Sai da faculdade direto para uma agência de empregos. A missão? Encontrar um trabalho ou algum estágio. Precisava dividir as despesas com a Lia. Já estava me sentindo desconfortável pelo pai dela bancar tudo.
“Eu acabei de me formar em direito e estou em busca do meu primeiro emprego.” Só pelo olhar da secretaria, já sei que me ligaria dizendo não. Agradeci com um sorriso discreto e saí. Embora a minha vontade era falar umas boas verdades para ela, sai com elegância. LIA: Não tem que se preocupar, está tudo bem, meu pai vai continuar nos ajudando. “Eu sei Lia, mas me incomoda ser bancada por ele! Eu preciso logo de um emprego. Te juro que a primeira oportunidade que me derem, ah minha amiga… Nada nem ninguém vai me tirar desse emprego. Vou aguentar todas as humilhações possíveis, mesmo se for alguma proposta indecente.” LIA: Hahaha! Até parece que a Ella certinha vai aceitar algo desse tipo aí! Deixa de bobagens e relaxa. Está morta de cansaço e ainda tem que revisar os exercícios do Dr Ravelli. Com certeza eu vou sonhar com aquele homem. Lia se jogou no sofá sorrindo e falando coisas absurdas sobre o professor. Sorri para ela e entrei no meu quarto para estudar. A noite foi longa, mas não estava nos meus planos desistir e voltar para a Itália. Acordar às seis da manhã para ir à aula de Criminologia com o professor que quase me deportou com um olhar já seria castigo o bastante. Mas como dizia minha avó: “Quando a vida quiser te humilhar, ela não avisa. Ela simplesmente te coloca num salto alto e empurra escada abaixo.” A semana passou entre olhares atravessados, silêncios gelados e perguntas retóricas que eu me recusei a responder… apenas para não dar a ele o prazer de me reprovar com argumentos. Tentei ficar invisível na sala de aula. Eu achava que estava sobrevivendo bem… até Lia entrar no quarto gritando com um jornal na mão como se fosse o mapa da mina. Lia ofegante correu na minha direção. Ela usava um pijama, cabelo bagunçado e um ar de loucura familiar. LIA: ELLA! Achei! Achei a solução dos nossos problemas! Uma vaga de estágio! E paga!" "Estágio ou tráfico? Porque com você a linha é sempre tênue." LIA: Não brinca! Olha aqui! ‘Escritório criminalista renomado procura estagiária de direito para atuar em casos de alta complexidade.’ Eles pagam bem, é meio período e ainda por cima é aqui perto! Tipo, literalmente a duas ruas da MUNY! "Alto lá… ‘Alta complexidade’? Lia, isso soa perigosamente como 'vai ler coisas que a N*****x não tem coragem de filmar'." Lia me ignorando totalmente. LIA: Você está qualificada. Você é brilhante. Você humilhou o Ravelli com um ‘ma che cazzo’ no primeiro dia. Se alguém pode lidar com criminosos, é você. Qualquer crime que apareça, será obviamente negado por você com argumentos perfeitos! "Ah, claro, porque ofender um professor em italiano é a nova triagem do FBI." Mas a verdade? Eu precisava do estágio. A bolsa cobria as aulas, mas dividir um apê em Manhattan com uma psicanalista da criminologia, não era barato. Ela pode ser maluquinha, mas o QI dela é inquestionável. Estudar e compreender o fenômeno do crime, o comportamento criminoso e o sistema de justiça criminal, não é para qualquer um. Então eu fui. O prédio era tão elegante que minha autoestima tirou os sapatos para entrar. Subi no elevador espelhado, tentando parecer profissional com a minha pastinha e blazer de R$ 59,90 comprado em promoção com cheiro permanente de naftalina. A recepcionista era séria, bonita. Daquelas que parecem que nasceram com um contrato de confidencialidade e um salto da Louboutin. Recepcionista: Entrevista para vaga de estagio? "Sim. Isabella Fontana. E sim, eu já fui julgada pelo seu olhar, mas não tenho antecedentes criminais, juro. Ela nem sorriu. Estava ali claramente para proteger algum segredo de Estado. Me