Naquele ano, o homem com traços marcantes completava 22 anos. Paolo Morano possuía uma postura intimidadora quando se empertigou em seus 1,90 de altura. O italiano passou os dedos pelas veias que saltavam em suas têmporas e, em seguida, enterrou nos cabelos, jogando os fios lisos para trás enquanto o tio dirigia e reclamava em seu ouvido.
— Temos que expandir os negócios da nossa família. Você precisa encontrar uma ragazza e… — Já disse que não vou casar! — Interrompeu o tio quando recusou com veemência. Vencido pela teimosia do sobrinho, ele desistiu de aconselhar. — O seu pai não está na cidade, então, temos que ir até Bari. Stefano cuidava dos homens e gerenciava os locais em que dominava. Já Francesco, pai de Paolo, sempre administrou a parte burocrática da organização. Estava sempre em reuniões importantes ou participando de jantares para manter a aliança com pessoas poderosas. Embora o clã fosse mais poderoso e sanguinário da região de Bari, os dois sempre divergiam, não havia um meio-termo entre os irmãos Morano. Paolo e Stefano estavam a caminho de Bari, uma cidade portuária no Mar Adriático e capital da região da Apúlia. Através da janela, Paolo vislumbrou as pizzarias, lojas e empresas nas ruas sinuosas e então bufou. — Anime-se, você vai se divertir. — Stefano comentou com entusiasmo. — Vou ficar lá por uma hora. — Aborrecido, ele murmurou. — Você vai gostar do lugar. — O homem calvo, com alguns fios que ladeavam a cabeça, deu um tapa leve nas costas do sobrinho. — Tem muitas garotas lá, você pode escolher uma ou até mesmo duas. Mesmo relutante, Paolo reconheceu que estava ali para cuidar dos negócios da família. Estava decidido a trocar palavras com alguns dos aliados e depois voltar para casa. Assim que estacionou o Porsche preto em frente ao clube noturno Casa de Afrodite, Stefano abriu a porta e Paolo fez o mesmo. Quando saiu, o homem alto ajustou as mãos nos bolsos do casaco enquanto observava o tio dar ordens a um grupo de homens. Ao entrarem no estabelecimento com uma decoração clássica, ambos foram até o saguão, onde tinha um enorme lustre dourado acima das mesas. Alguns convidados bebiam e conversavam animadamente. A cada passo que dava a caminho da mesa, ele escutava o som do piano e da voz suave cantarolando a canção “Ti amo” de Umberto Tozzi. Foi naquele instante que Paolo fixou os olhos no palco e sentiu-se atraído pela jovem de olhar cintilante como esmeraldas. Alheia ao olhar faminto, Luísa Rossini tocava o piano e cantava com intensidade. Os seus cabelos eram escuros como petróleo e reluziam com a luz que pendia acima dela. A melancolia em seu semblante era visível, era como se ela carregasse o peso de um coração partido. Paolo sentou-se à mesa sem tirar os olhos dela. Cada nota que Luísa tocava naquele piano parecia conectar-se diretamente a ele. — Quer alguma coisa? — Ao perguntar, uma mulher loira interrompeu seus devaneios. — Vinho tinto. — Sem hesitar, Paolo pediu e logo emendou: — Qual o nome da pianista? A garçonete lançou um olhar rápido para o palco. — A Luísa faz apresentações para entreter os clientes, mas não costuma passar a noite com os homens, entende? Intrigado, Paolo apenas sorriu. A ideia de que Luísa poderia ser exclusivamente dele parecia tentadora. Ajustando-se na cadeira, continuou admirando-a. Quando seus olhares finalmente se cruzaram, ele sentiu algo que jamais experimentou.🎶 “In fondo un uomo che non ha freddo nel cuore” (No fundo, um homem que não tem um coração frio).🎶 Ela mantinha a conexão enquanto entoava cada palavra da canção, como se cantasse diretamente para ele. O vinho foi servido por uma das garotas que circulavam pelo local.
— Meu nome é Fiorella. — Inclinando-se para mais perto de Paolo, ela sussurrou ao pé de seu ouvido. — Se precisar de algo, é só chamar.
— Grazie, isso é tudo! — Dispensou-a com um aceno. Fiorella olhou na direção para a qual ele olhava. A sua meia-irmã sempre roubava atenção dos homens, não só por sua formosura, mas pela maneira como parecia encantar a todos quando estava naquele palco tocando o piano. Paolo estava perdido em seus próprios pensamentos, enquanto a pianista continuava a tocar e cantarolar. Todavia, Luísa quebrou a conexão quando encerrou a música, levantou e desapareceu por uma porta nos bastidores. Ele tentou segui-la com o olhar, mas Stefano o interrompeu. — Cadê as garotas novas? — gritou o tio, impaciente. Fiorella jogou os cabelos loiros para trás e subiu ao palco com outras garotas, mas Luísa não retornou. — Escolha, Paolo! — Stefano insistiu. — Onde está a pianista? — perguntou ele, quase sussurrando. — Prefere ouvir música ao invés de se fartar com essas lindas garotas? — O tio zombou. — Quero a pianista — respondeu com firmeza, encarando o tio. A anfitriã conversou rapidamente com um dos seguranças, que, rapidamente, trouxe Luísa pelo braço. A jovem parecia apavorada, com os olhos marejados. — Eu só vim aqui para tocar piano e cantar para os convidados… — A voz embargada de Luísa alegou. — Não é você quem decide isso! — Stefano a advertiu. — Quer mesmo passar a noite com a pianista? — perguntou Stefano, dirigindo-se ao sobrinho. — Ela não parece ser boa de cama. — Ótimo! — Decidido, Paolo exclamou. A garota estagnou no lugar. O olhar de Luísa refletia o pavor. — Vá com ele, Luísa! — A anfitriã do bordel ordenou. — Não foi isso que combinamos! — Luísa protestou. — Paolo é um Morano. Quer mesmo discutir com o herdeiro de um dos clãs da máfia? — Com tom ameaçador, a anfitriã retrucou. Assustada, Luísa encolheu os ombros. Só aceitou aquele trabalho para pagar o aluguel da casa que dividia com sua meia-irmã. Fiorella jurou que seu trabalho era só tocar piano e cantar para entreter a clientela. — Use a pianista como você quiser. — Stefano falou com o sobrinho. — Ela será o seu presente de aniversário. Depois que estiver satisfeito, será a minha vez. Capisci? Franzindo o cenho, Paolo estreitou o olhar, mas não respondeu. Ao invés de concordar com o tio, segurou na mão de Luísa. — Venha comigo, ragazza! — Tocando em seu pulso, ele levou a pianista para um dos quartos.