Eu não sabia se tremia de nervoso ou de raiva por estar tremendo de nervoso.
Desde que saí daquela sala, a imagem dele ficou grudada em mim. Dante Alveron. O nome soava como algo proibido. E talvez fosse. Não que eu tivesse qualquer ilusão, homens como ele não se misturam com mulheres como eu. Eles apenas... observam. Testam. Brincam. Voltei para minha estação no sexto andar tentando parecer normal, mas sentia os olhos de todo mundo em mim, como se já soubessem o que tinha acontecido. “Você foi chamada no primeiro dia?” “Com o próprio Dante?” “Ah, então é assim que se sobe rápido...” Eles não disseram nada disso em voz alta. Mas eu li tudo nos olhares atravessados e nos sorrisos escondidos atrás das xícaras de café. Foda-se. Fiz o que qualquer mulher sensata faria: me afundei em trabalho. Revisei três apresentações, preenchi dois formulários internos e fingi que não estava pensando no homem que me chamou pelo nome sem nunca ter me visto. Mas claro que o universo não ia me deixar em paz. No fim do dia, recebi uma mensagem no sistema interno da empresa: > Reunião agendada – Sala 7A – 18h15 Participantes: Dante Alveron, Amélia Lorren Assunto: Alinhamento de projeto Alinhamento o caralho. Olhei para o relógio. 17h58. Meu coração já estava batendo no pescoço. O elevador demorou mais do que deveria, de novo. Cada número acendendo me dava tempo demais para imaginar tudo o que não devia. Quando as portas se abriram no sétimo andar, o ambiente parecia ainda mais silencioso. Como se tudo ali fosse calculado. Até o ar. Caminhei até a sala 7A, que era, claro, envidraçada, com vista para metade da cidade e cortinas que podiam ser fechadas com um único toque. Ele estava lá dentro. Sentado. Esperando. Como se não tivesse pressa. Como se tivesse todo o tempo do mundo pra me desestabilizar. Bati na porta de leve. – Entre. A voz dele era a mesma, firme, baixa, com um peso estranho que me fazia querer obedecer mesmo sem entender o porquê. – Sr. Alveron – comecei, tentando soar profissional. –Dante. – Desculpe... Dante. – Você chegou pontualmente. Gosto disso. Assenti, tensa. Ele apontou para a cadeira à frente da mesa. Sentei com as mãos cruzadas no colo, apertando os dedos. – Quero que me acompanhe nesse projeto de integração entre setores. – Claro. Qual seria exatamente minha função? Ele se levantou. Andou até a janela. Virou de costas. Depois olhou por cima do ombro. – Observar. Anotar. Avaliar comportamento. – Comportamento de quem? – De todos. Inclusive o seu. Arrepio. Meu olhar encontrou o dele por reflexo. E naquele instante, eu soube, isso não era só sobre trabalho. – Algo errado, Amélia? – N-não. É só que... isso parece incomum. Ele sorriu. Lento. Quase imperceptível. Mas estava lá. – Gosto do incomum. Meu corpo inteiro pareceu sentir aquilo. Um calor estranho subindo pelas costas, pela nuca. Ele se aproximou, devagar. Parou atrás de mim. – Você é diferente. – disse, num tom quase baixo demais. – E isso pode ser bom... ou perigoso. Eu prendi a respiração. Ele estava perto. Demais. O cheiro dele, a presença dele, aquilo tudo me deixava alerta. Como se eu fosse uma mariposa e ele a porra de uma lâmpada. – Vai fugir? – ele perguntou, baixinho. – Eu nem comecei – respondi, antes de pensar. Erro. Ele sorriu. – Ótima resposta. Se afastou. Voltou pra mesa. Como se nada tivesse acontecido. – Reunião encerrada – ele disse, já pegando o celular. – É só isso? – Por hoje. Levantei devagar. Fui até a porta. Antes de sair, olhei por cima do ombro. – Boa noite... Dante. Ele me encarou, de novo com aquele olhar que me despia sem tirar uma peça. – Boa noite, Amélia. Fechei a porta com a mão suando. Saí da sala com o coração batendo alto demais no peito. Aquilo tudo... o jeito como ele me olhava, a proximidade, o tom da voz... Era real? Ou eu só estava lendo livros de romance demais? Afinal, nos conhecemos a poucas horas desse mesmo dia. Talvez eu estivesse imaginando um jogo que ele nem sabia que estava rolando. Ou pior... talvez eu já estivesse jogando, e perdendo, sozinha.