Capítulo 7 os primeiros dias de Lua.
(Eduardo Duarte Galvão)
Eu sempre gostei de ver as pessoas no limite. Era a forma mais rápida de descobrir quem era fraco e quem tinha fibra. Nos primeiros dias de Lua como minha secretária, fiz exatamente isso: testei cada detalhe, cada resposta, cada reação.
— Lua, esse relatório está confuso. Refaça. — ordenei, sem sequer levantar os olhos da tela.
— Mas, senhor, acabei de fazer...
— Eu não perguntei se você acabou. Eu disse para refazer.
Ela respirava fundo, mordia os lábios, mas obedecia. Eu percebia o esforço dela em manter a calma, e isso me intrigava. A maioria já teria desistido. Mas ela... aguentava.
Na terceira manhã, chamei-a em minha sala.
— Lua, preciso que organize essas planilhas. São dados de três anos, e quero um resumo em duas páginas.
Ela arregalou os olhos.
— Três anos em duas páginas?
— Sim. — respondi, frio. — Se não consegue, avise logo. Assim procuro outra pessoa.
Ela cerrou os punhos, levantou o queixo e disse:
— Eu consigo.
Saiu da sala com passos firmes, e eu, contra minha vontade, sorri de canto. Havia fogo naquela mulher.
Mas eu não podia me distrair. Tinha problemas maiores.
Naquela noite, meu pai apareceu em meu escritório, como sempre fazia sem ser convidado. Entrou com seu jeito imponente, trazendo o peso do sobrenome Duarte Galvão.
— Eduardo, precisamos conversar.
Suspirei, já prevendo o sermão.
— Sobre o quê desta vez?
— Sobre o futuro da empresa. — disse, com a voz grave. — Você sabe que, segundo os estatutos, para se manter como CEO precisa estar casado e ter um herdeiro.
Revirei os olhos.
— Já falamos disso, pai. Eu não tenho interesse em me casar.
— Então se prepare para ver seu primo Thiago assumir o que você construiu.
Aquela frase me fez cerrar os dentes. Thiago era um irresponsável, um playboy que só pensava em festas e mulheres. A ideia de vê-lo à frente das empresas me enojava.
— Não vou deixar Thiago destruir a Duarte Galvão. — respondi, firme.
— Então faça o que tem que ser feito, Eduardo. Case-se. — disse ele, antes de sair e me deixar sozinho com meus próprios demônios.
Na manhã seguinte, Thiago apareceu em meu escritório como se fosse dono do lugar. Entrou sem bater, como sempre.
— Primo! — disse, abrindo os braços. — Como vai o grande CEO da família?
Revirei os olhos.
— O que você quer, Thiago?
Ele riu, espalhando seu charme barato. E então a vi. Lua. Ela estava na recepção, concentrada em digitar, os cabelos caindo sobre o rosto. Thiago a notou no mesmo instante.
— E quem é essa beldade? — perguntou, com um sorriso malicioso.
— É a minha secretária. — respondi, seco.
Ele se aproximou dela sem a menor vergonha.
— Oi, querida. Prazer, Thiago Duarte Galvão. O primo charmoso do seu chefe carrancudo.
Lua ergueu os olhos, claramente incomodada.
— Muito prazer. — respondeu, educada, voltando ao computador.
— Nossa, que fria! — ele riu. — Mas eu gosto das difíceis.
Eu senti algo estranho me percorrer. Raiva. Ciúme. Não fazia sentido. Ela era só minha secretária. Por que me incomodava tanto vê-la ser alvo do sorriso nojento de Thiago.
— Thiago, pare de incomodar minha funcionária. — cortei, ríspido.
Ele ergueu as mãos, fingindo inocência.
— Calma, primo. Só estou sendo simpático.
— Fora daqui. — ordenei.
Thiago piscou para Lua antes de sair. Eu apertei os punhos, contendo a vontade de socá-lo.
Lua me olhou, surpresa com minha reação.
— Senhor, não precisava...
— Precisava, sim. — interrompi. — Ele não presta.
