Isabella Duarte Ricci
A manhã começou com uma leve brisa entrando pelas janelas da mansão. O sol era caloroso, assim como o carinho de Tomas, ele já estava na cozinha, preparando uma xícara de chocolate quente, era o que eu sempre estava bebendo ultimamente. O aroma doce preenchia o ambiente, trazendo uma sensação de conforto. — Está pronto Bella — disse ele, oferecendo-me uma xícara. Sentei-me à mesa, observando-o. Seus movimentos eram calmos, precisos. Havia uma serenidade nele que contrastava com o caos que costumava dominar minha vida. — Dormiu bem? — perguntei. Ele sorriu, aquele sorriso que sempre aquecia meu coração, eu não o amava, mas ele era como calmaria em minha vida e era tudo que eu precisava naquele momento. — Infelizmente não, já que você não estava por perto. Passamos o dia juntos, caminhando pelos jardins, conversando sobre tudo e nada. Ele me fazia rir com suas histórias, das lembranças do tempo da universidade e por um momento, esqueci-me de tudo o que nos cercava. No entanto, uma parte de mim não conseguia esquecer Dimitri. Ele era o oposto de Tomas: intenso, imprevisível, frio e louco. Mas havia algo nele que me atraía, uma conexão que eu não conseguia explicar e o Tomas sabia, mas mesmo assim parecia não se importar e de certa forma isso me deixava incomodada, já que eu não desejava ter ele na minha cama, e ainda sonhava com o Dimitri, parte de mim queria terminar esse relacionamento que sequer havia começado. Enquanto assistíamos a um filme, Tomas virou-se para mim e disse: — Eu sei que não posso ocupar um espaço no seu coração, sei que por mais que se sinta bem ao meu lado, ainda não me ama. Mas não se preocupe comigo, eu estou bem e só de estar ao seu lado, isso me basta. Suas palavras me tocaram profundamente. Eu queria amá-lo da maneira que ele merecia, mas meu coração pertencia a apenas ao Dimitri. Dimitri Carter O hospital tornou-se meu novo lar. Não por escolha, mas por necessidade. Cada noite, eu dormia na poltrona ao lado da incubadora onde minha filha lutava para viver. O som constante dos monitores era a trilha sonora dos meus dias e noites. Naquela manhã, enquanto observava minha pequena guerreira, um de meus funcionários, Viktor, entrou no quarto. — Senhor, já tenho todas informações sobre o doutor Tomas Clifford. Ele me entregou um dossiê. Folheei rapidamente até encontrar o que me interessava. Ali estava: câncer de pâncreas, estágio 4. Fiquei em silêncio, absorvendo a informação. A ironia era cruel. O homem que Isabella parecia amar, está morrendo. — Continue monitorando-o. Quero saber cada passo que ele dá.Viktor assentiu e saiu. Voltei meu olhar para minha filha. Ela era a razão pela qual eu ainda respirava. Isabella havia escolhido Tomas, mas eu não podia ignorar o fato de que ele estava com os dias contados. E quando ele se fosse, eu estaria aqui, pronto para cuidar dela e de nossos filhos, pela primeira vez eu não vi o Tomas como uma ameaça para mim e para mulher que eu amo. A vida é imprevisível. E eu estava agora em dúvida se deveria fazer com que a Isabella descobrisse a verdade, ou eu apenas deveria suportar o meu ciúmes e esperar que Isabella desejasse que eu estivesse presente na vida dela, mesmo que fosse apenas como pai dos nossos filhos. Horas depois, após Tomas ir embora, eu fiquei me perguntando por qual motivo estava tão cômoda, já que eu não amava o Tomas, o que eu estava fazendo? Tentei dormir naquela noite, mas meus pensamentos me mantinham acordada. As palavras de Dimitri, as memórias com Tomas, a culpa... tudo girava como uma tempestade dentro de mim. Revirei-me na cama, os lençóis agora pareciam um fardo. Por fim, levantei, talvez fosse por conta da minha gravidez e faltava apenas três dias para o meu parto. Desci as escadas em silêncio, sentindo o frio da madrugada sob os pés. A mansão estava quieta, quase como se também segurasse a respiração. Fui até a cozinha. O cheiro doce do bolo de chocolate me fez comer um pedaço dele. Me sentei à mesa, apoiando o rosto nas mãos. — Não consegue dormir? — disse uma voz rouca, vinda da sombra do corredor. Me virei assustadaEra ele.Meu pai. Vestido com um casaco e os olhos cansados, como se carregasse o peso de anos perdidos. Ele entrou devagar, como se pedisse permissão com cada passo. — O que você está fazendo aqui? — perguntei, tensa. — A sua mãe me disse que você teve uma visita hoje do Tomas, o que ele realmente está querendo? — Tudo que não posso dar a ele. Silêncio. Ele puxou uma cadeira e sentou-se à minha frente, os olhos cravados em mim como se buscasse algo. Talvez o tempo que perdeu. Talvez a filha que deixou para trás. — Não vim brigar, Isabella. Só... não consegui dormir também. E vi a luz da cozinha acesa. — Eu também não consigo dormir — confessei, cruzando os braços. — Mas acho que você não é exatamente a melhor companhia para uma insônia. Ele suspirou, os ombros caídos. — Por quê agora? — perguntei, a voz embargada. — Depois de tudo o que você fez... por que agora quer estar por perto? Ele me encarou. Os olhos, antes duros como pedra, agora pareciam cheios de arrependimento.— Talvez você não precise mais ficar com insônia. Talvez eu só precise te ouvir agora. Fiquei em silêncio. Uma parte de mim queria contar tudo para o meu pai. Outra parte só queria um colo, um lugar seguro. E, apesar de tudo, ele era meu pai, a pessoa mais parecida comigo. — Eu não sei o que fazer — sussurrei. — Meus sentimentos estão uma bagunça. Um homem que me acalma e outro que me tira o chão. Ele assentiu, respeitando cada palavra. — Então deixa eu ficar do seu lado. Sem cobranças. Sem discussões. Só como seu pai, e avô dos seus filhos, minha filha. Hesitei. Mas depois levantei, fui até o armário e peguei duas xícaras. Fiz chocolate quente. Coloquei uma diante dele. Não dissemos mais nada.Mas talvez, pela primeira vez, começássemos a nos entender sem sequer precisar falar, o meu pai era uma parte de mim que eu sempre podia contar, mesmo que nossas personalidades fossem fortes. continua...Dimitri Carter A manhã mal havia começado e eu já estava na porta do consultório do Tomas Clifford. O céu estava acinzentado através da janela, eu segurava um copo de café amargo, o meu estômago era a única coisa que me lembrava de que eu ainda estava vivo, ou tentando estar. Entrei sem pedir permissão, ignorando a secretária que me pediu para esperar. A porta do consultório estava entreaberta. Tomas entra e sem me notar ele logo senta à mesa, analisando exames. Levantou os olhos e, quando me viu, sua expressão endureceu. — Você tem coragem, eu admito — ele disse, cruzando os braços. — O que veio fazer aqui, Carter? Fechei a porta atrás de mim e caminhei até a cadeira à sua frente. Não me sentei. — Por quanto tempo você vai esconder dela? — perguntei, direto. — Por quanto tempo vai fingir que ainda tem tempo? Ele largou a caneta e se levantou devagar, o maxilar trincado. — Isso não é da sua conta. Eu não te devo satisfações. — Não! — concordei, com calma. — Mas ela merec
Dimitri Carter O meu coração disparado, as mãos suadas, a mente girando entre mil pensamentos e possibilidades. Eu sabia. Sabia que era hoje. Que eles haviam chegado.Mas a confirmação veio como um soco no estômago quando vi os seguranças postados na entrada da ala onde Isabella estava. Tentei passar direto, mas fui barrado imediatamente.— Senhor, não pode entrar sem autorização.— Sou o pai. — minha voz saiu firme, embora carregada de ansiedade. — Os filhos... meus filhos nasceram hoje.Eles se entreolharam, indecisos, até que uma terceira presença surgiu no corredor. O pai dela.Ele caminhou em minha direção com a mesma expressão que sempre carregava,dura, atenta, mas naquele momento, havia algo mais em seu olhar. Algo que eu não esperava: respeito.— Pode deixar ele entrar — disse, sem me encarar diretamente. — Eles estão te esperando, Dimitri.Não hesitei. Apenas agradeci com um aceno e passei pela porta como se estivesse entrando num novo mundo.E, de certa forma, estava.O qu
Dimitri Carter O corredor da UTI neonatal é um universo suspenso, luzes suaves, monitores que pipocam como estrelas distantes, vozes sempre em um tom abaixo do mundo real. Há dois dias vivo aqui dentro, vendo cada minuto esticar‑se e encolher em compassos irregulares; tudo depende da respiração dela. Minha filha. Parei diante da incubadora como quem chega a um lugar sereno. Por trás do acrílico, o corpo minúsculo se agitava em sonhos que eu não conseguia alcançar. Tubos, sensores, a luz azul do fototerápico… cada fio traduzia a delicadeza que eu não fora capaz de proteger. —Respira, Dimitri—repeti baixinho. Palavras vazias, mas era o que eu tinha. — Você já conversou com ela hoje? —A voz às minhas costas era suave, musical. Virei‑me. A enfermeira trazia no crachá o nome Mônica. Olhos cor de mel e aquela expressão de quem parece ter coragem. — Falei um pouco — murmurei. — Mas sempre parece insuficiente. Mônica sorriu, aproximando‑se da incubadora. Ajeitou delicadamente um sens
