corpo sobre a mala, tentando puxá-la para si, mas Brenda agarrou firme o tecido do outro lado, como um cabo de guerra.
Num instante, a tensão se transformou em conflito. Delancy puxou com toda a força que tinha, desequilibrando Brenda, que caiu para trás, batendo pesadamente as costas na quina da cama.
Um grito abafado escapou da mulher mais velha, reverberando pelo quarto. "Você me empurrou, sua vadia!" cuspiu Brenda, os olhos brilhando de ódio, a respiração rápida e pesada.
Delancy respondeu, a voz rouca, e ainda agarrada à mala: "Você começou!"
O cheiro de macarrão queimado invadiu a casa, mas nenhuma das duas percebeu.
A porta da frente escancarou, e os passos vieram cambaleantes pelo corredor. O cheiro de álcool chegou antes da pessoa que o carregava.
Michael apareceu no batente do quarto com a camisa manchada, os olhos vermelhos e um cigarro apagado entre os dedos. "O que está acontecendo aqui?" perguntou, arrastando as palavras.
Ele olhou Brenda no chão, Delancy, depois a mala. “Por Deus, vocês estão sempre brigando!”
Não era a primeira vez que Brenda ameaçava despejar Delancy, mas era a primeira vez que roupas estavam esparramadas pelo chão encardido.
"Essa vagabunda me empurrou!" gritou Brenda, apontando.
"Ela estava jogando minhas coisas fora!" retrucou Delancy com a voz embargada.
Michael não disse uma palavra. Só avançou com os passos pesados e trôpegos até a filha. Os olhos vermelhos, desfocados, mais ódio do que álcool. E então, sem aviso, agarrou o braço dela com força.
“Ah!” Delancy reclamou. Mas antes que ela conseguisse reagir, Michael a arrastou com brutalidade e a jogou contra o armário. As costas dela bateram com um estrondo seco, e o impacto arrancou-lhe o ar dos pulmões.
A madeira tremeu, e Delancy sentiu a quina cravar na omoplata.
Ele pressionou ainda mais, o corpo dele esmagando o dela contra as portas fechadas, como se quisesse fundi-la à mobília. "Agora pede desculpa", rosnou, encostando o rosto ao dela, tão perto que o hálito dele queimava sua pele sensível.
Ela tentou virar o rosto, mas ele segurou seu queixo com força, os dedos cravando na pele. "Ela é a porra da sua madrastra", Michael cuspiu as palavras. "E você vai respeitar o que ela disser. Nem que eu tenha que te obrigar."
A menina tentou se soltar, mas seu pai a pressionou com mais força, forçando seu rosto contra a madeira do armário. Ela não sabia o que doía mais: a violência dele ou as humilhações da madrasta.
"Não", respondeu Delancy com a garganta seca.
Michael a encarou por dois segundos. Sequer parecia estar embriagado enquanto a olhava com raiva. Ele soltou a filha, que caiu com os joelhos batendo com força no chão. Michael avançou em direção à mala.
Antes que a menina pudesse se levantar, ele já tinha agarrado a mala pela alça e passado por ela como um trator.
"Pai! Não!” Ela se levantou cambaleando, desesperada, e correu atrás. “Onde você vai com as minhas coisas?!"
Ele não respondeu. Apenas abriu a porta da frente com um puxão violento, que a fez bater na parede.
A chuva começava a cair, fina e gelada, e a luz da rua tornava tudo mais cinza. Era início de noite naquela parte pobre e isolada da cidade, e sair naquelas condições não era sequer uma opção.
Sem hesitar, Michael arremessou a mala com força no meio da calçada molhada. O tecido já rasgado bateu contra o chão, espalhando roupas na sarjeta, onde a água misturada com lama sujou as peças que vazaram da mala.
"Fora da minha casa", ele disse, a voz pastosa, arrastada, mas ainda assim cruel. "Mendiga maldita."
