Presença na Sombra

A lua já estava alta quando decidi caminhar pela floresta.

O frio da noite invadia minha pele, mas eu mal sentia.

Não era apenas a temperatura que me deixava inquieta — era algo mais profundo, algo que vibrava na própria essência da minha loba.

Desde a rejeição de Enzo, minha vida havia se tornado um constante alerta, mas naquela noite, algo mudou.

Uma sensação estranha se espalhava pelo ar, como se a própria floresta estivesse viva e me observando.

Respirei fundo, tentando me concentrar no cheiro da terra molhada e das folhas caídas.

Tudo estava ali, familiar, seguro. Mas havia um outro aroma misturado, algo que eu não reconhecia, que não pertencia à minha alcateia, nem à floresta.

Era forte. Intenso. Inconfundível.

O corpo todo tremeu.

A loba dentro de mim estremeceu, como se uma corrente elétrica percorresse cada músculo, cada osso, cada célula.

Meu coração disparou, e a respiração se acelerou.

O instinto me dizia para fugir, para me esconder.

Mas havia outra sensação — uma atração misteriosa, perigosa e hipnótica.

Algo que me dizia: “Você precisa sentir. Você precisa saber.”

E, mesmo sem entender, obedeci.

Continuei avançando pela trilha entre árvores antigas e grossas.

O vento carregava o aroma novamente, mais intenso do que antes.

Parecia tocar minha mente antes mesmo de atingir meu olfato.

Meu corpo inteiro reagiu: o pelo se eriçou, a pele ficou sensível, cada músculo se tensionou.

A loba rugiu baixo dentro de mim, alerta e desconfiada, mas curiosa ao mesmo tempo.

Era como se algo estivesse desafiando minha presença, testando meus limites, jogando comigo um jogo silencioso.

Fiquei parada, os olhos atentos a qualquer movimento.

— Quem está aí? — sussurrei, tentando parecer firme. — Mostre-se!

O vento respondeu.

As folhas se agitaram sem motivo aparente.

O cheiro permaneceu, pulsando no ar como se tivesse vida própria, provocando cada sentido meu, como se estivesse me estudando, medindo minha força e meu medo.

Meu coração acelerou ainda mais.

O instinto da loba gritava: perigo.

Mas outro sentimento desconhecido surgia: curiosidade.

A mistura era estranha e perturbadora.

Nunca antes senti algo assim.

Caminhei mais alguns passos, sentindo cada raiz, cada pedra, cada galho sob minhas patas.

Minha mente lutava para compreender: não havia sinais visíveis de alguém, nenhum movimento, nenhum ruído além do vento e dos grilos.

E, ainda assim, eu sabia que não estava sozinha.

Era como se alguém enorme, poderoso, estivesse ao meu redor, silencioso e invisível, observando cada gesto, cada respiração.

A loba dentro de mim se contorcia, querendo avançar, investigar, atacar.

Minha mente humana tentava conter a selvageria, me lembrando de que não havia inimigo, pelo menos não visível.

Mas algo na força dessa presença me dizia que não se tratava apenas de curiosidade.

Era mais do que isso.

Era instinto, magnetismo, energia pura.

Algo antigo, profundo, perigoso.

Eu parei, sentindo o corpo inteiro tenso.

Cada sentido estava amplificado: visão, olfato, audição.

O menor movimento de uma folha, o menor sussurro do vento — tudo se tornava uma informação vital.

A presença parecia dançar entre os troncos, escondida, observando minha reação.

Meu coração batia tão rápido que parecia que minha própria loba tentaria sair do peito para confrontá-la.

— Quem está aí? — repeti, agora mais firme, quase gritando para preencher o silêncio.

Ainda nada.

Mas eu senti.

Senti como se o ar carregasse uma intenção, uma força invisível que se aproximava e se retirava ao mesmo tempo, como se brincasse comigo, testasse minha paciência, minha coragem.

A noite avançava e a lua brilhava cheia, lançando sua luz prateada entre os galhos.

Os uivos distantes dos lobos da floresta ecoavam suavemente, mas havia algo diferente.

Algo que me chamava.

Um poder que não era de minha alcateia, mas forte o suficiente para fazer minha loba estremecer e minha mente humana se sentir vulnerável.

Fiquei ali por horas, caminhando entre sombras, ouvindo, sentindo, tentando compreender o que acontecia.

A sensação de ser observada não desapareceu.

Ao contrário: aumentou.

E eu percebi que não se tratava de ameaça ou ataque.

Era um convite. Um aviso. Um desafio silencioso.

Meu corpo tremia, o pelo eriçado, a respiração pesada.

A loba rugia baixinho, tentando me avisar de algo que eu ainda não conseguia compreender.

E, pela primeira vez desde a rejeição de Enzo, senti algo diferente: não era medo do passado, mas do futuro.

Algo grande estava chegando.

Algo que iria mudar tudo.

A lua testemunhava meu estado, observando cada músculo, cada uivo silencioso, cada pensamento que me atravessava.

E eu sabia, no fundo, que aquela presença não era apenas mais um lobo desconhecido.

Era alguém — ou algo — capaz de despertar minha loba de uma maneira que eu jamais havia sentido.

E, sem perceber, a sensação de solidão que me consumia começou a se misturar com uma curiosidade perigosa.

Uma voz silenciosa dentro de mim, ou talvez o instinto da loba, sussurrou:

"Não está mais sozinha. Algo está vindo. Algo poderoso."

E naquele instante, percebi: o mundo que eu conhecia, o equilíbrio da minha vida, a paz da minha alcateia… tudo estava prestes a mudar.

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