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Capítulo 3 – Olhares Não Ditos

A luz do sol invadia a cozinha da cobertura com preguiça, refletindo no mármore branco e dourado. Elisa estava sentada à mesa do café, as mãos envolvidas em uma caneca de chá. Usava um vestido leve de algodão azul claro, o cabelo preso em um coque bagunçado. Havia algo de melancólico naquela imagem. Uma mulher linda que se escondia na simplicidade dos gestos.

Eduardo entrou na cozinha com o celular encostado ao ouvido, como sempre. Camisa social branca dobrada até os cotovelos, calça de alfaiataria cinza escuro e uma aura de autoridade que parecia natural demais nele.

Se for insistir nisso, diga ao conselho que estou fora ... disse, antes de desligar com impaciência.

Ela ergueu os olhos, tentando decifrá-lo. Havia cansaço em sua postura, uma tensão no maxilar, mas nem sinal de bom-dia.

Fiz chá de camomila. Se quiser… sua voz saiu suave, quase hesitante.

Café - respondeu ele, indo direto à máquina.

Silêncio.

Eduardo preparou a bebida como se estivesse sozinho. Elisa desviou o olhar, tentando não deixar a decepção se instalar. Respirou fundo e se levantou para pegar a manteiga na geladeira.

Ao passar por ele, o braço de ambos se encostou por um segundo. Um toque leve, acidental. Mas suficiente para acender algo.

Ela sentiu a pele arrepiar sob o tecido fino do vestido. Eduardo pareceu notar. Seus olhos se encontraram por um instante. Os dela, verdes esmeraldas e cálidos; os dele, azuis e indecifráveis.

Ele quebrou o contato primeiro, como sempre.

Vai sair hoje? ... perguntou, de repente.

Talvez. Eu gosto de caminhar pela orla pela manhã.

Avise o segurança antes de sair ... disse, com tom neutro, como se falasse com uma funcionária.

Elisa apenas assentiu. Voltou à mesa, forçando-se a focar no chá. Ele se sentou à sua frente, com o jornal na mão e a expressão impenetrável. Mas de vez em quando… os olhos dele se desviavam para ela. Rápido. Quase imperceptível. Como se Eduardo tentasse entender quem, de fato, era aquela mulher que agora fazia parte da sua vida.

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Nos dias seguintes, a rotina entre eles se estabeleceu com certa distância ensaiada. Eduardo saía cedo, voltava tarde. Elisa passava o tempo entre livros, caminhadas discretas e as aulas noturnas de dança, algo que mantinha em segredo. Era sua única fuga, o único lugar onde ainda se sentia viva.

Certa noite, ao voltar de uma dessas aulas, encontrou a cobertura silenciosa. Entrou descalça, tirando o casaco leve. Passou pela sala e, ao chegar no corredor, ouviu algo vindo do escritório.

Curiosa, se aproximou. A porta entreaberta deixava vazar a luz amarela de um abajur. Eduardo estava ali, sozinho, encostado na mesa com um copo de uísque na mão e a cabeça baixa.

Tudo bem? — ela perguntou, com cuidado.

Ele ergueu os olhos devagar. Estava mais vulnerável do que ela jamais vira. A camisa semiaberta, as mangas arregaçadas, o nó da gravata frouxo. Parecia exausto.

Frederico está com problemas no coração ... disse, com a voz rouca. O médico recomendou cirurgia em breve. Mas ele é teimoso demais pra admitir.

Seu avô é forte… mas precisa de apoio agora. Ela deu um passo à frente. Eu posso ajudar, se quiser.

Eduardo a olhou como se não soubesse como responder. Como se não esperasse gentileza. Como se tivesse esquecido o que era ser cuidado.

Você não precisava fazer isso. A voz dele era baixa, quase um sussurro. Esse casamento... é um fardo pra você. Não finja o contrário.

Elisa encarou-o. O coração acelerado. A garganta seca.

Você não me conhece, Eduardo. E não me deve suposições sobre o que é um fardo pra mim.

Ele estreitou os olhos, como se ela tivesse o desafiado. E talvez tivesse.

Então por que aceitou?

Ela respirou fundo. Seus olhos se encheram de algo que ele não soube identificar.

Por lealdade. À minha família, a minha avó.. a mim mesma. Pausou. Eu não sou feita de contratos. Eu sou feita de escolhas. E essa foi minha.

O silêncio caiu entre eles.

Eduardo a observou intensamente. Como se estivesse vendo Elisa de verdade pela primeira vez. Aquela mulher tímida, doce e quieta… era muito mais do que aparentava. Havia força ali. E isso o incomodava, de alguma forma que ele não queria admitir.

Ela se virou para ir embora.

Boa noite, Eduardo.

Ele demorou um segundo, mas respondeu:

Boa noite, Elisa.

E quando a porta se fechou, ele permaneceu ali, sozinho, com o gosto do uísque na boca e o eco das palavras dela na mente.

“Eu sou feita de escolhas.”

Pela primeira vez, Eduardo Castro se perguntou se havia subestimado sua esposa.

E essa dúvida começou a incomodá-lo mais do que gostaria.

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