Ximena Valverde
Quando minha mãe insistiu que eu fizesse meu casamento na Basília de San Juan Dios, eu achei um exagero fora do tom. Eu queria uma igreja simples e pequena, não essa exuberante, já na fachada decorada com obras de arte barroca e um monumental de entrada flanqueada por colunas salomônicas. Mas a verdade é que agora me sentia uma princesa, que iria encontrar seu príncipe, que a aguardava ansioso no altar. O motorista trajado como tal, abriu a porta e meu pai e eu descemos da limousine alugada. Meu vestido era o mais simples que consegui convencer a minha mãe a comprar, na verdade, mandamos fazer. Não queria anáguas, ficar parecendo um cupcake, mas da extensa grinalda não consegui fugir. Enquanto puxava metros de pano de dentro do veículo, vi meu irmão e minha mãe descerem as escadas à frente da basílica, eles chamaram meu pai em um canto e cochicharam algo não audível para mim. Já com a grinalda enrolada no braço, me aproximei, querendo saber o que eles falavam. — Volta para o carro minha filha. — Nem consegui perguntar, antes que eu pudesse abrir a boca, meu pai exigiu. — Tem que aguardar lá, seu noivo ainda não chegou, está atrasado. — O quê!? — não podia acreditar, eu iria matar o Carlos. Lembrei-me de como na noite anterior, meu noivo me suplicou que não demorasse a chegar na igreja e foi ele quem fez aquele papelão comigo. O motorista iria ter que ligar o ar condicionado da limousine. Optei por me casar de dia, achava mais bonito, o problema era que o calor junto à tensão, poderiam borrar a obra-prima que ficou minha maquiagem. Antes de voltar para o carro, pedi meu telefone para ligar para o Carlos, minha mãe não me deu e disse que eles estavam ligando. Ainda chamou minha atenção com suas crenças tolas, me mandando voltar logo para o carro, pois meu noivo poderia aparecer e me ver de noiva antes de entrar na igreja. A contragosto, eu obedeci e fui vendo o tempo passar. (...) Uma hora e quarenta minutos dentro do carro, não tinha só o motorista da limousine falando que iria ter taxa extra, também tinha eu em pânico, sem entender o que estava acontecendo. Até que o mulherio apareceu na minha frente, minha mãe, sogra e cunhada. — O padre vai cancelar o casamento. — as três mais histérica do que eu, falaram em uníssono. — Sem notícias do Carlos? — elas menearam a cabeça em negativo. — Eu vou matar seu filho, Alma! — Querida, meu Carlinhos vai chegar, ele te ama. O problema é que está tudo congestionado por causa do acidente que teve no viaduto. — Acidente? — Questionei, com os olhos arregalados. — Será que…? — Não pense besteira, minha filha. — minha mãe me confortou. — Esse acidente não tem nada a ver com o Carlos, foi o um helicóptero da empresa que seu pai trabalha e só tinha o piloto dentro e só ele morreu. — Não atingiu nenhum pedestre? — Perguntei, não me conformando com as informações que me foram dadas. — Não, cunhada, foi só o piloto, meu irmão tá bem, preso no engarrafamento. — Então, falaram com ele? — perguntei aflita. — Porque ele não veio com a moto? Ele não ficaria preso. — Estava cada vez mais desesperada. — Não. Carlos estava vindo com a gente no carro, na metade do caminho lembrou que esqueceu as alianças e voltou para buscar. Desceu do carro, pegou o primeiro táxi, na pressa, deixou o telefone comigo. — Roberta, minha cunhada, tentava me explicar. — Bom, filha, o padre não quer esperar. Nós já explicamos a ele sobre o trânsito caótico, mas ele está irredutível. — minha mãe disse. — Ah, mas ele vai me ouvir, vai ter que entender! — falei, movendo os braços para sair do carro. Decidida, desprendi a maior parte da grinalda, deixando apenas a mais curta. — Ximena, o que você vai fazer? Filha, tenha paciência! — Sem dar a mínima para o pedido da minha mãe, subi as escadas até o tapete vermelho, adentrando o lugar santo, que mais parecia um palácio. Meu pai sabia quando eu estava chateada e logo tratou de me seguir, nenhum deles gostaria que eu passasse do ponto com o homem santo em cima do altar bem na frente da imagem de Cristo e da Virgem Maria. — Padre, sei que já falaram do meu problema para o senhor, eu só preciso que tenha um pouco mais de paciência. — Já tive toda paciência, mas daqui a pouco é horário de outro casamento, a outra noiva precisa casar. — E eu não? — questionei afoita. — Claro que tem, desde que tenha um noivo para se casar. O seu não pareceu, aceite isso apenas. O que ele quis dizer com “aceite isso apenas”? — O senhor está me dizendo que meu noivo me abandonou no dia do nosso casamento? — eu praticamente gritei dentro da igreja. — Não sei, mas trânsito não há de ser o problema. Se ele tivesse largado o carro e vindo a pé, já teria chegado, o engarrafamento é aqui perto, no viaduto central. — Padre, perdão, mas o senhor está sendo cruel. — meu pai o chamou a atenção. — Um pouco de realidade faz bem, meu filho, senão, ela ficará aqui na espera de alguém que não vai chegar. E naquele momento, mesmo na frente da imagem de Cristo, perdi o controle. Com a voz embargada, comecei a falar: — O senhor nunca amou e não sabe o sentimento que o Carlos tem por mim. Por isso, trata essa situação com frieza! — Filha, respeite o padre! — minha mãe segurou no meu braço. — Deixa eu falar, mãe! — voltei a minha atenção ao homem de batina. — O senhor escuta o que estou te dizendo, o amor da minha vida me ama, o homem que eu vou passar o resto dos meus dias vai entrar por aquela porta a qualquer momento. E quando meu indicador apontou para porta, a moto estacionou quase dentro da basílica. Ele desceu todo esfarrapado, o terno todo rasgado, o melhor o que sobrou da vestimenta. Seu corpo estava coberto por uma fuligem negra, que só o reconheci por causa do seu olhar da cor do oceano. Todos o olhavam sem entender, ele veio andando a passos lentos pelo tapete vermelho, mancando e com sangue escorrendo do supercílio, nas suas mãos, a caixa de veludo, provavelmente com as alianças dentro. — Você! — foi o que ele disse, visivelmente espantado. — Não acredito. — Não entendo… — me limitei a dizer. Estava confusa, o que se passava ali?