POV: NoahO som da chuva era uma trilha constante contra o teto de vidro da estufa. Eu me sentava no chão frio, entre vasos quebrados e plantas que nunca aprendi a cuidar direito. Meus cotovelos apoiados nos joelhos, a cabeça abaixada, como se o mundo fosse pesar demais caso eu ousasse erguê-la.A verdade é que eu estava fugindo. De novo.Fugindo dela.Emily.O nome era um sussurro constante dentro de mim, um eco que não cessava. Desde que cheguei naquela casa, desde o momento em que nossos olhares se cruzaram pela primeira vez, eu soube. Soube que ela não era só mais uma sombra na vida de Alexander. Ela era luz — uma daquelas que ardem se você chega perto demais.E mesmo assim, aqui estou. Queimado por dentro.Ela não era minha. Nunca foi. Mas... também não era dele.—Você sabe que está se escondendo, certo? — a voz dela me tirou do transe.Levantei a cabeça devagar. Emily estava parada à entrada da estufa, a chuva escorrendo por seus cabelos, a camisa colada ao corpo, os olhos fixos
POV: Emily A chuva ainda caía, pesada, como se o céu também precisasse desabafar. Eu continuava ali, sentada no colo de Noah, envolta por seus braços quentes, tentando entender em que momento tudo saiu do controle. Ou talvez, quando finalmente entrei nele. Meu coração batia como um tambor descompassado. O cheiro da terra molhada misturado ao da pele dele me deixava entorpecida, mas era a forma como ele me olhava que fazia minhas defesas desmoronarem. Havia algo cru em seu olhar — uma dor que reconhecia, uma ternura que eu não esperava. Ele não disse mais nada. Apenas manteve o rosto encostado no meu, como se precisasse daquele contato para continuar respirando. E talvez eu precisasse também. Mas no fundo... no fundo, eu sabia que aquilo era perigoso. Não apenas por causa de Alexander. Mas porque, se eu me deixasse cair por Noah, não haveria volta. Ele não era um porto seguro. Era tempestade. E ainda assim... eu estava ali. — Está tudo bem — sussurrei, mais pra mim mesma do que pra
A cidade de Charleston parecia cinzenta naquela manhã, como se o céu compartilhasse do humor sombrio de Emily Carter. Ela dirigia sem rumo certo, os olhos vermelhos pelo choro, a respiração presa no peito. O rádio do carro tocava uma música melancólica que ela não ouvia de verdade. Tudo era ruído de fundo desde que seus olhos viram o que jamais deveriam ter visto. Horas antes, tinha ido à casa de Dylan para uma surpresa — uma visita inesperada, como tantas que já fizera. Mas quem foi surpreendida, dessa vez, foi ela. A imagem estava gravada em sua mente como uma tatuagem feita à força: Dylan, seu namorado há três anos, deitado sobre o corpo de sua melhor amiga, Sophie. Os dois entrelaçados, despidos, entregues um ao outro sem culpa aparente. Emily não gritou. Não chorou naquele momento. Apenas olhou. Ficou ali, imóvel, enquanto os dois demoravam a notar sua presença. Quando finalmente o fizeram, Dylan pulou da cama, tentando cobrir-se e balbuciar desculpas que ela não quis ouvir.
