coração em silêncio

Coração em Silêncio

Amanda estava deitada de lado, ainda com a roupa da empresa, os sapatos jogados no chão. O quarto estava escuro, iluminado apenas por um feixe de luz que passava pela fresta da janela. O caderno aberto sobre a cama, a caneta parada entre os dedos. Ela queria escrever, como sempre fazia quando o mundo ficava pesado demais. Mas as palavras não saíam.

“Você vai mesmo dormir fora de casa três vezes na semana? ”

A frase de João ecoava na mente, atravessando o peito como um estalo. Ele sempre dizia que era proteção. Mas por que doía tanto?

Ela fechou os olhos por um instante, respirando fundo. Queria chorar, mas não dava esse luxo nem a si mesma.

Na porta, uma batida suave.

— Posso entrar?

Amanda reconheceu a voz antes mesmo de ouvir o fim da frase.

— Pode — respondeu sem se mover.

Ana entrou devagar, sentou-se na beirada da cama e olhou o caderno sem invadir.

— Não quer escrever hoje?

— As palavras não querem sair — disse Amanda, ainda deitada.

— Às vezes, elas só precisam de silêncio pra voltar.

Amanda virou-se, encarando a tia com olhos marejados. Ana alisou os cabelos bagunçados dela com delicadeza — um gesto raro, mas cheio de significado.

— Ele passou dos limites — disse Ana, sem rodeios. — Já falei com ele. Vai te pedir desculpas. Mas não estou aqui por ele.

Amanda sentou devagar, abraçando os joelhos.

— Ele me pegou no colo como se eu fosse uma criança birrenta... E na frente da Clara. Eu me senti... humilhada.

Ana assentiu, olhando nos olhos dela.

— Você é forte, Amanda. Forte de um jeito que assusta até os homens da nossa família. João precisa aprender que isso não é motivo pra te controlar — é motivo pra te admirar.

— Mas por que ele sempre faz isso? Me trata como se eu não fosse capaz...

— Porque você é capaz. E homens inseguros disfarçam preocupação com imposição. É mais fácil mandar do que admitir medo.

Amanda abaixou os olhos.

— Eu só queria respeito.

Ana segurou o queixo da sobrinha com carinho, erguendo seu rosto.

— E você vai ter. Porque você é uma Duarte. E as mulheres dessa família não se curvam — nem mesmo para os próprios irmãos.

Amanda riu baixinho, com os olhos ainda úmidos.

— Obrigada, tia.

— Vai dormir aqui hoje. Nada de ir pro apartamento da Bia.

— Tá bom.

Ana se levantou, mas antes de sair, olhou por sobre o ombro:

— E se quiser escrever, escreva tudo. Até a raiva. Até a dor. Às vezes, a gente transforma mágoa em história.

Amanda sorriu. E quando Ana fechou a porta, ela pegou a caneta de novo. As palavras voltavam devagar, como quem voltava pra casa.

O dia seguinte amanheceu com o céu acinzentado e uma brisa fria que soprava pelas árvores da fazenda. Amanda já estava pronta quando ouviu os passos no corredor. Não precisou nem se virar para saber que era ele.

João parou na porta, com as mãos nos bolsos e o olhar pesado de quem havia pensado a noite inteira.

— Posso?

— A casa é sua — respondeu Amanda, sem levantar os olhos do espelho enquanto prendia o cabelo.

— Eu... — ele começou, mas hesitou. — Eu vim pedir desculpas.

Amanda largou o elástico sobre a penteadeira, finalmente o encarando.

— Só porque a mãe mandou?

— Não. Porque você merece. E porque eu errei mesmo.

Ela cruzou os braços, firme.

— Você me humilhou, João. Me tratou como uma criança. E diante da Clara, ainda por cima.

Ele respirou fundo.

— Eu estava com raiva. Com medo também. Você é minha irmã. Eu me sinto responsável.

— Mas não é responsável por mim. Você pode cuidar, se quiser, mas não pode mandar. Nem me arrastar à força.

João assentiu, calado. Depois, ergueu os olhos e disse, com mais sinceridade do que Amanda esperava:

— Eu prometo que vou mudar isso. Que vou tentar respeitar seus limites. Você é... forte. Muito mais do que eu imaginava.

Ela soltou um meio sorriso, contido.

— Obrigada. Vai demorar pra eu esquecer, mas... eu aceito o pedido.

João se aproximou e, com cuidado, a abraçou. Amanda demorou um instante, mas retribuiu. Era assim com eles: brigavam, explodiam, mas o laço era mais forte que tudo.

— Só tenta não me carregar mais como um saco de batatas, ok? — Disse ela, meio rindo.

— Prometo. Só se for pra te salvar de um incêndio — respondeu ele, aliviado.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP

Capítulos relacionados

Último capítulo

Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP