Capítulo 22 — O Diário e o Véu
Escrevi os três parágrafos como quem fecha ferida com linha curta: frio, limpo, impecável. “Leilão; cautela pública; compra para preservar.” Sem herói, sem vilã. Assunto do e-mail: “Nota de serviço.” Era quase ofensivo reduzir uma noite inteira a um comunicado técnico — e justamente por isso funcionava: não dar combustível.
Adormeci com a luz acesa. Acordei às 06:12 com duas batidas discretas.
— Rafael Duarte? — a voz feminina, firme.
Abri. Lucía. Cabelo preso, casaco preto, uma pasta fina com o selo da Fundación.
— Como você entra em todos os lugares? — cedi passagem.
— Portas gostam de nomes. — Ela sorriu. — E nomes gostam de quem não os desperdiça.
Na pasta: duas folhas sob filme. Primeira e última páginas do mesmo caderno que batia no meu peito. Cadeia de custódia, carimbo, o símbolo — flor entrelaçada a uma coroa. A caligrafia inclinada, firme, bonita demais para o acaso.
A primeira frase sussurrava como lâmina: “Não precisei de trono para ser ouvid