####A Esperança que Desaba

Aimee segurava com força a pasta azul contra o peito como se ali estivessem suas últimas forças. Cada folha, cada documento, cada prova do que restava da estabilidade da mãe estava ali, ordenada como quem tenta organizar o próprio caos. Desde que sua mãe recebera o diagnóstico de linfoma, a vida de Aimee deixara de seguir qualquer roteiro esperado. As aulas da faculdade de administração foram trancadas sem cerimônia. Seus sonhos foram colocados em espera. Tudo o que importava agora era uma coisa só: salvar sua mãe.

Aos 22 anos, Aimee teve que crescer na marra.

— Vamos conseguir, mãe — repetia toda manhã ao lado do leito improvisado na sala de casa, onde a mãe descansava entre uma consulta e outra, entre uma crise e uma dose de corticoide.

Mesmo com o plano de saúde da empresa cobrindo parte dos custos, a cirurgia e o tratamento integral exigiam cinquenta mil dólares que ela simplesmente não tinha. Os bancos foram sua primeira esperança. Depois de peregrinar por agências, atender protocolos, assinar formulários e ouvir negativas com sorrisos corporativos, a esperança descia pela garganta como fel.

— Desculpe, senhorita. A senhora não tem comprovação de renda suficiente para esse valor — diziam, invariavelmente.

Ela não contava mais nos dedos os “nãos” que ouvira.

Na última tentativa, uma funcionária chegou a lhe oferecer um panfleto de um curso de educação financeira.

— Educação? A minha mãe está morrendo! — gritou por dentro.

NO OUTRO DIA NO HORÁRIO DO ALMOÇO

Naquela manhã, Aimee acordou mais cedo do que o habitual. A mãe estava sonolenta, mas menos abatida, após as novas medicações receitadas pelo oncologista.

— Vai dar tudo certo, minha filha... você é forte — disse a mãe, com um sorriso fraco.

Respirando fundo, Aimee vestiu sua camisa branca, um blazer simples azul-marinho e uma calça social escura. Prendeu os cabelos num coque, aplicou uma base leve para disfarçar as olheiras e foi. Entrou no prédio central da empresa onde a mãe trabalhava há mais de vinte anos como secretária da gerência de suprimentos. A esperança ainda pulsava no fundo do peito.

— O senhor é o responsável pelo setor de empréstimos internos? — perguntou educadamente ao homem por trás da mesa.

Clifford ergueu os olhos por cima dos óculos. Seus cabelos grisalhos perfeitamente penteados e o terno impecável diziam mais sobre ele do que qualquer crachá.

— Sou sim. Qual o motivo do seu pedido, senhorita?

— Aimee. Aimee Molina. Minha mãe é funcionária aqui. Mercedez Molina Fernandes. Ela está com câncer. Um linfoma agressivo e cinco nódulos na tireoide. O plano de saúde não cobre tudo... precisamos de cinquenta mil dólares. Por favor, senhor, minha mãe trabalha aqui há vinte anos. Ela sempre foi dedicada...

Clifford consultou rapidamente o sistema e cruzou os dedos em frente ao corpo, com frieza profissional.

— Senhora Mercedez tem um excelente histórico, mas infelizmente, como a solicitação está no nome da senhora Aimee, e não diretamente da funcionária, precisaremos passar pela análise da diretoria. O prazo médio é de uma semana a dez dias úteis. E mesmo assim não há garantias.

— Dez dias?! — ela arfou. — Mas ela precisa da cirurgia com urgência. O plano cobre metade, mas a outra metade e o tratamento não...

— Sinto muito. São normas da empresa.

Aimee apertou os olhos, sentindo as lágrimas queimarem. Puxou os documentos de volta e se levantou, em choque.

— Normas? A vida da minha mãe vale menos do que normas? Ela deu a vida por essa empresa!

Sem resposta, o homem apenas desviou o olhar. Aimee saiu cambaleando pelo corredor com os olhos embaçados pelas lágrimas. Quando fez a curva no saguão, tudo aconteceu rápido demais: trombou com alguém.

— Desculpa, me desculpa! — ela soltou num soluço, mal percebendo com quem havia esbarrado.

— Ei, moça! Está tudo bem? Você está chorando, o que aconteceu? — a voz masculina foi firme, mas preocupada.

Aimee piscou algumas vezes para focalizar o homem à sua frente. Alto, cabelo levemente ondulado, olhos cinzentos intensos. Estava de terno, mas sem gravata, e carregava uma pasta de couro.

— Eu, vim tentar um empréstimo para pagar a cirurgia da minha mãe. Ela trabalha aqui há mais de vinte anos. Ela está com câncer, e eu não consigo ajuda em lugar nenhum — desabou, fungando. — O diretor do financeiro disse que não pode fazer nada, que tem que passar por análise. Eu implorei. Mas ele disse que são normas.

O homem franziu o cenho, tocou de leve no ombro dela.

— Vem comigo.

— O senhor vai me levar de volta? — ela sussurrou, sem entender.

— Exatamente. Vamos resolver isso agora.

Ele abriu a porta do financeiro e entrou como um raio.

— Clifford.

O homem atrás da mesa arregalou os olhos ao vê-lo.

— Senhor Trovatto!

Aimee travou. Trovatto?

— Qual o motivo de não ter liberado o pedido da filha da Mercedez?

— Senhor, ela não é funcionária, precisa passar por avaliação...

— Normas da empresa são válidas para novatos. A mãe dela está aqui há duas décadas. Isso é suficiente para liberar, sem autorização do CEO.

— Mas senhor, eu...

— Ou você libera esse cheque agora, ou está demitido.

O silêncio que caiu na sala parecia pesar toneladas.

Clifford suava frio enquanto preparava os papéis. Aimee tremia, sem acreditar.

Em minutos, os documentos estavam prontos. Ela assinou ainda com os olhos marejados. Clifford lhe estendeu um envelope com o cheque e a liberação formalizada.

— Aqui, senhorita.

— Obrigada... obrigada...

Etienne olhou para ela e disse com gentileza:

— Vá cuidar da sua mãe.

— Mas quem é o senhor? — perguntou, ofegante.

— Eu sou o dono da empresa. Etienne Trovato Noruando.

Ela levou a mão à boca.

— Deus seja louvado! O senhor... Deus colocou o senhor no meu caminho. Eu nem sei como agradecer...

— Amanhã. Neste mesmo horário. Eu quero você aqui. Vá cuidar da sua mãe, e depois venha falar comigo.

— Sim, senhor muito obrigada!

Ela saiu do setor com os olhos lavados em gratidão.

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