Capítulo 7

A noite parecia interminável. O relógio na parede marcava algo em torno de duas da manhã, mas o tempo se arrastava, pesado e sufocante. Eu me mexia na cama, virando de um lado para o outro, tentando encontrar o sono que teimava em fugir de mim. O colchão parecia menor, o travesseiro mais duro, o ar mais denso. Tudo estava... diferente.

A velha cama da infância, com seu cheiro leve de talco e lembranças, agora me parecia estranha. O quarto rosa, com as fitas de tule que mamãe insistia em manter, parecia de outra pessoa. Toquei a parede coberta pelo tecido escuro e senti o arrepio da lembrança — eu costumava fingir que aquele quarto era uma torre, e que um príncipe viria me salvar. Mas agora eu sabia: príncipes não existiam.

Suspirei, observando a luz do jardim projetar reflexos suaves no teto. As sombras dançavam lentamente, embaladas pelo vento que passava pela janela aberta. Por um instante, o som das folhas lá fora me trouxe calma. O cheiro úmido da noite, o sussurro do vento, o balanço do tule... tudo me fez mergulhar em memórias. E assim, sem perceber, adormeci.

Não sei quanto tempo passou até que o som da chuva me despertasse. A primeira pancada contra o vidro me fez abrir os olhos devagar. Pisquei algumas vezes, confusa. A janela ainda estava aberta e as cortinas se agitavam com o vento. “Se mamãe vir isso, vai brigar de novo”, pensei, tentando rir baixinho, mas a risada morreu antes de nascer.

Sentei na cama, afastando os cobertores. O chão frio sob meus pés me trouxe à realidade. Caminhei até a janela, sentindo o coração ainda preguiçoso batendo em ritmo calmo... até que algo se mexeu.

Um farfalhar. Um som estranho, como tecido roçando no vidro.

Eu congelei.

Antes que pudesse dar um passo, a janela se fechou sozinha, com um estalo alto.

A luz do jardim piscou.

E então eu o vi.

Uma figura parada diante da janela. Alta. Escura. Vestida com um manto negro que cobria até os pés.

Por um instante, não respirei. O ar pareceu evaporar. Cada batida do meu coração ecoava como um trovão no peito.

O homem não se moveu. Apenas ficou ali, como se me observasse de dentro das sombras.

— Isso é um sonho... — murmurei para mim mesma, num fio de voz.

Mas o som da chuva, o frio cortante do vento e o cheiro de terra molhada me diziam o contrário.

A figura deu um passo.

Eu recuei.

Outro passo.

Meu corpo encostou na parede, e o pânico me invadiu. Tentei gritar, mas minha garganta falhou. Nenhum som saiu. Era como se algo invisível me silenciasse.

O homem parou diante da cama. A luz fraca da rua penetrou pelo vidro e revelou um pedaço do seu rosto — a linha firme do maxilar, o olhar escuro, profundo.

E foi então que ouvi.

— Rosália...

Meu nome. Sussurrado como uma prece. Ou uma maldição.

Ele se moveu, o capuz deslizando um pouco, revelando parte do rosto. Não era um estranho. Eu o conhecia. Mas o medo me impedia de pensar.

— Quem é você? — perguntei, tremendo. — O que quer de mim?

Um sorriso lento apareceu em seus lábios. — Você não se lembra de mim? Que decepção, futura esposa.

Aquele timbre. Aquela ousadia.

Luciano Bonanno.

Meu sangue gelou.

A voz do herdeiro da família que arruinou a nossa. O homem que meu irmão detestava. O mesmo que o destino cruel insistia em empurrar para o meu caminho.

— Como entrou aqui? Foi o Henrique? Ele deixou você entrar?

Ele deu um passo à frente, e o som do couro das botas no chão ecoou como um aviso. — Eu não preciso de permissão para ver a mulher que vai se casar comigo.

Meu corpo travou.

A cada palavra dele, a realidade se tornava mais sufocante.

