Kaleo
A manhã abriu as janelas da cidade com mau humor. Do alto da cobertura, os prédios pareciam peças de um tabuleiro que eu aprendi a mover com a ponta dos dedos. Café preto, agenda lotada, três reuniões que não significam nada perto do que realmente me ocupa a cabeça.
O beijo.
Desde a noite de ontem, a lembrança insiste em voltar como febre. Eu me odeio por isso. Beijos não estavam no meu plano. O plano tinha outras palavras: quebrar, esmagar, extinguir. E, ainda assim, quando a pele dela encostou na minha, toda a arquitetura da vingança tremeu como se fosse feita de papel molhado.
— Você está com a cara de quem arrumou briga com o próprio espelho. — anuncia Mag, entrando na sala com um casaco de tricô e a vitoriosa desobediência de sempre.
— Meu espelho nunca ganha de mim. — respondo, abrindo a porta do terraço para ela — Mas você pode tentar.
— Eu tento desde que você usava fralda. — ela retruca, acomodando-se numa poltrona ao sol — Traga água. E traga também essa confissão que