NOVIDADE PARA FAMÍLIA

Josefina chegou na casa dos pais e respirou fundo antes de soltar a notícia. A sala estava num silêncio estranho: a mãe organizava prontuários com indignações imaginárias, o pai assistia TV, imóvel como uma estátua cansada, e a irmã rolava o feed do celular, pronta para palpitar sem ser chamada.

— Então… quero a atenção de vocês. Eu tenho uma notícia — Josefina disse, ajeitando o cabelo atrás da orelha.

Júlia foi a primeira a erguer aqueles olhos azulados, curiosos.

— Vai casar? — Perguntou animada.

— Não.

— Mestrado?

— Não, Júlia...

— Tá grávida?

— Júlia! — Josefina perdeu a paciência. — Não é nada disso. Eu… vou morar em outro país.

A mãe, Lourdes, congelou instantaneamente. Os papéis ficaram suspensos, como se alguém tivesse apertado pause na cena.

— Como assim? — Os olhos âmbar já estavam arregalados, prontos para o drama. — Fazer o quê? 

— Vou ser… au pair, mãe.

O silêncio que seguiu foi inquietante, até a TV pareceu prestar atenção. O pai, Ricardo Abrantes Neto, empalideceu — e, para alguém naturalmente branco, parecia prestes a desaparecer.

— Au… o quê? — Lourdes perguntou quase em um sussurro, analisando a palavra como se fosse material de prova.

Júlia foi mais rápida:

— Tipo uma babá estrangeira — explicou, sem levantar muito a cabeça.

— Isso! — Josefina confirmou, com um aceno.

— Júlia, fica quieta. — A mãe voltou o olhar para filha. — Josy, você está brincando comigo, né?

— Não. É uma oportunidade incrível, mãe. — Josefina insistiu.

Lourdes suspirou como quem recebe um diagnóstico grave e se jogou no sofá.

— Você vai sair daqui pra ser escrava em outro país, Josy?! — A voz ecoou pela sala. — Você tem passaporte, visto… podia fazer um intercâmbio normalmente, procurar emprego decente! Mas babá? BABÁ?! Em outro país?! Isso me parece trabalho escravo!

— Mãe, não é assim. Tem salário, contrato, regras… eu já pesquisei tudo. É seguro, tá!

— Sei. Regras que eles mesmos quebram. Pesquisou no G****e e agora acha que está segura — rebateu Lourdes, cruzando as pernas com indignação. — E quando você estiver sozinha a dez mil quilômetros? Quem vai garantir?

Josefina fechou os olhos, respirou fundo tentando manter a calma. Sua voz saiu baixa e sincera:

— São só alguns meses. Eu preciso disso. Eu sei o que estou fazendo, confia em mim.

A mãe rebateu:

— Daqui a pouco você aparece sendo obrigada a cozinhar, lavar, passar ou coisa pior… Não quero nem pensar nisso!

O pai soltou um suspiro longo, pesado, o clássico “eu avisei”. No trabalho o coronel da polícia, mas em casa não combatia quase nada. Aumentou o volume da TV, preferindo enfrentar tragédias nacionais ao surto doméstico.

Júlia tentava não rir, mordendo o lábio. Apesar de parecida com a irmã, tinha uma personalidade excêntrica de modelo ruiva misturada com o porte atlético do pai.

— E pra onde você vai mesmo? — Ricardo perguntou, desconfiado.

— Coreia do Sul.

— IHHHH! — Júlia vibrou. — Mana, tu vai voltar casada com um coreano lindo! Bem a tua cara. E sem falar que faz teu tipo, até teu ex era chinês…

— Ha-ha-ha, engraçadinha. Não mete o Yuri nessa história — Josefina resmungou, corando. — E eu NÃO vou casar com ninguém!

— Vai sim… — Júlia piscou, com um sorriso sugestivo. — Isso tá com cara de dorama. Vou até juntar dinheiro pra te visitar.

Lourdes estreitou os olhos, levantando meio centímetro do sofá.

— Tem precisão disso, minha filha? Vocês perderam o juízo, só pode.

Por um segundo, o drama se dissolveu e deu lugar a uma preocupação verdadeira.

— Você é muito atraente. Se isso for uma armadilha? E se te sequestrarem?

— Vocês não são influentes? Se algo acontecer, o papai me acha — Josefina sorriu. — Ou eu me viro. 

— E se te explorarem? E se te tratarem mal?

— Eu vou embora na hora! Você sabe que eu sei me defender. O papai me ensinou muito bem.

Ricardo, ainda de olhos na TV, falou com a calma de quem aceita o inevitável:

— Josy, querida… você já é adulta, sabe muito bem das coisas. Só não esqueça dos contatos de emergência, da embaixada, passar o rastreamento, a localização. E guarda bem o passaporte como se fosse ouro. Todos os dias manda notícias. Fica alerta. Assim você tem minha bênção.

Josefina abriu um belo sorriso e deu um beijo e abraço no pai. Lourdes levantou, ainda contrariada, e saiu apressada para o plantão no hospital. Júlia sumiu para o quarto, murmurando que mal podia esperar para ver as fotos do “país novo”.

Ricardo ficou com Josefina na sala. Ela sorriu ao ouvi-lo relembrar as aventuras da família nos Estados Unidos e na Espanha. Histórias que, agora, pareciam fazer sentido.

Para ela a Coreia do Sul não era mais um sonho. Mas um salto.

E agora estava pronta para ir, tinha finalmente tirado o pé do chão. 

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP