O dia seguinte nasceu com um céu cinzento sobre Londres, mas não foi a chuva fina que incomodava Alicia naquela manhã. Ela chegou ao prédio da D’Abruzzi Corporation às 8h em ponto, apesar de saber que agora não adiantava mais tentar evitar Victor. Depois da noite anterior, evitar seria infantil. E covarde. E, acima de tudo, ineficaz.Vestia um vestido azul-marinho impecavelmente alinhado, cabelos presos em um coque firme, saltos discretos, pastas sob o braço e a expressão da mulher que tentava fingir normalidade.Mas a normalidade já não existia.Ao atravessar a recepção e acenar discretamente para a funcionária do andar executivo, notou que os corredores estavam mais movimentados. Pessoas que nunca vira circulavam com pastas e celulares, e houve cochichos em sua direção. Comentários abafados, olhares disfarçados.Ignorou tudo e seguiu até sua sala provisória. A porta estava trancada, como deixara na noite anterior. Dentro, o ar ainda guardava o aroma do café e da tensão.Sentou-se di

O primeiro raio de sol filtrava-se por entre as cortinas da cobertura, tocando o rosto de Alicia com delicadeza. Ela despertou em silêncio, os cílios ainda úmidos de um sono agitado. Por um instante, fechou os olhos novamente, como se pudesse estender o torpor da noite anterior — uma noite que ainda queimava sob sua pele, viva, latente, pulsante.Estava sozinha no quarto.A ausência dele no ambiente fez seu peito se apertar. Por que isso doía tanto?Sentou-se na cama lentamente, tentando compreender por que aquele prazer inenarrável vinha agora acompanhado de um frio no estômago. Passou os dedos pelo lençol amarrotado, sentindo o perfume dele ainda ali. E então se olhou no espelho. Os cabelos um pouco desalinhados, a maquiagem desfeita, os sinais visíveis de uma noite de entrega.Seu coração disparava, mas sua mente... sua mente já construía um muro de proteção.Levantou-se decidida. Tomou um banho rápido, deixou a água quente cair sobre o corpo na tentativa de lavar a ansiedade que c

O despertador tocou antes do sol nascer, mas Alicia já estava desperta. Havia dormido apenas algumas horas, e ainda assim, sentia-se em estado de alerta — como se a noite anterior tivesse deixado marcas que nenhum banho pudesse apagar.Levantou-se lentamente, caminhando descalça até o espelho do banheiro. O vapor quente da água preenchia o ambiente enquanto ela se despia e permitia-se mais do que uma simples higiene matinal: um rito de reinício. Lavou os cabelos com cuidado, como se quisesse limpar os rastros do desejo intenso que a envolvera, ainda que soubesse que certas sensações jamais seriam removidas com água e sabão.Diante do closet, Alicia optou por um conjunto de alfaiataria impecável em tom azul petróleo, com um corte acinturado que realçava sua silhueta com elegância, sem exageros. Prendeu os cabelos em um coque baixo, deixando duas mechas soltas emoldurando o rosto. A maquiagem era sutil, mas suficiente para destacar seus olhos claros e sua boca levemente avermelhada. O p

Alicia digitava concentrada os últimos ajustes do relatório que seria apresentado à equipe de compliance da D’Abruzzi Corporation quando escutou a voz ao fundo da sala ampla e envidraçada.— Perdão, querida. Poderia me dizer onde fica a sala da diretoria jurídica?A voz feminina, levemente rouca, carregava um tom pretensamente doce. Mas para Alicia, era como uma unha arranhando vidro.Ela virou devagar, sem pressa. E ao ver a figura parada ali, com ares de quem controlava o ambiente, seu estômago revirou.Melanie Cristy.Impecável em um terninho de alfaiataria azul petróleo, cabelo solto em ondas, maquiagem feita com precisão cirúrgica. Tão fora de contexto... e ao mesmo tempo perfeitamente ensaiada para parecer indispensável.Alicia demorou um segundo para recuperar a voz.— Melanie? O que você está fazendo aqui?A outra sorriu, como se a surpresa fosse uma gentileza.— Alicia! Que coincidência maravilhosa! Fiquei sabendo que você está prestando assessoria à D’Abruzzi e, veja só... a

A luz tênue da manhã filtrava-se pelas frestas da cortina, mas Alicia não se movia. A febre havia baixado um pouco durante a madrugada, mas agora o corpo parecia feito de chumbo. Um cansaço insuportável a esmagava contra os lençóis, como se algo dentro dela estivesse drenando suas forças com delicada brutalidade.O enjoo voltava em ondas. O estômago estava vazio, mas revirava como se estivesse em guerra. Pensou em se levantar para pegar água ou ao menos carregar o celular, que já estava morto desde a noite anterior. Mas nem isso conseguiu. Apenas permaneceu ali, olhos fechados, pele fria e úmida, o corpo coberto por um moletom que já começava a pesar como armadura.Quando finalmente adormeceu, foi despertada de forma brusca.A campainha soava insistente, cortando o silêncio da casa como uma sirene.Alicia gemeu baixinho. Sentou-se com dificuldade, apoiando os braços nos joelhos. Sua visão escureceu por um instante. Com esforço, caminhou até a porta, tropeçando em uma almofada caída.A