Ximena ValverdeEu sabia que Alejandro queria que fôssemos juntos até o Can Roca, mas preferi ir com meus pais. Não queria tirar o impacto da surpresa. Eu tinha me arrumado especialmente para ele — e queria ver a reação em seus olhos. Cada detalhe da minha aparência tinha sido pensado com carinho: o vestido longo, de tecido leve que acompanhava meus movimentos como uma segunda pele, o penteado com ondas soltas que emolduravam meu rosto, a maquiagem sutil, mas impecável, realçando meus olhos castanhos-escuros. Eu queria que, ao me ver, ele sentisse que todo o esforço, toda a dor que deixamos para trás, haviam valido a pena.Desde o nosso último grande conflito e da perda do Lito, que ainda doía como uma ferida aberta, tínhamos encontrado uma estabilidade preciosa. Cada pequeno gesto, cada olhar cúmplice, cada amanhecer juntos construía algo que eu sentia, com cada batida do meu coração, que seria eterno desta vez.Claro que nem tudo foi paz no caminho até aqui. Mercês tentou se introme
Ximena Valverde A família de Alejandro começou a chegar. Se via todos, menos o senhor Albeniz. Catalina, deslumbrante em um vestido verde-esmeralda, ao lado de um homem que eu nunca tinha visto antes. Mas também não a conhecia, então não tinha como saber o meio em que ela andava. Era um cara loiro de olhos azuis, com cara de modelo de comercial de perfume. Ela veio até Alejandro, trocou dois beijos no rosto e para mim, ela arqueou a sobrancelha como cumprimento. Eu gostava que ela não forçava a barra, o que mostrava que Catalina não era como sua tia.Beto passou direto, típico de um sociopata, veio curtir a festa do irmão, mas nada mais importava, só o seu prazer em estar ali.Já Mercês, essa como sempre, um poço de falsidade, me olhou como se tivesse visto alguém especial e me abraçou como se me quisesse bem. Ela tentou com Alejandro, mas ele não facilitou para ela, assim que Mercês se virou para ele, Alejandro Ignorou e foi na direção de Catalina.— E meu pai? — Alejandro perguntou
Alejandro Albeniz Eu perdi minha mãe com oito anos e certamente esse foi o momento mais doloroso da minha vida. Ela era doce, amorosa, companheira, a melhor mãe que uma criança poderia ter. Quando ela se foi, ficou apenas o meu pai, duro, seco, autoritário e por conta do trabalho, bastante ausente. No entanto, mesmo com todos esses problemas, sabia que ele me amava e sentia orgulho de mim, mesmo nunca dizendo. E eu também, apesar de tudo, o amava.Beto sempre foi estranho, uma pessoa à parte. Nunca o considerei como alguém de fato da minha família, mesmo nós dois compartilhando o mesmo sangue. Com meu pai morto era como se a era Albeniz, a qual eu nasci, tivesse acabado e o único que sobrou fui eu.Me sentia solitário como nunca. Sem ninguém da família a quem eu pudesse recorrer.Estava sentado num batente no jardim do resort, tentando assimilar tudo o que aconteceu, meu pai infartou porque descobriu algo que não conseguiu me contar. Eu sabia que era esse o motivo. Mas a pergunta que
Alejandro AlbenizFrustração.Era estranho como esse sentimento podia se tornar quase um estado de existência. Desde a morte do meu pai, ele se instalou em mim como um visitante indesejado que se recusava a ir embora. O que mais me atormentava não era apenas a dor da perda, mas a consciência tardia de algo que eu deveria ter percebido antes: aquilo não foi natural. Aquilo foi um crime.Quando pedi ao gerente do Can Roca que fechasse os portões do resort e não deixasse ninguém sair, metade dos convidados já havia ido embora. Muita gente importante, muitos desconhecidos também, e principalmente, o Pavel. Sim, ele. Sumiu, evaporou como fumaça.A taça de vinho que meu pai segurava... desaparecida. Sumiu como se nunca tivesse existido. Era tudo muito suspeito. Tudo me levava a pensar que foi algo planejado, e muito bem planejado. A polícia, ao menos, agiu com rapidez. Recolheu os HDs com as gravações das câmeras espalhadas pelo resort. Talvez ali houvesse alguma resposta.Conversei com o