Ela arqueou a sobrancelha.
— E o senhor presta?
Aquilo me pegou de surpresa. Respirei fundo, tentando manter a compostura.
— Eu sou o seu chefe. Apenas lembre-se disso.
Ela sorriu de canto, provocativa.
— Sim, senhor.
Voltei à minha mesa, mas minha mente estava em caos. Desde quando eu me importava com quem meus primos olhavam? Desde quando uma mulher que mal conhecia era capaz de tirar minha concentração?
Naquela noite, deitado em minha cama, pensei nas palavras do meu pai. Casamento. Herdeiro. Permanência no cargo. E, inevitavelmente, pensei em Lua.
Ela era inteligente, corajosa, é uma mulher muito atraente, e inteligente não se dobrava facilmente. Tinha fogo nos olhos. E, mais importante, não parecia estar interessada em meu dinheiro ou poder.
“Um casamento por contrato.” A ideia surgiu como um relâmpago. Simples, objetivo. Eu manteria minha posição, ela teria estabilidade para cuidar da filha. Nenhum envolvimento emocional. Apenas um acordo.
Sorri, satisfeito com meu raciocínio frio.
Mas, no fundo, algo me dizia que com Lua nada seria tão simples assim.
No dia seguinte, cheguei cedo ao escritório. Já tinha tomado minha decisão: precisava observar Lua em circunstâncias diferentes. E a oportunidade caiu em minhas mãos como presente do destino.
Um e-mail da diretoria internacional me aguardava na caixa de entrada: tratava-se da abertura da nova filial em Nova York. Precisavam de mim para finalizar contratos e alinhar os investimentos.
Sorri sozinho. Era o teste perfeito.
Chamei Lua à minha sala.
— Lua, arrume seus documentos, você precisa de um passaporte. Vamos viajar para Nova York.
Ela arregalou os olhos, surpresa.
— Nova York? Eu?
— Sim. — respondi com naturalidade. — Preciso de alguém de confiança ao meu lado.
— Mas... senhor, eu não posso, não tenho passaporte.
Cruzei os braços, arqueando a sobrancelha.
— Não pode? Sobre o passaporte eu dou meu jeito, vamos com o meu jatinho particular e por que não?
Ela abaixou os olhos, nervosa.
— Eu tenho a Sol... minha filha. Ela depende de mim. Não posso simplesmente deixá-la.
Suspirei, já esperando essa resposta.
— Então leve-a.
Ela me olhou como se eu tivesse perdido a razão.
— Levar minha filha para Nova York? Não é tão simples assim.
— Eu resolvo. — disse, firme. — Contratarei pelo menos duas babás de confiança. Você terá todo o suporte que precisar.
— Duas babás? — ela repetiu, incrédula. — O senhor acha que dinheiro resolve tudo.
Inclinei-me na cadeira, encarando-a.
— Não, Lua. Dinheiro não resolve tudo. Mas resolve boa parte. Você precisa deste emprego, certo? Precisa sustentar sua filha, pagar tratamentos. Então, aceite minha oferta. Será apenas uma viagem de negócios.
Ela mordeu o lábio, em dúvida. Eu percebi a luta interna.
— Eu não sei se é uma boa ideia...
— É. — cortei, convicto. — Para você e para mim.
Silêncio. Então ela suspirou, rendida.
— Está bem. Eu vou. Mas só porque não tenho outra opção.
Um meio sorriso escapou dos meus lábios.
— Ótimo. Prepare-se, então. Partiremos em três dias.
Ela levantou-se, ainda atônita, e saiu da sala. Eu fiquei observando a porta se fechar atrás dela.
Era isso. Nova York seria o palco perfeito para colocar Lua à prova. Queria ver como ela lidava com pressão, com mudanças repentinas, com o meu mundo.
E, no fundo, queria ter certeza: seria ela a candidata ideal para o que eu tinha em mente!
Um casamento por contrato não podia ser arriscado. Precisava de alguém leal, firme... e, de preferência, que não se apaixonasse.
Lua Carvalho... será que você vai me surpreender de novo?