Capítulo 2

Cheguei no local, mas meus olhos não estavam preparados para o que veriam a seguir.

A sala parecia que tinha passado por um furacão — ou por uma guerra civil entre bonecas e almofadas. Tapetes enrolados no canto, livros rasgados, brinquedos espalhados como se tivessem sido jogados por uma catapulta, e uma cadeira virada de cabeça para baixo no meio do caminho. Havia até um pote de iogurte esvaziado no sofá, manchando o tecido caríssimo com aquela baba branca que já começava a secar.

— É… — Regina pigarreou, com um sorriso tenso. — A Sophia andou um pouco agitada hoje.

— Um pouco? — sussurrei, olhando para o teto, como se pedisse socorro divino.

— Ela está lá no quarto — apontou com o queixo, como quem não quer se aproximar mais do que já está. — Tente falar com carinho, mas seja firme. Ela responde bem com firmeza. Só não grite, por favor. O Sr. Arthur odeia gritos dentro de casa.

— Entendi — falei, engolindo seco.

Respirei fundo, rezei um Pai Nosso mental e entrei no corredor que levava ao quarto da menina. A porta estava entreaberta, e de dentro vinha um som alto de música infantil misturado com batidas ritmadas de pés no chão e gritos de “não! não! não!”.

Empurrei a porta devagar.

— Oi, Sophia? — chamei, com a voz mais doce que consegui forjar.

No meio do quarto, em cima da cama, havia uma menininha de cabelos cacheados e olhos verdes, lindíssima, de fato, mas com a cara mais emburrada que eu já vi na vida. Tinha um travesseiro na mão, e no segundo em que me viu, jogou direto na minha cara.

— Vai embora! Eu não quero outra babá! — berrou, com uma voz aguda que parecia furar o tímpano.

O travesseiro bateu no meu ombro e caiu no chão. Respirei fundo de novo.

— Tudo bem, eu entendo que você está com raiva — falei, me aproximando. — Mas eu vim para te ajudar, não para atrapalhar.

— Mentira! Todas mentem! — ela gritou, jogando um ursinho de pelúcia agora. — A última disse que ia me levar no parque e nunca mais apareceu! Você também vai sumir!

Meu coração apertou. Ela não era malvada, mas estava ferida.

— Eu não vou sumir — respondi, ajoelhando-me perto da cama, sem encostar nela ainda. — Pelo menos não sem te levar no parque primeiro, tá bom?

Ela me olhou com desconfiança, os olhinhos marejados, mas a boca ainda emburrada. Ficou em silêncio por dois segundos e então, de repente, gritou de novo e se jogou de barriga na cama, escondendo o rosto no colchão.

Respirei. Tá, Mauren. Você aguenta. Você precisa dessa casa. Você precisa desse emprego. E essa menina só quer alguém que fique e dê atenção.

Fui recolhendo os brinquedos espalhados, arrumando o que dava, quando ouvi passos firmes no corredor. Passos que soavam como se o dono do mundo estivesse voltando pra casa.

A porta se abriu sem bater.

— Regina disse que a nova babá já chegou — uma voz grave, familiar demais, me fez congelar no meio do gesto de pegar um sapatinho de boneca.

Levantei os olhos.

E lá estava ele. Sem sombra de dúvidas ele era o homem do shopping, aquele grosso de terno e dono do perfume inebriante. 

Só que agora, em vez de estar impaciente no meio de um desfile, estava parado na porta do quarto da filha, com os olhos cansados, mas atentos. E, pior, ele me reconheceu na mesma hora.

Seus olhos se estreitaram. Um músculo no maxilar saltou. Ele cruzou os braços.

— Você. — A palavra veio como uma flecha no meu coração acelerado. 

Minha boca ficou seca. Meu coração bateu tão forte que achei que ia sair pela garganta.

— Eu… eu… — gaguejei, incapaz de formar uma frase inteira.

— Você esbarrou em mim no shopping, caiu no chão como se tivesse levado um tiro, e agora… — ele deu um passo à frente — está na minha casa, mexendo nos brinquedos da minha filha?

Sophia, que estava de cara enterrada no colchão, levantou a cabeça num pulo.

— Papai! — gritou, e correu para ele, pendurando-se na perna dele como se fosse seu único porto seguro no mundo.

Arthur a pegou no colo com uma suavidade que não combinava em nada com o tom áspero que usara comigo. Beijou a testa dela.

— Está tudo bem, minha flor. Papai está aqui.

Depois, olhou pra mim de novo. E dessa vez, com um misto de desconfiança e algo que eu não soube identificar.

— Regina não me disse que a candidata era você.

— Desculpe. Eu não sabia que o senhor era… — minha voz saiu fina, quase um sussurro.

— O CEO? — ele completou, com um meio sorriso irônico. — Pois é. Surpresa.

Sophia, do colo dele, me encarou com curiosidade.

— Papai, ela é a nova babá que não vai sumir?

Ele hesitou. Olhou pra mim e eu segurei a respiração.

— Vamos ver — respondeu, sem tirar os olhos de mim. — Vamos ver se ela dura mais que um dia.

E saiu do quarto, deixando eu e Sophia sozinhas — e meu futuro pendurado num fio mais fino que linha de pipa.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP