Capítulo 5

CAMILA

Eu tinha acabado de sair da mansão de Leonardo, o motorista tinha acabado de cruzar os portões quando senti o celular vibrar.

Era uma notificação bancária.

Um valor alto tinha sido depositado na minha conta. Maior do que eu já tinha visto alguma vez, mais do que alguns meses de salário no restaurante. Leonardo tinha cumprido a primeira parte do nosso acordo.

Eu não senti alívio. Alívio é para quem tem tempo.

Pedi ao motorista para me deixar numa esquina antes da pensão. Precisava fazer algo importante. Eu sabia exatamente onde encontrar eles. Sempre estavam no mesmo lugar.

A rua era estreita, com paredes grafitadas e um terreno baldio ao lado. Um canto esquecido da cidade, onde problemas não chamam atenção e ninguém faz perguntas.

Um deles sorriu ao me ver.

— Até que enfim — disse.

Eu não parei para respirar.

— Aqui — falei enquanto jogava a bolsa com o dinheiro aos pés do chefão.

O homem se abaixou, abriu a bolsa e contou o dinheiro ali mesmo, diante de mim, sem pressa, sem vergonha.

— Não é tudo. — ele disse.

— Eu sei. É a primeira parte.

Ele guardou o envelope no bolso da jaqueta.

— Você está atrasada.

— E agora não estou mais — respondi.

Ele inclinou a cabeça como quem considera me explicar o mundo.

— O problema do seu irmão cresceu. Quando alguém foge da dívida, ela não congela. Ela aumenta.

Eu o encarei.

— Eu preciso de mais um tempo para conseguir a segunda metade.

O silêncio ficou tenso.

Até que ele deu um passo para trás.

— Está bem — disse. — Duas semanas.

— Três semanas. Você sabe que não é fácil conseguir tanto dinheiro tão rápido.

— Fechado. Não nos faça ir atrás de vocês de novo, Camila.

— Não precisam — respondi.

Eu me virei e fui embora.

Quando cheguei na pensão, subi correndo as escadas do prédio. Ao abrir a porta do quarto, dei uma olhada ao redor como se estivesse vendo pela primeira vez. O quarto pareceu menor do que de costume.

Eu coloquei a mochila na cama e comecei a guardar minhas coisas. Não havia muito para guardar: três calças, quatro blusas, o casaco surrado, dois pares de sapatos, escova de cabelo, uma necessaire com escova de dente e alguns itens básicos de maquiagem e meus documentos.

Era isso.

Todo o resto do que eu já tive um dia já tinha desaparecido ao longo de outras guerras que ninguém viu. Fechei o zíper. Aquele som pareceu um ponto final ou talvez o início de alguma coisa que ainda não tinha nome.

Quando, finalmente, deitei na cama, sentia o corpo cansado. Fiz uma oração rápida, pedindo a Deus que guardasse a vida do meu irmão e que abençoasse a decisão que tinha tomado. O corpo apagou antes que a mente pudesse resistir.

Acordei ao ouvir os passos do inquilino de cima, o cheiro de café já começava a tomar conta do prédio, a luz fraca entrava pelo furo da cortina.

Peguei o celular de cima da mesinha de cabeceira pronta para mandar uma mensagem para Leonardo, mas por um segundo, minha mão parou no ar. Eu não tinha mais espaço para hesitação.

"Já estou pronta."

A resposta veio rápido:

"Envio o motorista em 30 minutos."

Eu respirei fundo, então levantei e fui ao banheiro para me aprontar. Quando já estava mais apresentável, peguei a mochila e desci. Na recepção, acertei os aluguéis atrasado e avisei que estava liberando o quarto.

O carro preto estacionou na frente da pensão e eu entrei sem dizer nada. O motorista também não falou, então o caminho foi silencioso. Pela janela, fiquei observando a cidade se afastar, como se eu estivesse sendo arrancada dela ou finalmente me soltando do que me prendia.

Quando o portão da mansão abriu, Leonardo já estava do lado de fora, ao pé da escadaria. O motorista deu a volta no chafariz e quando estacionou, saiu para abrir a porta para mim. Eu desci com a mochila no ombro.

Eu vi o momento exato em que Leonardo percebeu que não havia malas.

Não foi surpresa exagerada, foi algo mais discreto, um arqueamento mínimo das sobrancelhas, uma respiração prendida por meio segundo.

— Só isso? — Ele perguntou.

— É tudo que eu tenho — respondi.

Ele assentiu, não com condescendência, mas com entendimento.

— Vou te levar ao quarto que foi preparado para você.

Seguimos pelos corredores silenciosos, até parar em frente a uma porta branca. Logo que ele abriu a porta, vi o quão grande era o quarto, bem iluminado, frio de tão perfeito.

— Depois que se instalar, quero te apresentar a minha avó.

— Tudo bem.

Ele já ia saindo quando de repente parou e se virou em minha direção novamente.

— Aqui está o seu cartão de crédito ilimitado.

Diante da minha surpresa, ele continuou:

— Está vinculado a uma conta exclusiva para as necessidades relacionadas ao acordo — explicou. — Alimentação, cuidado pessoal, roupas... Você não tem que pedir autorização para usá-lo, nem precisa justificar as compras do dia a dia.

— Está bem — respondi.

— O quarto e o closet estão vazios. — Ele acrescentou. — Se quiser ir hoje comprar o que precisar, só pedir ao seu motorista.

Deixei a mochila sobre a cama e permaneci de pé no centro do quarto por alguns segundos, só observando tudo ali. A cama era grande o suficiente para eu me perder nela.

Passei a mão sobre a colcha. Era macia, daquela maciez que eu nunca tive em nenhum lugar onde morei. Tive medo de amassar, então soltei antes de afundar muito o tecido com a palma.

Era grande demais, claro demais, novo demais. Não era lar, mas também não era uma ameaça.

Havia uma escrivaninha perto da janela com um arranjo de orquídeas brancas, bem cuidadas, elegantes, vivas demais para aquele espaço controlado. Havia também um porta-retratos vazio, propositalmente vazio, como se estivesse esperando algo. Uma foto. Uma história. Uma prova de que alguém mora ali.

Comecei a guardar as poucas peças naquele closet enorme, onde elas ficaram quase invisíveis entre tanto espaço vazio. Quando terminei, fui para o banheiro. As paredes eram brancas, o mármore claro, a pia larga demais para ser prática. Abri a torneira. A água quente veio imediatamente, sem esforço.

Lavei o rosto, devagar. A água quente escorrendo pelas mãos foi a primeira sensação real que tive desde que acordei.

Respirei fundo e encarei meu reflexo no espelho. Aquela Camila parecia tranquila, mas meus olhos denunciavam tudo. Segurei a beirada da pia, firme.

— É por ele — sussurrei para mim mesma.

E no fundo da minha mente, uma única frase: agora eu tenho tempo para salvar o meu irmão. Só isso importava.

Minha barriga roncou me lembrando que eu não tinha comido nada no café da manhã. 

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