(POV Selene)
O amanhecer não trouxe paz.
A luz entrou pelas frestas quebradas do depósito como lâminas, cortando direto nos olhos. O corpo inteiro dói, os músculos gritam, mas não é só cansaço. É o sangue. O cheiro dele ainda está nas minhas mãos, mesmo depois de lavar até a pele rachar.
Passei a madrugada vendo o rosto do caçador. Os olhos arregalados, o grito que se perdeu no escuro, a sensação da lâmina atravessando carne. Não importa o quanto eu feche os olhos, está sempre lá.
E, por baixo do horror, há outra coisa. Algo pior.
Eu não queria admitir, mas senti.
Senti prazer.
— Não comeu nada. — A voz de Ronan me arranca dos pensamentos. Ele está de pé, sempre de pé, afiando outra lâmina como se não existisse mais nada no mundo. — Se não alimentar o corpo, o selo vai te engolir mais rápido.
— Não estou com fome. — Minha voz é baixa, mas firme.
Ele ergue os olhos escuros, e o peso deles quase me derruba. — Não é sobre fome. É sobre sobreviver.
Dorian se mexe na sombra, passos lentos,