Ximena ValverdeQuando minha mãe insistiu que eu fizesse meu casamento na Basília de San Juan Dios, eu achei um exagero fora do tom. Eu queria uma igreja simples e pequena, não essa exuberante, já na fachada decorada com obras de arte barroca e um monumental de entrada flanqueada por colunas salomônicas. Mas a verdade é que agora me sentia uma princesa, que iria encontrar seu príncipe, que a aguardava ansioso no altar.O motorista trajado como tal, abriu a porta e meu pai e eu descemos da limousine alugada. Meu vestido era o mais simples que consegui convencer a minha mãe a comprar, na verdade, mandamos fazer. Não queria anáguas, ficar parecendo um cupcake, mas da extensa grinalda não consegui fugir. Enquanto puxava metros de pano de dentro do veículo, vi meu irmão e minha mãe descerem as escadas à frente da basílica, eles chamaram meu pai em um canto e cochicharam algo não audível para mim.Já com a grinalda enrolada no braço, me aproximei, querendo saber o que eles falavam. — Volta
ALGUNS DIAS ANTES Alejandro Albeniz Assumir a empresa aérea foi algo que sempre almejei. As exigências do meu pai é que tardaram minha volta à Espanha, mais precisamente à Granada. O senhor Albeniz, como quase todas as pessoas desse país, tinha valores arcaicos, acreditavam fielmente que um homem de sucesso e sério tinha que ter consigo, bem ao seu lado, uma “primeira dama”. Apesar de amar o lugar onde nasci, eu estudei na América e passei boa parte da minha vida por lá, me preparando para assumir o Império Albeniz. Não que aqui eu não conseguiria o preparo necessário para administrar Granafly, o problema é que não queria apenas entender da burocracia, fui atrás das especializações e evolução necessária do nosso produto e serviço, por isso fiz todos os cursos que achei necessário, na Boeing. Na reta final da minha preparação, vim para a Europa, mas não para a Espanha, meu destino foi a França e lá também me dediquei às especializações oferecidas pela poderosa Airbus. E foi na Fr
Ximena Valverde Minha mãe e suas ideias, por mim eu preferia ir em lojas de alugueis de roupa, encontrar o vestido do meu gosto. Ela e suas crenças de que a roupa que eu alugasse poderia ter estigmas ruins de outras pessoas e meu casamento desandar. O bom de fazer com uma costureira, é que tudo saiu como eu queria, até os tecidos pude escolher. Estava na última prova, ao me olhar no espelho, me vi linda. Meu casamento seria um sonho. Daqui a dois dias seria a mulher mais feliz do mundo, ia casar com o homem da minha vida.— Filha, tá parecendo uma princesa! — minha mãe falou com lágrimas nos olhos.— Mãe, para de chorar e pega um pouquinho desse café pra mim. — apontei para a garrafa em cima do bufê na sala de costura.Sem demora, minha mãe pegou o copinho descartável e pôs a dose do líquido fumegante para mim.A costureira, que voltava de outro cômodo, tentou prevenir um acidente, mas o efeito foi o contrário.— Não faça isso, não dê café a ela usando o vestido branco! — Ela gritou.
Alejandro Albeniz O que estava se passando comigo? Acabei de praticamente jogar praga no casamento da mulher mais linda que eu já vi na minha vida. A sorte é que ela não me levou a sério, eu mesmo não estava me entendendo. Fiquei entorpecido pela eletricidade passando por todo o meu corpo, fazendo o meu coração disparar. Ele batia tão rápido, que parecia que daria um salto do meu peito. Sempre quando ficava louco por uma mulher, era uma outra parte do meu corpo que latejava, nunca o peito. Quando a vi seguir com a mãe, tive vontade de ir atrás dela, de falar novamente para ela não se casar. Como se ela devesse se casar comigo, como tivesse sido feita para mim. Eu com certeza não estava bem e olha que pelo café da manhã foi apenas um suco de laranja, não foi um hi-fi. Pensando no estresse desnecessário que o senhor Albeniz tentou me causar essa manhã, seria até aceitável eu batizar o suco, mas não fiz. Meu corpo estava sóbrio, mas minha mente ficou inebriada de um sentimento