Capitulo 6

Lavínia acorda com a voz de Allister sussurrando algo para alguém. Ela olha em volta, com os olhos ainda embaçados pelo sono, e vê a silhueta de um homem mais alto que Allister. Esse homem usa um sobretudo preto e esconde o rosto sob um chapéu também preto.

A presença dele deixa Lavínia curiosa, fazendo-a despertar totalmente. Ela desvia o olhar e tenta se sentar para ver o que está acontecendo, mas assim que olha novamente, ele já não está mais no quarto e Allister está fechando a porta atrás dele.

- Bom dia!

Ele diz de forma seca, mas antes que ela possa responder ou entender o que está acontecendo, sua mãe chega.

- Bom dia!

Maria cumprimenta os dois, que respondem com um resmungo.

- Posso saber o que aconteceu? _ Ela pergunta, desconfiada da atitude deles.

- Comigo, nada. Eu apenas acabei de acordar. _ Lavínia responde enquanto tenta arrumar os cabelos, presos em uma trança.

- Eu recebi notícias ruins do trabalho, nada demais. Depois eu me preocupo com isso. O médico saiu daqui agora há pouco, já me entregou os papéis. Você está liberada, Lavínia.

Ela encara a mãe, que dá de ombros e larga duas bolsas na cama de acompanhante.

- Já que você decidiu que vai com Allister em vez de ficar com tua família, eu trouxe algumas roupas e calçados. Tem também roupa íntima, toalhas e meias.

- Obrigada, mãe. Eu sabia que a senhora iria entender... Mas cadê papai?

- Está lá no estacionamento, esperando você descer pra te dar um abraço.

Lavínia sorri. Seu pai tem trauma de hospital desde que viu o pai dele ser praticamente torturado no tratamento contra um câncer de garganta. Eles entraram com processo contra o hospital assim que o avô de Lavínia faleceu. Ela era muito pequena ainda, mas lembra bem de alguns detalhes.

Eles ganharam o processo e, com o dinheiro, compraram a casa onde vivem, mas seu pai nunca mais conseguiu ficar em um hospital por mais de meia hora. Ele se mantém longe de qualquer coisa que lembre uma sala médica, indo apenas quando é um caso de vida ou morte.

- Só pra te avisar, seu pai ficou com você nos primeiros momentos depois da primeira e da segunda cirurgia. Dizia que só sairia daqui quando soubesse que você estava totalmente fora de perigo.

- Ele ficou chateado por eu querer ir com Allister?

- Você conhece teu pai. É um homem pacífico e que faz todas as tuas vontades. Ele, assim como eu, não entendeu o motivo de você querer ir, mas me fez lembrar que você sabe o que faz e que nunca nos deu qualquer tipo de problema. Como ele disse, podemos confiar em você, porque fomos nós quem te criamos!

Lavínia sente os olhos marejados e, tentando disfarçar as lágrimas, sorri.

- Com licença... Vim ajudar a senhorita Lavínia...

Uma enfermeira aparece na porta, interrompendo o momento entre mãe e filha.

- Não precisa, obrigada. Tem duas pessoas aqui pra ajudar, três seriam demais. _ Allister responde de forma seca, fazendo Maria olhar pra ele de forma dura.

- Muito obrigada, moça, mas a gente consegue se virar aqui. Qualquer coisa eu te chamo. _ Maria diz com um sorriso no rosto e a voz doce, tentando reverter o mal-estar causado pela forma como Allister falou.

- Ok, então. Boa recuperação, senhorita Lavínia. Espero não te ver aqui tão cedo!

- Obrigada! _ Lavínia responde, confusa. Ela tem certeza de que não viu essa enfermeira em nenhum momento. Ela olha para Allister, que a encara como se quisesse dizer alguma coisa.

Assim que a enfermeira sai, Allister pega Lavínia nos braços e a põe na cadeira de rodas. Maria a leva até o banheiro para se lavar e, quando voltam, todas as suas coisas já estão arrumadas.

- Vamos? _ Allister pergunta, nitidamente impaciente com a demora dela.

- Vamos... _ Maria responde de forma seca. Lavínia sente que alguma coisa muito séria aconteceu, mas não faz ideia do que seja e agora não é o momento certo para perguntar.

Enquanto passam pelos corredores do hospital particular, Lavínia tem certeza de ver sombras espreitando pelos cantos escuros. Allister se mantém atrás delas o tempo todo, com a expressão séria e preocupada, mas ao mesmo tempo atento a tudo.

Quando chegam ao estacionamento, Lavínia vê seu pai e seu irmão em frente ao carro da família. Eles correm até ela; seu pai lhe dá um abraço caloroso e, quando a solta, Lavínia vê os olhos dele marejados de lágrimas.

- Pai, está tudo bem? _ pergunta, preocupada.

- Eu é que pergunto. Você está bem? Como se sente? Está com dor?

- Ah, pai, olha pra ela, é claro que ela não está bem. Não conseguiram consertar essa cara feia que ela tem... _ seu irmão fala, fazendo Allister soltar um riso abafado.

- Nossa, tô morrendo de rir, Alan... _ ela responde e j**a nele um paninho que estava enrolado em sua mão.

- Filha, você tem certeza que é isso que quer? _ Carlos pergunta, encarando Allister.

- Sim, pai. Pelo menos por alguns dias eu quero ficar na fazenda. Preciso, pelo menos, tentar voltar à minha vida normal.

- Então tá bom. Você sabe que pode ligar pro pai quando precisar, não é mesmo? Sabe que pode voltar pra casa quando bem entender, não sabe?

