NARRADO POR CAIO VALENÇA
Cobertura — Madrugada
O telefone tocou.
Eu atendi no viva-voz, largado no sofá, com uma garrafa quase vazia na mão.
A voz era seca, formal.
— “Senhor Valença? Aqui é o síndico. Precisamos conversar sobre sua permanência no apartamento.”
Revirei os olhos.
— “Fala logo.”
— “O contrato de cessão da cobertura expirou. A Ferraz Holdings já informou que não vai renovar o direito de uso. Precisamos que desocupe até o fim da semana.”
Soltei uma risada amarga.
— “É mesmo, né…” — murmurei, olhando pro teto. — “Até o teto não é mais meu…”
A voz insistiu:
— “Senhor, por favor… entendemos a situação, mas—”
— “Foda-se o que vocês entendem.” — desliguei.
Joguei o celular no chão.
Tomei mais um gole da garrafa.
O álcool queimava, mas não mais que o peito.
Sozinho.
Sem empresa.
Sem Bianca.
Sem família.
Sem nada.
— “Filho da puta…” — murmurei, encarando a TV desligada. — “Tu me arrancou tudo, Dante. Me arrancou ela. Me arrancou o nome. Me arrancou o mundo