“Cada gesto meu te alcança. E te envolve. De certo modo. Te liberta e te devolve”
— Marisa Monte, Infinito Particular
O som áspero das rodas deslizando sobre o piso impecavelmente polido da mansão foi o primeiro indício de que aquilo não era um sonho.
Era real. Tão real quanto o calor e o peso do bebê aninhado em seus braços, sugando com uma força tranquila, quase hipnotizante. Dayse permanecia sentada na beira da cama, o corpo exausto, mas a mente em estado de vigília.
Seus olhos, embora cansados, estavam atentos a cada detalhe ao seu redor, como se o momento exigisse dela uma presença absoluta, uma entrega completa entre o cansaço e a plenitude.
O quarto ainda carregava no ar o cheiro ardido do parto ― ácido, visceral. O sangue seco manchava o chão, misturando-se aos panos úmidos que testemunhavam a batalha pela sobrevivência.
Mas algo novo se infiltrava naquele ambiente saturado: um perfume importado, opulento e invasivo, quase uma afronta à crueza do momento. Era um aroma que fala