Capítulo 3
THIAGO (TH) – NARRANDO Eu já tava no meu barraco, de boa, pronto pra descansar, quando um vapor me chamou no radinho, com a voz aflita: — Chefe, o Terror tá quebrando tudo lá na casa dele, mano… matou dois vapores da segurança agora pouco. Levantei na hora. O Terror já era explosivo, mas matar dois dos seus próprios vapor? Alguma merda muito séria tinha acontecido. Subi o morro o mais rápido que pude. Cheguei na frente da casa dele e a cena parecia um filme de guerra: os dois corpos no chão, sangue escorrendo na calçada, a porta arregaçada e ele ali no meio da loucura, com a arma na mão e o olho virado. — Tá maluco, Terror?! Que porra é essa, mano?! — falei, já puxando a arma da mão dele. — Eu vou matar todo mundo! Como é que eles deixaram ela fugir?! Tô te falando, mano… alguém ajudou! Não tem como ela ter saído sozinha! — ele gritava, fora de si, cuspindo raiva. — Quem, caralho?! Quem fugiu, mano?! Não tô entendendo nada! — Minha mina. A Gabriela. Ela sumiu! Bota geral atrás dela. Vira esse morro do avesso! Ela não pode ter saído do morro, e se saiu, tem que voltar sem nenhum arranhão, tá me ouvindo?! — ele me encarou com os olhos injetados, como se eu fosse o responsável pela merda toda. — Demorô. Eu mesmo vou cuidar disso. Mas nem sei quem é essa mina, porra… Como é que eu vou saber se achar ela? Ele respirou fundo, puxou o celular do bolso e me mostrou a foto. Mano… a mina era surreal. Linda. Olhar doce, cara de asfalto. Modelo mesmo. Zero cara de quebrada. — Eu vou lá na contenção ver nas câmeras se ela saiu pela principal. Tu pega uns vapor e vasculha o mato. Se ela fugiu, foi por lá. Mas olha no meu olho: sem nenhum arranhão. — Já é — respondi, e saí na missão. Já mandei mensagem geral no rádio e botei a quebrada pra trabalhar. Chamei o Franjinha, vapor antigo que é liso, esperto, e fomos em direção ao matagal. Mas minha cabeça já tava no modo alerta. Por que essa mina fugiria dele? — E aí, Franjinha… tu sabe o que tá pegando de verdade? — perguntei, encarando ele de lado. — Sei não, chefe — respondeu rápido, mas com o olhar desconfiado. Tava mentindo. Ou escondendo. — Qual é, mano… tu tá aqui desde muleque. Tu sabe alguma coisa. O que tá pegando com o Terror e essa mina que ninguém nunca viu? Ele olhou pro chão, respirou fundo e depois soltou: — Olha, patrão… eu não sou de fofoca, mas ninguém aqui entende o que rola. A mina, Gabriela, começou a namorar ele quando ele ainda era vapor. Trabalhava no asfalto, fazia foto, campanha de loja, essas paradas. Morava com a vó, uma senhora mó querida pela quebrada. Depois que ela morreu, a mina sumiu. O Terror comprou aquela casa lá no topo e trancou ela lá dentro. Meteu seis vapor na segurança e pronto. Ninguém entra. Nem pra limpar. Nem pra entregar comida. Nem os cara da contenção sobem mais lá. Parece prisão, chefe. Fiquei em silêncio por uns segundos. O sangue gelou no corpo. — Se for isso mesmo… se ele tá mantendo ela presa... isso não é certo. Tu sabe que tem coisa que não se faz, nem aqui. — Mas quem vai ser o louco pra questionar ele? O cara é o dono do morro, faz o que quer. Eu não respondi. Só continuei andando, com a mão no rádio e a cabeça fervendo. Se for verdade… vai ter que dar ruim. Porque eu não vou compactuar com isso. Mais à frente, a gente se separou. Ele foi por um lado do mato, e eu por outro. Com a foto da Gabriela salva no meu celular e o coração pesado no peito, eu segui no breu, jurando pra mim mesmo que, se achasse ela… ninguém ia encostar um dedo. Mano Quando eu vi aquele cachorro avançando nela, atirei sem pensar. Nem sei explicar o que senti, só sabia que eu precisava proteger aquela mina. E quando ela encostou em mim lá no rio… porra. Foi foda. Linda demais. Corpo macio, jeito frágil. Como é que um cara tem uma princesa dessas em casa e prefere comer as piranhas da boca? Fiquei ali, com o corpo dela colado no meu, e juro… precisei me segurar pra não fazer besteira. Tô ficando doido. Ela é mulher do meu chefe. Do cara que me tirou da cadeia. Eu não podia nem olhar pra ela. Conseguimos sair do mato. Chamei um vapor e levei ela direto pro postinho. Chegando lá, ela foi atendida. Fiquei na recepção esperando, e aí resolvi ligar pro Terror. 📱 — Fala aí, maluco. Onde tu se meteu?! — ele atendeu alterado. — Tô com a tua mina aqui no postinho. — O que aconteceu com ela, porra? — Virou o pé. Tá inchado, sentindo dor. — Já tô colando aí. Desliguei. A enfermeira disse que eu podia entrar. Fui até o quarto. Ela tava com soro na veia, pé enfaixado, e me olhou preocupada. — Tu contou pra ele que eu tô aqui? — Contei. Ele já tá vindo. Ela baixou o olhar, tensa. E nesse momento a porta abriu com força. Terror entrou bufando. — Onde tu se meteu, Gabriela? Tá maluca, porra?! Ela começou a chorar. Eu entrei na frente. — Calma, mano. Eu sei que vocês têm que conversar, mas pega leve. Tu tá na cara que tá doidão. A gente quase foi pego pelos soldados do Coiote. Eu preciso trocar uma ideia contigo lá fora. — Bora. E tu… não sai daqui sem mim. — ele apontou pra Gabriela, que nem olhou na cara dele. Saí com ele e contei tudo que ouvimos no mato. A conversa do Coiote. A ameaça de invasão. E o pior: tem um X9 no nosso morro. Agora, além de proteger essa mina, eu tenho que descobrir quem tá passando informação pro inimigo.