**Prólogo — Quando o ar acaba**
Existem noites em que a vida decide nos desafiar com força. O oxímetro emite um sinal agudo, soando fora de sintonia, enquanto a tela do aparelho pisca com a leitura preocupante de 84%. É um aviso, um ultimato. O corredor do hospital exala o cheiro forte de desinfetante misturado ao desespero palpável. Aperto a mão de Seraphina, e ela tenta esboçar um sorriso que não consegue completar. Sua respiração é superficial, seus olhos estão grandes e assustados, refletindo um medo silencioso. — Fica comigo, Sera... minha voz falha, quase quebrando. — Só mais um pouco, tá bom? Os médicos estão em uma conversa acelerada, suas palavras se atropelam: fibrose, agudização, UTI, vaga, protocolo. Consigo traduzir essa torrente de termos médicos de forma rápida e angustiante: o ar dela está se esvaindo e eu preciso encontrar um milagre. Novamente. É nesse momento que ele surge. Vestindo um terno escuro e com a gravata frouxa, seu olhar é tão intenso que parece capaz de parar o mundo: Adrian Monteiro. Um homem que tem o poder de comprar silêncio, tempo e até pessoas. O único que nunca conseguiu me comprar. — Eu resolvo. ele declara de forma direta. — Pago a UTI particular. Remédios, transporte, vaga, o que for necessário. Agora. — Dinheiro não compra tempo. respondo, cansada de saber disso de cor. — E não compra um pulmão novo. — Compra uma chance. Ele encurta a distância entre nós. — Tira a máscara, Isabela. Ouvir meu nome daquele jeito arde. A máscara não está realmente no meu rosto, mas ele me olha como se estivesse. Há uma verdade pesada entre nós, feia e inevitável, que paira no ar. — Você quer a Vênus? pergunto, buscando me defender. — Ela não existe aqui. — Eu quero você inteira. Afirmou, sem piscar. — E eu vou ter. A risada que deveria sair de mim simplesmente morre. Inteira? Eu sou apenas uma soma de remendos. Dois enfermeiros aparecem, empurrando uma maca em direção a outra sala. Eu solto a mão de Sera, mesmo que por um segundo, mas esse segundo parece um abismo. Todo o mundo se resume a essa fração de tempo. — Leva sua irmã. A voz da minha mãe ressoa, atravessando os anos e a dor. Sempre retorna. Sempre manda. Eu sigo atrás da maca. Ele me acompanha, como se a noite estivesse seguindo os dois. Se isso é amor, é um amor marcado por feridas e um custo incalculável. Se é obsessão, é do tipo que faz sangrar quem se atreve a encostar. A porta da UTI desliza para o fechamento. Eu permaneço do lado de fora. Ele também. E, pela primeira vez, nos encontramos do mesmo lado em relação a alguma coisa. Quando o ar se esgota, ou escolhemos alguém… ou aprendemos a ficar sozinhas. Eu fiz minha escolha há anos. E agora, vou escolher novamente. ✨ Nota da Autora ✨ Meninas, antes de seguirmos para a história, eu preciso abrir meu coração e explicar um pouco sobre a doença que vai marcar profundamente a vida da Seraphina e, consequentemente, da Isabela. Ela sofre de fibrose pulmonar idiopática. O nome pode parecer distante, mas a realidade é devastadora. Trata-se de uma doença crônica, progressiva e sem cura. Isso significa que, a cada dia que passa, o pulmão dela vai cicatrizando por dentro, como se fosse se enchendo de pequenas feridas invisíveis. Só que, diferente de outras cicatrizes, essas não fecham. Elas endurecem o tecido pulmonar, que deveria ser elástico e cheio de vida, e isso torna cada respiração um verdadeiro campo de batalha. A fibrose pulmonar não pede licença. Ela chega de mansinho, com tosse seca e falta de ar em situações simples, como subir alguns degraus ou até mesmo conversar. E então vai tomando espaço, até que o simples ato de respirar algo que a gente faz sem pensar se torna doloroso, cansativo, quase impossível. O mais cruel? Não existe cura. Os tratamentos disponíveis são caros, inacessíveis para a maioria, e mesmo assim não trazem a promessa de uma vida longa. Servem apenas para retardar o avanço da doença, dar um pouco mais de tempo… e, muitas vezes, esse tempo não é suficiente. Na prática, quando um médico dá o diagnóstico, ele também entrega uma sentença: alguns anos de vida, dependendo de como a doença avança em cada corpo. Em alguns casos, fala-se em três, cinco, ou sete anos. Raramente mais. E a única chance real de esperança é um transplante de pulmão algo que depende de dinheiro, compatibilidade, listas de espera intermináveis e muita sorte. Imagina ouvir isso aos dezenove anos. Imagina ser irmã mais velha e carregar a responsabilidade de segurar o mundo para que a caçula respire mais um dia. Foi essa dor que me inspirou a construir a luta da Isabela. Porque, além do romance proibido, da máscara e do jogo de obsessões, Amores em Segredos é também sobre sobrevivência. Sobre uma mulher que faz o impossível para arrancar da vida aquilo que ela não tem obrigação de dar: tempo. Quis trazer a realidade dessa doença não para entristecer, mas para dar profundidade. Para mostrar que, por trás da dança, dos olhares e do fogo da paixão, existe também uma batalha silenciosa e muitas vezes invisível contra algo que nenhuma mulher deveria enfrentar sozinha. Preparem-se, meninas. Essa história vai doer. Vai apertar. Vai fazer vocês segurarem o fôlego junto com Seraphina e Isabela. E, ainda assim, vai mostrar que, mesmo na escuridão mais cruel, existe sempre uma centelha de amor capaz de nos manter de pé. Com carinho, Val Veiga 💜