####O CHEQUE

O portão da pequena casa de muro baixo e jardim com hortênsias já mostrava sinais da passagem do tempo, mas aquela tarde parecia mais viva. Ela empurrou o portão com a mão esquerda, a outra ainda segurando firme a pasta com o cheque dobrado cuidadosamente. O coração batia acelerado, entre alívio e orgulho.

— Mamãe? — chamou, entrando com passos apressados.

Mercedes estava sentada no sofá, com uma manta nos joelhos e um livro de orações no colo. Levantou os olhos devagar, surpresa com a filha chegando mais cedo.

— Você já chegou, minha filha?

A jovem sorriu largo, o brilho nos olhos denunciando a novidade.

— Sim, mamãe. E vim com boas notícias! — largou a bolsa no aparador e se ajoelhou em frente à mãe. — Eu consegui, mamãe. O empréstimo! O Sr. Etienne me atendeu pessoalmente e liberou o cheque.

Mercedes arregalou os olhos.

— O Sr. Etienne? — repetiu, surpresa. — Ele mesmo?

— Ele mesmo. Pediu que eu fosse até o escritório dele, lá no último andar. E sabe o que ele me disse? Que eu podia vir agora mesmo buscar a senhora pra gente ir direto ao hospital.

— Mas… minha filha, você conversou com o Sr. Etienne? Ele lhe atendeu?

— Sim. Me tratou com tanta gentileza, mamãe… Ele perguntou da senhora, disse que se lembrava do seu bom serviço, do carinho com que tratava a empresa. Ele mandou dizer que é pra senhora cuidar da sua saúde e não se preocupar com nada. Ele quer lhe ver bem.

Os olhos de Mercedes marejaram. Tocou a mão da filha com ternura.

— Ele… ele foi assim com todos. Um verdadeiro senhor. — suspirou, emocionada. — Quando seu pai faleceu, foi o Sr. Etienne quem pagou o velório. Cuidou de tudo, como se fosse da família. Ele pode ser um homem riquíssimo, minha filha, mas o coração… ah, o coração dele é de ouro.

— Eu senti isso. — ela assentiu, sorrindo. — E ele foi tão firme, mamãe… Ele deu um basta no diretor do financeiro. Disse que se ele não liberasse o cheque na hora, ele perderia o emprego.

Mercedes levantou uma sobrancelha, surpresa.

— Disse isso?

— Disse. Na frente de todo mundo. E o homem, arrogante do jeito que é, ficou branco. Mas fez o cheque rapidinho.

— Ele é assim, o Sr. Etienne. Pode ser educado, mas quando vê injustiça, não se cala. Ele sempre respeitou desde a faxineira até o engenheiro mais graduado.

— Ele me pareceu um avôzinho tão querido. Me tratou com uma doçura que eu não esperava. — apertou a mão da mãe. — Agora vai dar tudo certo, mamãe.

Mercedes respirou fundo.

— Vai sim. Deus há de permitir.

— A senhora acha que dá pra gente ir hoje mesmo no hospital?

Mercedes franziu o cenho, pensativa.

— Melhor ligarmos para o meu médico. Ver o que ele diz. Já tenho a requisição, mas preciso saber como ele quer proceder.

Ela se levantou, pegou o telefone com as mãos um pouco trêmulas, e discou com atenção. A filha ficou ali, sentada no tapete, esperando com o coração apertado. A resposta do outro lado veio firme.

Mercedes desligou e olhou para a filha com leveza.

— Ele disse que agora que temos o cheque, eu posso dar entrada no calção e já marcar os exames pré-operatórios. Ele vai me encaixar na semana que vem, se estiver tudo pronto.

— Mamãe, isso é maravilhoso! — ela se levantou num pulo, abraçando a mãe com força. — Ele disse mais alguma coisa?

— Disse que é pra eu me preparar, que se eu estiver medicada e firme, posso fazer os exames sozinha amanhã.

— Tem certeza? A senhora consegue ir ao hospital sozinha?

— Consigo sim, meu amor. Os exames não são invasivos, e com os medicamentos, eu estou melhor. Vá trabalhar tranquila amanhã. Só não esqueça de agradecer ao Sr. Etienne.

Ela puxou um envelope da bolsa.

— Aqui está o cheque. Já todo certinho. Amanhã, a senhora vai com calma no hospital, entrega o cheque e faz a entrada. E por favor, não esqueça de comer direitinho.

Mercedes pegou o envelope com reverência, como se tivesse nas mãos um milagre.

— Obrigada, minha filha. Você não imagina o alívio que está me dando. Eu… eu estava com medo de te ver desamparada. Mas você foi mais forte que eu.

Ela sorriu, com os olhos cheios.

— Eu sou forte porque a senhora me ensinou a ser.

As duas se abraçaram ali, no meio da sala, em silêncio.

Depois do jantar leve, com sopa e torradas, ela foi até o quarto preparar os documentos da mãe. Deixou tudo separado: identidade, laudos antigos, receitas, requisição do médico. Organizou num envelope com etiqueta, como tinha aprendido a fazer com a própria Mercedes quando era criança.

Antes de deitar, olhou novamente para a pasta do trabalho. Tinha um recado escrito à mão pelo Sr. Etienne, pedindo que ela comparecesse ao escritório dele às 13h em ponto no dia seguinte.

Era mais que uma convocação. Era uma porta se abrindo. Um novo caminho.

E ela, pela primeira vez em meses, dormiu com o coração em paz.

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