As roupas se espalharam pelo cimento sujo. Um sutiã caiu no meio da rua. Um caderno afundou numa poça. Meias, calcinhas, um vestido velho... tudo jogado como entulho, exposto ao mundo.
Delancy encarou a mala jogada na calçada, a água da chuva já encharcando a lateral rasgada. Ela mal conseguia respirar. O peito apertava. A garganta ardia. "Eu... eu não tenho pra onde ir", sussurrou, sem forças, como se admitir isso fosse o último pedaço de dignidade que lhe restava.
Brenda cruzou os braços no batente da porta, um sorriso torto no rosto. "Pode ficar se me pedir desculpas. E se ajudar com o aluguel." Sua voz era carregada de prazer em ver a garota destruída.
Delancy olhou para o pai. Ele não dizia nada, só observava com olhos vidrados e sem expressão. Como se ela não fosse filha dele. Como se nunca tivesse sido.
As lágrimas desceram quentes e silenciosas pelo belo rosto dela. Ela deu um passo para trás, sentindo o mundo se afastar. "Você conseguiu..." murmurou, a voz falhando. "Você conseguiu ser pior do que a minha mãe."
Delancy virou as costas, caminhou até o canto da sala, onde seus tênis ainda estavam largados ao lado da mochila. Calçou-os com as mãos trêmulas, agarrou a mochila com força, e saiu sem olhar para trás, ainda usando o uniforme da escola.
Tudo que ela deixou para trás foi um lar fadado ao fracasso e macarrão queimado.
— O que você disse a ele?— Mandei ir pro inferno.— Ótimo. Isso vai deixá-lo ainda mais desesperado. Assim ele aprende a nunca mais dispensar a mulher que ama. Vem, vamos dançar.Antes que tivéssemos tempo de dar o primeiro passo, a música cessou subitamente. No momento que se seguiu, ouviu-se apenas os burburinhos de vozes reclamando da interrupção, porém logo a voz grossa de Liam preencheu o ambiente, através do microfone, e fiquei paralisada ao vê-lo sobre o palco, no lugar do cantor.— Desculpem a interrupção, pessoal, mas precisei subir aqui e pagar esse mico para que a garota que eu amo acredite no meu amor. — Ele silenciou-se por um instante e houve uma chuva de vaias e sussurros admirados, que se faziam audíveis na mesma proporção. — Delancy, eu te amo, mais do que já fui capaz de amar alguém na vida. — Ao ouvirem meu nome sendo pronunciado, a multidão se afastou, formando um semicírculo, abrindo espaço entre mim e o palco, todos os olhares voltados em minha direção, enquanto
Ela seguiu na direção oposta ao palco, caminhando depressa, abrindo caminho entre os dançarinos, enquanto eu a seguia de perto. Já estávamos bastante afastados da multidão, em uma área mais vazia do imenso estacionamento, quando ela por fim parou e se virou para me encarar, com seus olhos raivosos, uma ruga marcando sua testa. — O que você quer? — indagou, firme e seca, cruzando os braços na frente do peito.— Quero dizer que sou um egoísta inescrupuloso por ter vindo até aqui estragar sua diversão e sua vida. Embora eu tenha tentado, cheguei à conclusão de que não existe caminho para mim sem você, porque te amo demais e quero tê-la ao meu lado pelo resto de nossas vidas. — Delancy me encarava com um misto de perplexidade e surpresa refletido no brilho do seu olhar. — Me perdoa por ter sido um idiota, achando que podia viver sem você. Eu não posso. Não consigo nem imaginar outro homem se aproximando de você. Então, vamos esquecer tudo isso. Vem pra casa comigo, vamos criar nosso filh