- Eu sei, pai. Fica tranquilo, eu vou ficar bem, sei que serei bem cuidada pelo senhor Allister.

Carlos olha para Allister novamente; os dois se encaram em silêncio por alguns segundos, até que Allister sorri. Um sorriso leve, mas que ilumina seu rosto e quebra a tensão entre os dois.

- Eu prometo cuidar bem de Lavínia, senhor Carlos. Tem minha palavra.

- Por que você insiste tanto em levar minha filha novamente até aquele lugar?

- Porque me sinto responsável pelo que aconteceu. Eu fiz ela usar aqueles saltos, aquela roupa, e ficar até tarde trabalhando. Quero recompensá-la pelo esforço e por todo o transtorno que causei. Só assim ficarei em paz com minha consciência.

Carlos parece satisfeito com as palavras de Allister e então sorri.

- Irei ver minha filha uma vez por semana, e se eu ver sinal de qualquer coisa errada, ela volta comigo, mesmo contra a vontade dela. Entendeu?

- Entendi, senhor Carlos. As portas da minha casa estão abertas para vocês. E quando ela quiser voltar, ligarei para o senhor e eu mesmo a deixarei em casa, em segurança. Combinado?

Allister estende a mão e Carlos aceita o acordo. Lavínia respira aliviada.

- Vão com a gente pra fazenda, mãe? _ Lavínia pergunta, torcendo para que eles digam não.

- Não podemos, meu bem. Mas depois de amanhã estaremos lá. Vamos passar o dia com você, tá bom?

Lavínia concorda, aliviada.

- Então nós vamos indo. Boa recuperação, filha. Logo vamos te visitar, tá bom? _ Carlos fala, e a família se despede.

Allister leva Lavínia até o carro, ajeita suas coisas no porta-malas e, quando entra, fica em silêncio por alguns segundos, sem girar a chave, sem olhar para Lavínia, apenas observando tudo à sua volta.

- Aconteceu alguma coisa, Allister? _ ela pergunta.

Ele a encara.

- Sim. Aquela enfermeira não é uma enfermeira. É uma enviada do nosso clã, e ela está nos observando nesse exato momento.

Lavínia sente um calafrio percorrer seu corpo.

- Não se preocupe, ela não vai fazer nada. Estamos à luz do dia e em público. Ela não veio pra te atacar, veio pra observar e passar informações.

- Como você sabe disso?

Ele levanta uma sobrancelha, nitidamente confuso com a pergunta.

- Às vezes você não parece tão inteligente... Se eu não te conhecesse bem, diria que é até bem burrinha...

Lavínia sente o rosto arder de raiva. Ela levanta a mão para acertar um tapa no rosto de Allister, mas ele é mais rápido.

- Nunca mais tente fazer isso, ou eu vou esquecer que é minha protegida... _ ele diz com o rosto tão próximo que ela consegue sentir o hálito de menta e cravo invadindo suas narinas.

- Me ofenda novamente e eu derrubo você e seu império. Entendeu? _ ela responde sem se deixar intimidar.

Ele levanta uma sobrancelha, curioso com o que acabou de ouvir, e então solta o braço de Lavínia, rindo alto, o que a deixa ainda mais irritada.

- Pois muito bem... me diga, como pretende fazer isso?

- Posso te mostrar agora, se quiser... _ Lavínia diz, soltando o cinto e abrindo a porta.

Allister fica sério assim que vê a porta aberta.

- O que você pensa que está fazendo?

- Acho que você esqueceu que está em minhas mãos, senhor Allister!

- Do que é que você está falando? _ ele pergunta, com a voz parecendo um rosnado.

- Eu sofri um acidente na sua casa. Vim para um hospital que você tem convênio. Você não saiu do meu lado um dia sequer e quase me obrigou a ir pra sua fazenda, o mesmo lugar do “acidente”...

- Não estou te obrigando. Você está indo por livre e espontânea vontade porque sabe que é o único lugar seguro pra você agora...

- Sei mesmo? Será que é isso mesmo? Será que as pessoas vão acreditar nisso?

Allister entende o jogo de Lavínia, e seu rosto vira uma máscara de deboche e escárnio.

- E você acha mesmo que vão acreditar em você? É só eu dizer que você fez isso tudo pra me obrigar a ficar contigo e todo mundo vai acreditar. Além do mais, eu sou um bilionário conhecido e respeitado e você, uma pobretona que ninguém nunca ouviu falar. O máximo que você vai conseguir é dar uma leve arranhada na minha reputação, coisa que logo desaparece e...

Lavínia não espera ele terminar. Abre a porta ao máximo e se j**a no chão, se arrastando para longe do carro e gritando por socorro.

Allister fica paralisado por alguns segundos, sem acreditar no que está vendo, e então sai do carro e vai em direção a Lavínia, que continua a gritar e se arrastar para fora do estacionamento.

- Para com isso! O que está fazendo, sua maluca?! _ Allister pergunta, pegando Lavínia pelo braço e tentando levantá-la do chão, mas ela consegue escapar e continua gritando.

Allister entra em pânico quando vê um carro se aproximando e, com rapidez, a pega pela cintura e a j**a sobre o ombro. Mas Lavínia não desiste, vai mostrar pra ele que ele deve respeitá-la ou pagar o preço.

Ela continua se debatendo enquanto Allister a leva para o carro, mas antes que ele chegue, ela faz força e escorrega pelo ombro dele, caindo no chão.

Na queda, ela b**e o pé quebradoe a dor que sente é tão intensa que não consegue gritar, apenas vira para o lado e vomita, desmaiando logo em seguida.

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