Início / Lobisomem / A LUNA DO ALFA SEM VOZ / ✦ CAPÍTULO 2 — A MARCA E O VENTO
✦ CAPÍTULO 2 — A MARCA E O VENTO

O vento vinha do norte.

Frio, antigo, vivo.

Trazia um som que não era som — uma espécie de lembrança do que o mundo um dia foi antes do silêncio.

Helena corria.

Os galhos rasgavam o tecido branco do vestido, os pés feriam-se no gelo, mas ela não parava.

Atrás, os caçadores seguiam com tochas e cães.

O barulho das correntes ecoava entre as árvores, misturado a gritos de ordem e sopros de fúria.

Ela não sabia exatamente por que fugia — só sabia que não podia parar.

A marca no ombro queimava desde a noite em que o selo foi imposto.

Disseram que era um símbolo de proteção, mas a dor nunca cessou.

Agora, no meio da floresta, parecia viva.

Como se algo sob a pele chamasse por ela de volta.

O vento aumentou.

Os lobos uivaram ao longe.

Um uivo só, prolongado, respondeu a todos os outros.

Helena tropeçou.

Caiu de joelhos, o rosto contra a neve.

O frio queimava, o peito arfava.

E de repente, tudo ficou quieto.

Assustadoramente quieto.

Nenhum passo, nenhum cão, nenhum grito.

A floresta prendia a respiração.

Ela ergueu o rosto.

A lua cheia iluminava a mata em prata.

A neve caía devagar, como se o tempo hesitasse.

Foi então que ouviu — não pelos ouvidos, mas pela pele.

Corre.

A voz era masculina, rouca, distante.

Um som que vibrava dentro do peito.

Helena virou-se, assustada.

Não havia ninguém.

Mas o vento soprava na direção oposta — convidando-a.

Ela se levantou e correu.

O corpo parecia guiado por algo que não era medo.

Era como se os passos soubessem o caminho antes dela.


Horas depois, o bosque terminou num penhasco.

Abaixo, um rio congelado serpenteava como uma cicatriz brilhante.

Do outro lado, o horizonte do Norte — uma faixa de neve e luz.

Ela parou na beira, ofegante, o coração tentando sair do peito.

Atrás dela, o som dos caçadores ressurgiu.

Tochas. Vozes. Ferro.

Helena olhou para o abismo.

O vento uivava, empurrando-a.

A marca ardia.

De repente, um clarão — como relâmpago sem raio — acendeu-se por trás da lua.

O chão vibrou.

E o nome ecoou de novo, agora mais forte:

Helena.

Ela fechou os olhos e pulou.

A queda foi longa e rápida.

O corpo atravessou camadas de vento e neve até mergulhar no gelo do rio.

O impacto arrancou o ar dos pulmões.

Por um instante, o mundo inteiro virou branco e frio.

Silêncio.

Depois — um som abafado, grave, como batida de tambor distante.

O gelo se quebrou.

Braços fortes a puxaram para fora.

Helena tossiu, tossiu de novo, até sentir o ar voltar.

Quando abriu os olhos, o céu era diferente — cinza e prateado.

Estava deitada sobre um tapete de peles.

Ao redor, tochas presas em lanças queimavam devagar.

Lobos observavam em silêncio.

E entre eles, um homem ajoelhado.

O Alfa.

Kael Dravik.

Helena tentou se erguer, mas o corpo não respondeu.

O Alfa a olhava em silêncio, os olhos de gelo e febre.

O peito nu subia e descia devagar, a cicatriz na garganta pulsava com o mesmo ritmo da marca no ombro dela.

Por um instante, o ar pareceu desaparecer entre os dois.

Ronan, o Beta, surgiu atrás do Alfa.

— Ela veio do sul. — A voz dele era baixa, tensa. — Trouxe o selo.

Kael não respondeu.

Apenas tocou a própria garganta e depois o ombro dela, sem encostar.

O gesto fez o ar vibrar.

A marca brilhou sob o tecido molhado, respondendo como brasa.

Ronan prendeu a respiração.

— Pelos deuses, ela é o eco.

Kael virou lentamente o rosto para ele, olhar cortante, como se dissesse cale-se.

O Beta abaixou a cabeça.

Helena tentou falar, mas nada saiu.

A voz parecia presa entre o coração e a boca.

Kael aproximou-se.

Apenas um passo.

O bastante para que o calor dele a alcançasse.

O Alfa estendeu a mão, hesitou por um instante e pousou a palma no ar, a poucos centímetros do rosto dela.

A marca respondeu com um pulso.

Você me ouviu.

A voz ressoou dentro da mente dela, rouca, grave, feita de eco e vento.

Helena piscou, sem acreditar.

— Q-quem…

A palavra não terminou.

O Alfa afastou a mão.

O som se desfez.

Ronan lançou um olhar rápido a Kael.

— O que ela é?

O Alfa não respondeu.

Apenas se levantou, pegou o manto sobre o lobo maior e o colocou sobre Helena.

O gesto era antigo.

Entre os clãs, significava: sob minha proteção.

Ronan suspirou.

— O Conselho não vai aceitar isso.

Kael o ignorou.

Voltou-se para a mulher e, com um olhar que parecia atravessar o tempo, inclinou a cabeça — uma saudação silenciosa, um reconhecimento impossível.

Helena tentou entender, mas o corpo cedeu.

O frio venceu.

Tudo ao redor se dissolveu em branco e sombra.


Horas depois, quando o amanhecer tocou o castelo, Kael ainda estava de pé junto ao braseiro, observando o fogo.

O rugido que ele não podia emitir parecia estar preso na garganta do mundo.

E na pele dele, a cicatriz queimava como nunca.

No alto da torre, a lua minguante se partia em dois reflexos.

E o vento, pela primeira vez desde a morte de Lyra, trouxe voz.

O amor sempre volta.

Mesmo que precise mudar de corpo.

Kael fechou os olhos.

Dentro dele, o silêncio rugiu.

E nas câmaras de pedra, a mulher que caíra do céu respirou fundo — sonhando com uma voz que não era a sua.

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