POV Célia Montenegro
A casa dos Montenegro sempre fora assim: grande demais, fria demais, cheia de histórias que preferiam ser esquecidas. Hoje, porém, ela parecia… satisfeita. Como um monstro que acabara de se alimentar.
Heitor já havia saído para o trabalho. A passos pesados, olhar abatido, cheiro de ressaca e remorso. Eu o observei do alto da escada enquanto ele passava pela sala, tentando fingir normalidade, e senti uma paz quase maternal.
Quase.
Ele estava quebrado. E um homem quebrado é muito mais fácil de moldar.
Entrei no meu escritório, um santuário de madeira escura, cheirando a tabaco e papel antigo. Fechei a porta e o som do mundo ficou do lado de fora. A escrivaninha me esperava, impecável, com meus cadernos de anotações e as correspondências abertas. Eu nunca deixava nada fora do lugar. O caos mora nas pessoas; nos objetos, ele é inaceitável.
Servi-me de café e sentei. Cruzei as pernas.
Observei, por um longo instante, o reflexo da janela. Minha própria imagem devolveu