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ROUBANDO RISOS E LENHAS

 Roubando Risos e Lenha Queimada

O sol ainda nem tinha chegado ao topo do horizonte quando despertei, o frio da manhã penetrando pelos lençóis finos da casa de caça. 

Laura dormia profundamente no carrinho improvisado ao lado da cama, e por um instante a sensação de paz me fez esquecer do peso que sentia desde que chegamos à fazenda. 

Mas bastou ouvir o primeiro cacarejar das galinhas para que a lembrança das tarefas do dia anterior me atingisse com força.

Levantei-me, coçando os olhos e resmungando baixinho. 

Meu corpo ainda doía da sequência interminável de atividades do dia anterior,  acender o fogo, recolher ovos, limpar o galinheiro, lidar com a lenha que parecia ter vida própria. 

A vida no campo era mais difícil do que qualquer corrida pela cidade ou reunião de trabalho estressante, e eu começava a perceber que o orgulho de Henry em me “ensinar” não tinha limites.

— Bom dia, senhora Letícia. Henry disse, surgindo da cozinha, com o cabelo ainda despenteado e um sorriso de canto, daquele tipo que sempre me deixava alerta. 

— Pronta para mais um dia de aventura rural?

— Aventura? Repeti, arqueando a sobrancelha, tentando não rir.

 — Você chama acender aquele fogão de aventura?

—Lidar com galinhas e limpar cocô de animais de aventura?

—meu conceito de aventura é bem diferente.

Ele deu de ombros, rindo baixinho:

— A vida no campo é cheia de surpresas. 

—Cada manhã é uma nova aventura.

—É só você saber aproveitar!

— Ah, claro!  Murmurei, cruzando os braços e fingindo indignação. 

— Surpresas que fazem meus músculos doerem mais do que qualquer academia urbana.

Henry caminhou até mim, observando-me com olhos brilhantes de divertimento:

— Isso é só o começo, Letícia. 

—Se você sobreviver a hoje, já é metade da batalha vencida.

— Sobreviver? Exclamei, segurando Laura com cuidado. 

— Olha, se sobreviver significa me transformar em uma escrava do galinheiro e da lenha, acho que minha vida urbana teve um fim dramático ontem.

Ele riu de verdade dessa vez, um riso baixo e contínuo, como se minha indignação fosse o entretenimento do dia.

— Querida, você ainda nem começou. 

—Espere até o almoço. 

—Vou te ensinar a arte de cozinhar no fogão a lenha sem incendiar a cozinha inteira.

Suspirei, mas não pude deixar de sentir um leve calor subir às bochechas.

 Havia algo em Henry que tornava até a frustração divertida, e mesmo sabendo que não podia confiar totalmente nele, começava a me sentir desafiada por aquela convivência.

— Tudo bem. Disse, tentando soar confiante. 

— Mas aviso desde já: 

—Se esse fogão me queimar, você vai ser responsável por minha vingança.

— Vingança?  Ele arqueou a sobrancelha, divertido. 

— Parece sério. 

—Não quero ser culpado pelo primeiro crime no campo da minha esposa.

Balancei a cabeça, sorrindo involuntariamente. 

Não era apenas o cansaço ou a surpresa de estar ali… 

Era algo sobre a forma como ele transformava cada pequena dificuldade em provocação, e cada provocação em riso contido.

Depois de alimentar as galinhas e recolher alguns ovos, Henry decidiu que eu precisava aprender a lidar com a lenha. 

Peguei o machado com cuidado, sentindo o peso do metal nas mãos urbanas e delicadas. 

O objetivo era simples: 

Cortar lenha suficiente para manter o fogo aceso durante o dia.

— Letícia. Começou Henry, aproximando-se e olhando-me com seriedade misturada a humor 

— A primeira regra é não cortar os próprios dedos.

— Ah, ótimo. Murmurei, mordendo o lábio. 

— Primeira regra do campo: 

—Não se matar com ferramentas rústicas.

— Segunda regra: 

Observe como eu faço antes de tentar. Disse, segurando um tronco grande e desferindo golpes precisos, cada estalo da madeira ressoando pelo campo.

Tentei imitar, mas o machado escorregou algumas vezes, derrubando pedaços de madeira para todos os lados e arrancando um grito meu.

— Está rindo de mim? Perguntei, virando-me rapidamente.