Dimitri Carter Três meses se passaram entre o primeiro contato pele a pele e este momento em que o elevador do prédio, lento como sempre, anuncia o térreo com um ding abafado. Tenho Bella aconchegada num canguru, pequenina, mas já absurdamente maior do que aquela versão iluminada de fios e sensores. E à minha esquerda, carregando duas mochilas, um estetoscópio pendurado no pescoço, está Mônica.O corredor do edifício parece mais longo do que recordo. Talvez porque, pela primeira vez, vou atravessá‑lo como pai em tempo integral, sem beeps de saturação ditando o compasso. Ainda estranho o silêncio que substituiu a sinfonia eletrônica da UTI.— Respira, Dimitri — lembra Mônica, divertida, devolvendo‑me as próprias palavras de meses atrás.Obedeço. Inspiro fundo o cheiro do perfume suave de lavanda vindo do gorro de Bella. O som do meu coração já não encontra rivais mecânicos, ecoa livre, feito bumbo de escola de samba na avenida.A porta se abre para um ambiente transformado. Enquanto
Isabella Duarte RicciEu não conseguia dormir. Fiquei na poltrona do quarto dos meus meninos, o telefone aceso como um farol, relendo cada palavra que Dimitri enviou. A saudade nadava em mim havia meses, mas só agora percebo o quanto me afoguei tentando fingir que estava tudo bem. Ele escreveu lar e alguma coisa dentro do meu 2 peito estalou , porque era essa a minha falta: um lugar onde o amor não precisasse pedir licença.Às quatro da manhã, decidi, eu ainda estava insegura, mas não voltaria atrás. Beijei cada bochecha macia dos meus bebês, deixei leite materno na geladeira, dei um sorriso inseguro para a babá de plantão:— Volto o mais breve possível.Pego a chave que ainda guardo desde o tempo em que nós havíamos nos divorciado. A cidade está úmida, cheirando a madrugada e jasmim, quando estaciono diante do edifício. O elevador sobe lento, cada número acendendo como batidas ansiosas.A porta do apartamento se abre, após eu virar a maçaneta, sem ranger. Eu sussurro:— Dimitri?
Isabella Duarte Ricci Desperto com o peso confortável de um braço em torno da minha cintura e o som suave da respiração de Dimitri atrás de mim, constante, confiável como eu precisava que fosse. O peito se aquece; não de euforia, mas de uma serenidade nova. Solto-me devagar, visto a camisa dele que encontrei no tapete e caminho até o bercinho da Bella, que dorme enroscada num casulo de algodão, lábios entreabertos, expressão de quem confia no mundo. Penso nos meninos, na mansão ainda adormecida, e num futuro em que não precisaremos dividir lares.Ouço passos hesitantes. Viro-me: Dimitri está atrás de mim, me abraça e eu olho para o cabelo bagunçado dele.— Achei que você... — ele começa, mas a voz falha.— Shh. Vem cá — peço.Ele se aproxima; seguro suas mãos. Sinto um leve tremor.— Fiquei com medo de que não estivesse aqui, e tudo tivesse sido apenas um sonho.— Vou te dar uma chance, Dimitri. Uma. Vejo os ombros dele cederem num suspiro entre alívio e responsabilidade.— Mas voc
Dimitri Carter — Você não sabe o que está fazendo. — ela me olha com um olhar gelado, tentando se manter forte. — Isso não vai acabar bem. Eu não vou ser sua prisioneira.— as palavras dela são frias como gelo. —Nem você, nem ninguém, vai me controlar assim.É certo que você foi meu primeiro amor e, agora, é o pai dos meus filhos que estão para nascer, mas eu não consigo te amar, não consigo mais sentir aquele desejo e não tenho mais forças para jogos ou seja lá o que for que você agora esteja planejando. O primeiro amor verdadeiro que tive, a dor de perda constante que ainda me assombra. Perdi meu primogênito, a parte mais pura de mim, e a dor de vê-lo partir me dilacerou por dentro de uma forma que eu nunca imaginei ser possível. E Isabella. Ela se tornou o único amor verdadeiro que meu coração aceitou após perder minha primeira esposa e filho, a mulher que eu nunca consegui deixar ir, e que, por mais que eu tenha tentado. Eu lutei para negar meus sentimentos a Isabella, lut
Isabella Duarte Ricci Eu não sabia onde isso ia dar. Eu não sabia se algum dia abriria mais do que essa janela para Tomas. Mas, por agora, saber que ele estava ali era o suficiente. O suficiente para me fazer sentir, pela primeira vez em muito tempo, que na verdade houvesse um caminho de volta para mim. Tomas não soltou minha mão. Ele ficou ali, olhando para mim como se tentasse decifrar cada parte do que eu não dizia, do que eu não conseguia admitir nem para mim mesma. O vento frio da noite pareceu me despertar um pouco da névoa de sensações que aquele beijo havia deixado para trás. Eu deveria dizer algo, me afastar, colocar uma barreira entre nós. Mas a verdade era que eu não queria. Pela primeira vez em anos, eu não queria fugir. — Quer dar uma volta? — Ele perguntou, puxando-me levemente pela mão. Eu hesitei. O hospital ainda estava às minhas costas, e o peso do passado tentava me puxar de volta. Mas Tomas era calor, era presença. E naquele momento, eu precisava disso mais