mandou sentar e esperar. Cinco minutos depois, ela apontou com o queixo: REC: Você pode subir. Sala 14. Segundo andar. Vai encontrar com… o senhor Ravelli. "Desculpa, o quê?" REC: Senhor Ravelli. "E tem certeza que esse Ravelli não dá aula numa universidade de Manhattan com a leve habilidade de humilhar alunos com perguntas impossíveis e olhares de raio-X?" Ela arqueou uma sobrancelha. Claramente não era fã de piadas. Subi. Meus pés pesavam mais que meus pecados. E eu sabia: ou isso era uma pegadinha do destino… ou o universo tinha um senso de humor muito, muito cruel. Bem pior que o meu. Abri a porta da Sala 14. Lá estava ele. Terno impecável. Relógio de pulso caro. Sobrancelha arqueada e aquele olhar que dizia: “Eu sei tudo o que você está pensando, e você está errada.” Ethan estava calmo, como se me ver ali fosse parte do plano. ETHAN: Senhorita Fontana. Vejo que o destino tem senso de ironia. "Se for ironia, ela está gargalhando. Eu só queria pagar o aluguel, não entrar num filme do Scorsese." ETHAN: Interessante. Vamos ver se sua língua é tão afiada na prática quanto é na teoria." "Ótimo. Porque se a vaga for para carregar corpos, eu preciso de luvas de borracha e aumento de salário." Ele me encarou por três segundos inteiros antes de dizer: ETHAN: A vaga é sua! Você começa… Imediatamente! Miguel vai te passar as orientações. Espero que dê tudo certo na defesa do seu primeiro caso, Ella. Ele sorriu? Sim… Ele sorriu e eu senti arrepios. Ele vai me humilhar diante do mundo. Tudo por causa da minha língua. “ O senhor… O senhor, pode não sorrir assim? Eu… Não precisa ser assim.” ETHAN: Assim como Ella? “Não é Ella, é Isabella! Apenas amigos íntimos, familiares e pessoas que eu gosto me chamam de Ella." Foi ficando cada vez pior. Ser pega de surpresa ali me deixou toda confusa e sem palavras certas. Uma advogada sem palavras para se defender. Patético! A porta se abriu e eu pude soltar o ar que nem sabia que estava segurando. Entrou um homem com uma beleza irritante, assim como a do senhor Ravelli, mas com um olhar doce e aconchegante. ETHAN: Esse é o Miguel. Ele é o segundo melhor advogado criminalista desse escritório. Essa é a língua solta que te falei… Por coincidência, ela é a nova estagiária. “Agora esse é meu nome?” MIGUEL: Seja muito bem vinda! Não dê importância para o mau humor dele. Venha comigo, Ella, vou te mostrar onde vai trabalhar. Ele sabe meu nome mesmo eu não dizendo, nem o senhor Ravelli. Como ele sabe? “Desculpa… Eu não disse meu nome, o senhor Ravelli também não, como o senhor sabe?” MIGUEL: Nada de senhor! Odeio que me chamem assim. Quem gosta dessas formalidades é o Ethan, eu odeio. Pode me chamar apenas de Miguel… e para não soar íntimo demais na frente dos outros advogados, pode usar o doutor, se quiser. “Ok! Mas, como sabe meu nome… meu apelido, na verdade.” MIGUEL: Você despertou a curiosidade do senhor Ethan Ravelli. Uma noite inteira falando da aluna que levantou a mão na primeira aula e contestou sua fala. Ele ficou impressionado com você garota… Eu posso afirmar que isso nunca aconteceu com o senhor Ravelli. Silêncio constrangedor. Foi o que sucedeu. O que ele queria dizer com impressionar? Seria bom ou ruim? Será que Ethan Ravelli pretende sumir comigo? E se ele for um criminoso como a Lia pensa? MIGUEL: Isabella? Ella, está tudo bem? “Eu não vou ficar… ele deve querer me colocar num saco preto, é isso!” Miguel me olhou confuso e deu gargalhadas tão altas que fez com que o senhor escuridão se levantasse da masmorra. Num ato desesperado me enfiei atrás de Miguel e fingi estar lendo uma pasta de documentos. REC: Isso é confidencial! Não abra nenhum documento sem que te peçam! “Mulher, você não gostou de mim, não é mesmo?! Miguel segurou o riso e me puxou pelo braço me tirando daquela situação embaraçosa.