— Um pouco. Admitiu, cruzando os braços.

 — Mas estou admirando sua coragem. Quase!

Bufei, sentindo a frustração misturada à diversão. 

A cada golpe errado, a cada tronco que teimava em não se partir, eu explodia em risadas nervosas, que logo eram acompanhadas por risadas dele.

 Era impossível ficar séria por muito tempo com Henry por perto.

— Isso é um desastre ambulante. Exclamei, limpando a testa suada. 

— Acho que as galinhas prefeririam me atacar do que depender de mim.

— Se dependessem de mim, já teriam virado frango assado. Respondeu ele, piscando com malícia. 

— Mas você ainda tem chances.

Ao meio-dia, o ensopado de ontem se repetia, mas com pequenas melhorias. Henry me observava mexer os ingredientes, rindo das minhas tentativas e fazendo comentários irônicos que, embora sutis, me deixavam envergonhada.

— Não mexa tão rápido, Letícia. Disse, inclinando-se sobre o fogão. 

— A comida precisa sentir o amor, não o desespero da cidade.

— Amor ou tortura, Henry? Porque sinceramente, estou em dúvida. 

Respondi, mordendo o lábio para não rir alto.

Ele riu, balançando a cabeça:

— Um pouco de cada. Mas você está indo bem.

Após o almoço, decidi descansar um pouco na varanda com Laura, sentindo a brisa bater em meu rosto. 

Henry apareceu com uma pá e uma expressão séria, pronta para mais uma lição.

— Hora de limpar o estábulo. Anunciou, erguendo a pá. 

— E não reclame! 

—Aqui você aprende fazendo, lembra?

— Aprender! Resmunguei, sorrindo de canto. 

— Mas não prometo não xingar algumas vacas no processo.

Ele riu baixinho, balançando a cabeça:

— Se xingar as vacas, pelo menos elas vão respeitar você.

Enquanto trabalhava, a frustração se transformava em pequenas explosões de humor. 

Cada pedaço de estrume que se agarrava às minhas botas, cada animal que insistia em escapar, transformava-se em oportunidade de piada interna. 

Henry se divertia tanto quanto eu, talvez até mais, mas sempre de forma controlada, como se cada sorriso dele fosse um convite para continuar naquela dança de risos e provocações.

No final do dia, o cansaço era intenso.

 Minhas mãos estavam ásperas, minhas roupas cobertas de pó e fuligem, e meu cabelo despenteado pelo vento e pelo suor. 

Mas havia uma sensação de conquista, de ter sobrevivido ao dia inteiro sem cometer uma catástrofe total. Pelo menos não uma que resultasse em ferimentos ou incêndio.

— Não foi tão ruim assim.  Murmurei, sentando-me na varanda com Laura, que finalmente acordara, bocejando e esticando os bracinhos.

Henry apareceu ao meu lado, apoiando-se levemente na parede. 

Seus olhos estavam suaves, mas ainda brilhavam com humor e provocação.

— É, Letícia. Lisse ele, finalmente. 

— Mas amanhã será ainda mais divertido. 

—Ou doloroso. Depende do ponto de vista.

— Doloroso ou divertido? Repeti, sorrindo de lado. 

— Com você, nunca sei ao certo.

— Isso é parte do charme do campo. Respondeu ele, piscando de leve. 

— E parte do meu charme também.

Senti um calor subir ao rosto. 

A mistura de frustração, humor e atração se tornava cada vez mais intensa, criando uma tensão deliciosa e desconcertante entre nós. 

O campo, as galinhas, a lenha e até os ensopados rústicos agora tinham outro significado: 

Eram o cenário de um jogo silencioso de provocação, risos e descobertas mútuas.

Enquanto o céu escurecia e as estrelas começavam a surgir, percebi que, apesar de tudo, algo dentro de mim estava mudando. 

A vida urbana, com sua pressa e conforto, parecia distante demais. 

A vida na fazenda, com todas as suas dificuldades, exigia coragem, paciência e, acima de tudo, a capacidade de rir de si mesma.

E eu estava aprendendo. Entre risos, falhas e provocações 

Que talvez o campo tivesse muito mais a me ensinar do que eu poderia imaginar. 

E que Henry, com seu humor sutil e provocador, era parte indispensável dessa lição.

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