De primeira

A estante baixa sob a janela exibia algumas revistas de design e uma caixa de som Bluetooth. O ar-condicionado estava ligado no modo silencioso, quase imperceptível, mantendo o ambiente fresco. Tudo ali passava uma sensação de conforto com elegância discreta, uma casa de quem tem dinheiro, mas não ostenta.

Ele abriu a porta completamente e se virou pra mim.

— Pode entrar.

Entrei devagar. Meus olhos percorreram o espaço, cautelosos. Era estranho estar ali. Eu esperava… não sei. Gente conversando, uma empregada na cozinha, alguém vendo TV. Mas ele não falou nada sobre estar sozinho. E ainda assim, aqui estávamos nós.

— Tá sozinho? — Perguntei só para confirmar.

Ele deu de ombros, fechando a porta com calma.

— Tô, sim.

Não era exatamente uma surpresa. Mas ainda assim, causava um incômodo, aquela sensação de que algo estava acontecendo e eu ainda não sabia o quê.

— Quer comer alguma coisa?

— Não — respondi rápido demais. — ainda encarando a minha volta.

Ele sorriu, um canto só da boca subindo, como se soubesse exatamente o que se passava na minha cabeça.

Nos sentamos no sofá, deixando um espaço entre nós.. Do lado de fora, o mundo parecia distante. Nenhum som da festa, nenhum louvor ecoando. Só nós dois, o zumbido do ar-condicionado, e aquela tensão elétrica que vinha crescendo desde o portão.

— Me disseram umas coisas aí…— ele se virou pra mim, sua expressão um pouco confusa.

— Que coisas? — Meu coração começou a bater forte no peito quando uma bola se formou na minha garganta.

— Que o seu primeiro beijo foi comigo.

Fiquei muda. Senti o sangue subir direto pro rosto. Arderam minhas bochechas, minha nuca. Minhas mãos se fecharam no tecido da minha saia.

— Deve ter sido um erro eu vir aqui — falei, me levantando com um impulso tenso.

Ele esticou o braço e segurou meu pulso, não com força, mas com firmeza.

— Não precisa ir embora.

— Eu não devia estar aqui. — Aviso, trêmula.

— Eu não vou te constranger, Isabel. Só fiquei curioso. Desculpa se falei besteira.

Respirei fundo, tentando desarmar a vontade de correr. Eu não era burra. E também não era hipócrita. Tinha vindo porque queria. Mesmo de castigo, mesmo com culpa. E talvez, justamente por isso, me sentia tão vulnerável.

— Não são boatos — falei, a voz mais baixa agora. — Minha família é complicada. Rígida. Controladora. Você não faz ideia.

Ele me olhou de um jeito diferente. Ainda tinha algo de malicioso nos olhos, mas por um segundo, achei ver ali um vestígio de pena. Ou talvez fosse outra coisa. Não sei.

Me acomodei de novo no sofá, mais devagar dessa vez. Ele também não se aproximou de imediato. Ficamos em silêncio por alguns segundos.

— Sabe… — ele disse, virando levemente o corpo pra mim — …aquele beijo… foi meio atrapalhado, né?

Sorri sem mostrar os dentes, envergonhada.

— Eu nunca tinha… — comecei, mas não terminei.

Ele assentiu, como se entendesse tudo sem que eu precisasse dizer.

— Quer aprender a fazer isso direito?

Me virei pra ele, coração acelerado. A pergunta soou mais íntima do que ousada. Não foi uma proposta suja. Foi… quase gentil.

Antes que eu pudesse responder, ele se aproximou.

A mão dele tocou meu rosto com calma, os dedos quentes encostando na curva da minha mandíbula. Ele me olhou nos olhos por um segundo, um segundo longo, e então me beijou.

Dessa vez foi diferente.

Ele conduziu devagar, com a boca certa, com o toque certo. Não houve pressa, nem língua invasiva, nem choque, muito menos dentes batendo. Foi firme, foi quente, foi bom. Os lábios dele dançaram sobre os meus como se ele soubesse exatamente o que fazer, e eu só precisei seguir.

Um arrepio subiu pela minha espinha. Meus dedos se fecharam na barra da camisa dele sem perceber. A cabeça girava um pouco. E pela primeira vez, eu entendi o que era ser beijada de verdade.

Não era só a boca.

Ela o jeito que ele segurava meu rosto. O modo como ele me tocava como se eu fosse feita de alguma coisa preciosa. Como se fosse natural. Como se eu tivesse o direito de estar ali.

Quando ele se afastou, ainda perto, os olhos ainda em mim, eu estava sem ar. Sem palavras. Sem saber o que pensar.

Mas sabendo exatamente o que sentia. Ele afastou os lábios dos meus e sorriu contra minha pele.

— Você ficou tão bem assim… esta corada — murmurou, os olhos presos aos meus. — Já é uma ótima aluna.

Meus lábios ainda formigavam. Eu devia estar vermelha. Ou com cara de boba. Ou tudo isso junto.

Ele voltou a me beijar, e dessa vez eu já não hesitei. Me entreguei por mais alguns segundos àquele calor, ao som abafado das nossas respirações, ao toque insistente de seus dedos no meu quadril.

Mas, aos poucos, a mão dele foi subindo. Escorregou da minha cintura para a lateral do meu corpo, depois para a barra da minha blusa. E então começou a deslizar por debaixo do tecido. A palma quente e curiosa encostou na minha pele nua, e eu me enrijeci. Fiquei muito quieta, como se minha imobilidade fosse impedir o que quer que ele estivesse pensando em fazer. Meu coração batia forte. Muito forte.

— Ei — ele sussurrou, com um sorriso no canto da boca. — Fica calma… Eu não vou fazer nada que você não queira. — Me encarou e então falou — Você é linda Bel…

Rafael afastou o rosto e me olhou nos olhos. A mão dele ainda estava ali, parada. Quente.

— Tá tudo bem? — perguntou.

Assenti devagar. Não confiava na minha voz. Ele sorriu, mas dessa vez o sorriso foi diferente. Menos confiante. Menos provocador. Quase… gentil.

Ele encostou a testa na minha e respirou fundo. Instintivamente fechei os olhos.

— Você é diferente — ele murmurou. — E isso me deixa meio… nervoso, sabia?

Abri os olhos, surpresa.

— Nervoso? Você? — Pergunto incrédula.

— Uhum. — Ele riu, mas foi aquele riso torto, que não chegou nos olhos. — Porque, sei lá… você não é como as outras. Não parece aquela múmia que o povo vive falando na escola.

Pisquei. A palavra bateu meio torta. Múmia?

— Como assim? — minha voz saiu baixa, porque eu ainda tava processando.

— É que, sei lá… você tem esse jeito meio quieto, mas ao mesmo tempo parece que toparia tudo. Tipo, como se quisesse sentir o mundo com a pele, sabe? — Ele passou os dedos pela minha bochecha, suave. — Gosto disso. Nunca conheci alguém assim.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App