Como vinha fazendo nos últimos dias, lutei bravamente contra o impulso de ir até lá e tirá-la dos braços dele, levá-la para casa e dizer-lhe que ela era minha e de mais ninguém. Porém, acabei perdendo a batalha contra mim mesmo; e, quando dei por mim, já estava pegando as chaves do carro e deixando a sede da empresa.Que se fodesse tudo! Delancy pertencia a mim e nenhum babaca colocaria as mãos nela!Embora a decisão de deixá-la seguir sua vida sem mim fosse a mais acertada, eu era egoísta demais para abrir mão dela. A queria na minha vida, vivendo ao meu lado, e não tinha mais forças para lutar contra esse querer.Mesmo sabendo que existia o risco de, dali a alguns anos, ela se arrepender de ter escolhido ficar comigo, se prendendo a um casamento e a um filho que não foram sua escolha, eu a faria minha, definitivamente, e a vida que lutasse para me perdoar.Dirigi até o local do show quase sem ver a rua diante de mim, tamanha era a velocidade do carro. Como já era esperado, o local e
Liam Eu estava em meio a uma das reuniões mais importantes sobre aquele projeto, a última que realizaria junto aos engenheiros e acionistas, antes da minha volta para São Paulo e, ainda assim, não conseguia me concentrar em nada do que os homens e mulheres acomodados em torno da grande mesa retangular estavam dizendo.Como vinha sendo nas últimas semanas, tudo em que eu conseguia pensar era Delancy. Encontrava-me a ponto de enlouquecer com seus novos hábitos, com aquela nova mania de estar sempre saindo de casa, indo e voltando de Belize, se divertindo como se não existisse amanhã.Eu queria muito mesmo estar feliz por ela, pelo fato de estar conseguindo seguir em frente sem mim, afinal era assim que as coisas tinham que ser. Ela só estava vivendo sua vida como deveria. No entanto, eu estava à beira da loucura, não conseguia parar de pensar nela, no que fazia com aqueles babacas por aí. Por conta de tais pensamentos, eu havia atingido o cúmulo do absurdo ao ordenar que meus segurança
A constatação despertou a mais incontrolável fúria em meu íntimo e apressei-me em afastar sua mão de mim.— Já chega. Quero descansar agora — falei, com os dentes trincados.Voltei a me deitar sobre a espreguiçadeira e fechei os olhos, forçando-me a ignorar sua proximidade, a reprimir o turbilhão de emoções e sentidos que fervia em meu interior.— Quero estar presente na próxima consulta. Por favor, não me deixe de fora novamente.— É difícil ficar de fora, não é? — indaguei, com a fúria tomando conta de mim, alastrando-se pelas minhas veias.— Delancy, eu já disse que você sempre vai fazer parte da vida dessa criança.Dominada pelo ódio cego, pela sua pretensão de tirar meu filho dos meus braços, voltei a me sentar e o encarei fixamente.— Eu já entendi. Você não precisa ficar repetindo essa merda! — esbravejei, com ódio mortal. — Eu já disse que vou entregar meu filho a você, mas é só isso. Minha vida é minha! Você não tem nenhum direito de interferir em nada do que eu fizer, como t
No dia seguinte, novamente almocei no quarto, a fim de evitar encontrá-lo pela casa. Na parte da tarde, no horário em que Liam nunca estava em casa, desci com Julie para tomar sol perto da piscina, como vinha fazendo nos últimos dias.Ela e eu estávamos deitadas lado a lado, espichadas em espreguiçadeiras, usando apenas nossos biquínis, quando inesperadamente Liam se aproximou, vindo da direção da casa, parecendo uma miragem com seu porte atlético e elegante, dentro da camisa azul com as mangas enroladas até os cotovelos e uma calça social cinza.— Julie, será que você pode nos deixar sozinhos por um instante? — indagou, com sua voz muito mais calma que no dia anterior, seu corpo grande bloqueando meu sol.— Claro. — Covarde como sempre, Julie levantou-se e deixou o jardim quase correndo.Liam sentou-se de lado no lugar dela, de frente para mim, enquanto eu continuava lá deitada, imóvel, com meus olhos semicerrados de encontro ao sol, sem conseguir evitar que cada minúscula parte do m
Último capítulo