O helicóptero pousou com um baque seco na clareira coberta por neve derretida, nos arredores de Genebra. Camila desceu primeiro, os cabelos presos em um coque elegante, os olhos ocultos por óculos escuros. Leonardo surgiu logo atrás, impecável em um sobretudo cinza-chumbo, como se aquela manhã gélida fosse apenas mais uma peça de seu xadrez cuidadosamente construído.
— Está pronta? — ele perguntou, oferecendo o braço. Ela não respondeu. Caminhou sozinha em direção ao carro preto que os esperava. Já não era mais a mesma garota que aceitava os termos dele sem resistência. Agora, carregava consigo o fogo da perda, da dor... e o rosto de uma criança que não via há seis anos. Em Paris, Alexandre caminhava nervoso pelo corredor da Aragon Corporation. Tinha em mãos um dossiê parcial sobre Leonardo, entregue por seu investigador pessoal. Quando entrou em sua sala, trancou a porta, puxou um copo de uísque e se jogou na poltrona. Entre os papéis, um nome chamou sua atenção. Helena Vasques. 42 anos. Enfermeira. Marselha. Responsável legal de uma criança chamada Rafael Vasques. Mas o mais chocante foi a certidão de nascimento. Mãe: Camila Monfort. Pai: desconhecido. Alexandre se recostou na cadeira, o copo tremendo em sua mão. — Um filho. Ela tem um filho. Do outro lado da cidade, Júlia caminhava pelas ruas geladas de Montmartre, o cachecol apertado ao redor do pescoço. Estava inquieta. Na noite anterior, o beijo de Enzo a deixara em chamas. Mas havia algo mais... um sentimento que não conseguia nomear. Quando chegou ao pequeno estúdio de tatuagem onde Enzo passava a maior parte dos dias, encontrou-o sozinho, desenhando algo em um caderno. — Isso é uma criança? — perguntou, olhando por cima do ombro dele. Enzo fechou o caderno depressa, constrangido. — É só um rascunho. — Ela é linda. Parece com... — Com quem? — Com Camila. Enzo a encarou, surpreso. — Como você sabe? — Intuição — respondeu Júlia, mas no fundo, algo dentro dela começava a se formar. Um pressentimento forte, quase doloroso. — Camila tem um filho, não tem? Ele suspirou. Enzo sabia que a verdade estava prestes a transbordar. E talvez fosse melhor assim. — Tem. Mas não me peça detalhes. Prometi que não contaria. Júlia sentiu um frio na espinha. — Leonardo sabe? — Agora sabe. No luxuoso hotel em Genebra, Camila e Leonardo estavam frente a frente com os irmãos Lucien. Bastien e Jules, dois magnatas suíços que vestiam ternos caros e sorrisos falsos. — A senhorita Monfort é uma escolha interessante — disse Jules, com um francês arrastado. — A última vez que a vimos, ela estava com outro sobrenome. Camila manteve a postura firme. — Os nomes mudam. As intenções permanecem. Bastien sorriu, intrigado. — E quais são as suas intenções? — Garantir que esta aliança traga lucro... para ambos os lados — respondeu, sem vacilar. Leonardo observava tudo em silêncio, fascinado. Camila estava se saindo melhor do que esperava. Talvez... até demais. Mais tarde, no quarto do hotel, Camila encarava o espelho. Estava exausta. A pressão de fingir, sorrir, negociar com monstros. Tudo isso enquanto seu peito ardia com a imagem do filho que não via há anos. Leonardo entrou no quarto sem bater. — Você brilhou hoje. — Me poupe da bajulação. Ele se aproximou, as mãos nos bolsos. — Estou falando sério. Você foi perfeita. Confiante. Sedutora. Brilhante. Ela virou-se de frente para ele. — Isso tudo faz parte do plano, não é? Me reconstruir... só para depois me destruir? — Não — respondeu com firmeza. — Mas talvez eu queira te reconstruir para que, quando tudo acabar, você não precise mais fugir. Camila se surpreendeu. Havia uma sinceridade na voz dele que a desestabilizava. — Você não me conhece mais, Leonardo. Eu não sou mais aquela mulher que você deixou no chão, sangrando. — Eu nunca te deixei. — Não? Então por que você desapareceu? — Porque me disseram que você tinha perdido o bebê... e fugido com outro homem. Ela arregalou os olhos. — Isso é mentira! — Descobri isso tarde demais. E quando procurei você, já era uma sombra. Um silêncio tenso caiu entre eles. — E agora? — Agora... quero a verdade. Camila se aproximou, olhando nos olhos dele. — A verdade, Leonardo, é que você destruiu minha vida. Mas eu ainda te desejo. E isso me mata todos os dias. Ele a puxou pela cintura, os rostos colados. — Então morremos juntos. O beijo foi intenso. Quente. Como se todos os anos de ódio e desejo se explodissem em um só momento. Mas enquanto ela se entregava ao toque, uma única imagem atravessou sua mente. Rafael. Ela o empurrou com força. — Isso não muda nada. — Não, Camila. Isso muda tudo. No aeroporto de Paris, uma mulher descia de um voo vindo de Marselha. Trazia consigo uma mala pequena e uma carta dobrada no bolso do casaco. Seu nome era Helena Vasques. E ela estava ali para proteger o neto... e revelar um segredo que poderia destruir tudo o que Camila construiu. Enquanto isso, Alexandre conversava com alguém ao telefone. — Encontre Helena Vasques. Agora. E traga-a até mim. Preciso saber se esse garoto é mesmo de Leonardo. Porque se for... tudo muda. No quarto do hotel em Genebra, Camila estava sentada na cama, olhando para a tela do celular. Uma mensagem não lida. De um número que ela não via havia seis anos. "Mamãe?" A mão dela tremia. Os olhos se encheram de lágrimas. E naquele instante, ela soube: nada mais seria como antes.