— Eu vim lhe dar um presente. — disse, num tom leve demais para alguém que invadia um quarto no meio da madrugada.

— Eu não quero nada seu. — sussurrei, mas ele continuou se aproximando.

O colchão afundou quando ele se inclinou. A distância entre nós se tornou quase inexistente. Tentei puxar o cobertor, mas ele o arrancou com um movimento brusco.

— Não há necessidade disso. — murmurou. — Logo tudo que é seu será meu.

Meu coração batia tão alto que doía. Eu queria correr, mas minhas pernas tremiam.

Luciano passou os olhos pelo quarto, observando cada detalhe. — Um quarto de menina... curioso. — E então, voltou a olhar para mim. — Ainda acredita em contos de fadas, Rosália?

— O que você quer de mim? — repeti, com a voz embargada.

Ele se inclinou, roçando a ponta dos dedos frios na minha bochecha. O toque fez meu estômago se revirar, e ainda assim, algo dentro de mim — algo que eu odiava — estremeceu.

— Você. — respondeu simplesmente.

O ar saiu dos meus pulmões num suspiro de puro desespero.

Ele segurou minha mão e enfiou a outra no bolso. — Tenho algo que vai selar o nosso destino.

Antes que eu pudesse recuar, senti o metal frio escorregar pelo meu dedo. Um anel. Ele o forçou até passar pela articulação, ignorando meu gemido de dor.

— Ai! — gritei, tentando puxar a mão.

A pedra negra reluzia com o brilho da tempestade lá fora. Era grande, pesada, opressora.

— Tire isso! — implorei.

Ele me olhou com aquele mesmo sorriso — metade ameaça, metade prazer. — Não adianta, Rosália. Esse anel é mais que um presente. É um pacto.

— Um pacto?!

— De posse. — respondeu, inclinando-se até nossos rostos quase se tocarem. — Você me pertence agora.

Meu corpo inteiro tremia. O medo e a raiva se misturavam, queimando por dentro. Tentei arrancar o anel, mas o metal parecia preso à pele.

Luciano segurou meu pulso e aproximou o rosto do meu pescoço. Senti sua respiração quente contra minha pele fria. Ele inalou o cheiro do meu cabelo como se quisesse decorá-lo.

— Você está proibida de tirá-lo. — sussurrou, e sua voz grave soou como uma sentença. — Ele vai te lembrar de quem manda aqui.

Meus olhos se encheram de lágrimas. — Por quê? Por que eu?

Ele se ergueu, e o capuz voltou a esconder o rosto. O sorriso não desapareceu.

— Porque você é uma Lucchese. — respondeu calmamente. — E nada une duas famílias como o medo.

As palavras dele me cortaram por dentro.

A chuva aumentou, e um trovão soou mais forte no céu, sacudindo as janelas. No reflexo do vidro, vi seu corpo desaparecer na escuridão. Um segundo depois, o vento invadiu o quarto, frio e cortante.

A janela estava aberta novamente.

Eu permaneci ali, imóvel, o coração disparado, o anel pesando no dedo como uma corrente. O medo me envolvia como um cobertor gelado. Tentei respirar fundo, mas o ar parecia denso, venenoso.

Fechei os olhos por um instante e jurei ouvir a voz dele, distante, sussurrando meu nome.

 “Você me pertence agora, Rosália Lucchese... para o bem ou para o mal.”

Abri os olhos num sobressalto. O quarto estava vazio. Mas o medo não havia ido embora.

Eu o sentia ali — nas sombras, no vento, no metal frio que agora marcava meu destino.

E pela primeira vez, temi que o amanhecer não fosse suficiente para afastar a escuridão que ele havia deixado.

Palavras da Autora.

Rosália achou que era só um pesadelo. Mas pesadelos não deixam marcas. Nem anéis impossíveis de remover.

E se o verdadeiro inferno começou naquele toque gelado? 🔥

No próximo capítulo... o dia amanhece, mas o medo não vai embora.

Você está pronta para o que vem?

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