Meus pés doem. Minhas costas também. Mas ainda não decidi o que dói mais: o corpo ou a cabeça.
Depois de três plantões seguidos e uma emergência atrás da outra, consigo tirar uns minutos pra respirar. Tecnicamente, é minha “hora de almoço”, mas residentes não têm isso. Temos espaços roubados entre cirurgias, exames e a exaustão.
Estou indo em direção à máquina de café quando vejo Murilo parado na entrada do refeitório.
Meu corpo enrijece no mesmo instante.
Ele me vê e força um sorriso contido. Está com a jaqueta sobre o braço e dois copos de café na mão.
Aproxima-se com calma, como quem sabe que o terreno ainda é instável.
— Trouxe café — diz, estendendo um dos copos.
Aceito, por educação. Não por ele. O silêncio entre nós pesa mais que o calor do líquido. Ele aponta com a cabeça para uma das mesas vazias e nos sentamos.
Olho ao redor antes. É um gesto automático.
Eu estou procurando alguém.
Mas não posso admitir.
Nem pra mim mesma.
Murilo percebe. Claro que percebe. Mas não diz n