Mundo de ficçãoIniciar sessãoO bar onde Elisa tinha marcado o encontro era pequeno, abafado e iluminado por lâmpadas amarelas que tremulavam como se estivessem sempre prestes a apagar. Anna tentava controlar o tremor das mãos enquanto esperava. Elisa havia pedido que ela ficasse ali, porque iria “chamar o Pedro”.
O simples nome já fazia Anna engolir seco. Quando a porta se abriu, um homem entrou e o ar pareceu mudar. Pedro Henrique caminhava como quem tinha certeza de que todos deveriam abrir caminho. Boné abaixado, tatuagens escondidas pela manga comprida, relógio caro. Os olhos dele eram escuros, atentos — perigosos. Elisa levantou rápido. — Pedro, essa é a Anna. Aquela amiga que eu te falei. Ele olhou para Anna como quem avalia uma mercadoria rara. — Você tem cara de quem não nasceu pra isso — disse, puxando a cadeira e sentando de frente para ela. — Mas a Elisa disse que você precisa de dinheiro… muito dinheiro. Anna apertou as mãos no colo. — Minha mãe… ela precisa ser transferida. É caro demais. Eu não tenho como pagar. Pedro sorriu de lado, como quem já esperava aquela história. — Todo mundo que entra nesse trabalho tem uma mãe doente, um filho passando fome, um pai precisando de cirurgia. — Ele inclinou o corpo para frente. — Eu não quero saber da sua vida. Eu quero saber se você consegue fazer o que precisa ser feito. Anna desviou o olhar. — Eu… nunca fiz nada ilegal. — Ótimo. — Pedro abriu um sorriso frio. — Isso significa que você não está no radar de ninguém. Elisa tocou o ombro de Anna, tentando transmitir segurança — ou calá-la, Anna não tinha certeza. Pedro tirou um envelope grosso do bolso e colocou na mesa. — Aqui dentro tem o dinheiro da entrada para a viagem, documentos falsos, endereço e tudo o que você precisa pra começar. Mas antes de pegar, tem que aceitar o trabalho. Não tem volta depois que abrir isso. Anna sentiu o coração bater na garganta. — O que exatamente eu tenho que fazer? Pedro cruzou os braços. — Viajar pro México. De lá, você atravessa pros Estados Unidos com um grupo. Antes disso, vai engolir um pacote. É seguro — se você fizer direito. Chegando lá, alguém vai te encontrar e retirar o material. Você recebe o restante do dinheiro. Simples. A palavra “engolir” fez o estômago dela revirar. — E se der errado? Pedro deu um sorriso sem humor. — A gente não trabalha com “dar errado”. A gente trabalha com sobrevivência. Se você fizer tudo como eu mandar, nada vai acontecer. Elisa olhou para Anna com uma expressão séria, quase implorando: — Anna… é a única chance que você tem de salvar sua mãe. Não pensa demais. A lembrança do quarto 212, da respiração fraca de Beatriz, da falta de dinheiro… tudo colidiu dentro dela como ondas violentas. Anna respirou fundo. Ela pensou no futuro. Pensou no que perderia se recusasse. Pensou no que poderia salvar se aceitasse. E então, com a voz quase inaudível: — Eu aceito. Pedro bateu o envelope na mesa. — Bom. Você viaja amanhã à noite. Não conte pra ninguém. E se você atrasar, vacilar ou tentar fugir… não vai ter uma segunda chance. Um calafrio percorreu a espinha de Anna. Ela pegou o envelope com mãos trêmulas. Era pesado — não só pelo conteúdo, mas por tudo que representava. Pedro se levantou. — Elisa, traz ela no endereço que eu te passei. Tem preparação antes da viagem. E não deixa ela se arrepender. Ele saiu sem olhar para trás. Anna ficou parada, segurando o envelope como quem segura uma bomba. Elisa pousou a mão no ombro dela. — Vai dar tudo certo, amiga… Você está fazendo isso por amor. Anna não respondeu. Só sabia que, a partir daquele momento, seu mundo tinha deixado de ser seguro. E que o caminho que escolhera não tinha retorno.