O silêncio dentro da casa era quase palpável, interrompido apenas pelo leve tilintar da chuva contra as janelas empoeiradas. Emily caminhava devagar, observando os móveis cobertos por lençóis brancos, as cortinas fechadas e o cheiro carregado de mofo e madeira antiga. A casa parecia adormecida — mas havia algo mais ali, algo que ela não conseguia explicar. Uma presença. Um arrepio percorreu sua espinha, fazendo-a se encolher ligeiramente. — Está perdida? — disse uma voz grave às suas costas, fazendo com que ela se virasse com um salto. Na escada que levava ao segundo andar, meio envolto pelas sombras, estava um homem. Alto, ombros largos, cabelos escuros bagunçados e barba por fazer. Os olhos, no entanto, foram o que mais a marcou — frios e intensos, como gelo prestes a queimar. — Me desculpe… eu não sabia que havia alguém aqui — disse Emily, a voz ainda trêmula. O homem desceu os degraus lentamente, com uma postura quase felina. Seus passos eram firmes, mas silenciosos. Ele usava
Emily acordou assustada. A escuridão do quarto era profunda, cortada apenas por um feixe de luar que escapava pelas frestas da janela. Seu corpo estava suado, o lençol embolado entre as pernas, o coração batendo como se tivesse corrido uma maratona. Sonhara com Alexander. Mas não era um sonho qualquer. Era algo intenso, visceral. Ela sentia até agora o toque das mãos dele em sua pele, o calor da respiração em seu pescoço. Era absurdo. Irracional. Ela mal o conhecia. E, mesmo assim, ele habitava seus pensamentos como uma sombra que se recusa a ir embora. Levantou-se da cama antiga, vestindo apenas uma camiseta larga e meias. A casa estava silenciosa, exceto pelo ranger ocasional das paredes velhas. Desceu as escadas com cautela, atraída pela luz fraca que vinha da sala. Alexander estava ali, sentado em frente à lareira, um copo de uísque na mão. A luz laranja do fogo dançava em seus olhos azuis, e por um instante, ele pareceu quase irreal — uma figura saindo direto de um pesadelo se
Na manhã seguinte, o cheiro de café recém-passado guiou Emily pela casa. A luz do sol filtrava-se pelas janelas, revelando a poeira no ar e o desgaste dos móveis antigos. Apesar da rusticidade do lugar, havia algo aconchegante. Ou talvez fosse apenas a sensação de distância da realidade que ela havia deixado para trás. Alexander estava na cozinha, mexendo uma frigideira com ovos enquanto segurava uma xícara de café preto na outra mão. Usava apenas uma calça de moletom cinza e o cabelo desgrenhado fazia parecer que havia dormido pouco — ou nada. Emily desviou os olhos por um instante, tentando controlar a onda de calor que subia por seu corpo. —Bom dia — disse ela, ainda um pouco tímida. —Bom dia — ele respondeu, sem olhar para ela. —Café? —Por favor. Ele serviu a bebida em uma caneca e a entregou com um olhar que parecia pesar mais do que simples cortesia. Sentaram-se à mesa em silêncio por alguns minutos, ouvindo apenas o som da frigideira e o tique-taque de um relógio antigo pe
A chuva retornou naquela tarde, grossa e pesada como se o céu carregasse a mesma tensão que pairava dentro da casa. Emily passava os dedos distraidamente pelas lombadas dos livros em uma estante da sala de leitura. Desde que Alexander saíra sem dizer para onde ia, a casa parecia ainda mais silenciosa, sufocante. Havia nela uma energia contida, como se cada parede guardasse palavras que ninguém ousava dizer. Ela já estava há dois dias ali, e por mais que a casa fosse grande, havia limites muito claros. O sótão trancado, os corredores do segundo andar que pareciam ecoar passos mesmo quando não havia ninguém, e — o mais tentador de todos — o escritório de Alexander. Ele havia sido claro: "nunca tente descobrir o que faço quando estou trancado lá." Era justamente por isso que a curiosidade queimava mais forte. Emily aproximou-se da porta escura do fim do corredor. Era de madeira maciça, com detalhes talhados à mão. Ela já havia passado por ali algumas vezes, mas nunca tivera coragem de
O céu estava coberto por nuvens pesadas quando Emily atravessou os limites da casa e entrou no bosque. O mapa deixado por Alexander estava dobrado no bolso da jaqueta, com uma marca em vermelho no canto inferior. Um círculo irregular no meio da vegetação, sem nenhuma indicação do que deveria encontrar lá. Os galhos estalavam sob seus pés. O ar estava úmido, carregado de cheiros antigos — terra molhada, folhas apodrecendo, e algo mais... metálico, quase como ferrugem. A floresta parecia respirar em silêncio, viva de um jeito desconfortável. Cada passo mais fundo era também um passo mais longe da lógica. Ela seguiu pelo caminho indicado, ultrapassando arbustos densos até que, enfim, encontrou o que buscava: uma estrutura de pedra, quase totalmente coberta por musgo. À primeira vista, parecia uma ruína, uma simples parede caída. Mas ao se aproximar, percebeu que era uma porta. De ferro. Pesada. Enferrujada. Emily engoliu em seco. Não havia tranca visível. Apenas um puxador com marcas