Os primeiros dias na casa da Vitória, após a chegada de Leonardo, foram um borrão de uma beleza exaustiva. O mundo, antes vasto e cheio de batalhas corporativas e prazos de exposições, encolhera para os limites daquele santuário de vidro e madeira. O tempo já não era medido em horas ou dias, mas em ciclos de mamadas, sonecas e trocas de fraldas.A euforia inicial do nascimento deu lugar à realidade implacável da paternidade. O sono tornou-se a mercadoria mais preciosa do mundo, mais rara que o mármore azul de Jacobina. Léo era um bebê saudável e forte, o que significava que seus pulmões também eram fortes e saudáveis, algo que ele fazia questão de demonstrar, principalmente entre as duas e as cinco da manhã.Foi na escuridão da terceira noite que a primeira fissura apareceu na fundação de sua nova paz.Léo chorava, um choro agudo e inconsolável que parecia ecoar em cada canto da casa silenciosa. Helena o embalava, o corpo dolorido, a exaustão tão profunda que parecia um zumbido constan

A viagem para São Paulo, desta vez, foi uma expedição familiar alegre e caótica. A cabine silenciosa do jato particular foi substituída pelos sons de um voo comercial de primeira classe, preenchida pelo balbucio curioso de Léo, pelas canções de ninar de Lúcia e pelas piadas animadas de Ricardo. Dante, para a surpresa de Helena, parecia mais relaxado e feliz em meio àquele pequeno caos familiar do que jamais parecera no silêncio opulento de seu próprio avião. Ele era o pai, o marido, o genro, papéis que ele agora habitava com uma facilidade e uma alegria que eram a prova final de sua transformação.Eles se instalaram em uma suíte espaçosa no mesmo hotel boutique, que agora parecia menos um refúgio e mais um acampamento base. Brinquedos de Léo foram espalhados pelo tapete caro, e Lúcia rapidamente assumiu o comando da cozinha, declarando que não confiava na comida de hotel para seu neto. A presença calorosa e descomplicada da família de Helena era uma âncora de normalidade no coração da

O voo de volta para Salvador foi uma viagem através do silêncio. Não o silêncio tenso de antes, carregado de palavras não ditas e batalhas iminentes, mas um silêncio suave e satisfeito, o tipo de quietude que se segue a uma tempestade que finalmente limpou o ar.Léo dormia no colo de Helena, a respiração tranquila, alheio ao fato de que seus pais haviam, na noite anterior, conquistado o mundo. Lúcia e Ricardo cochilavam em suas poltronas, exaustos pela emoção. E Dante apenas segurava a mão de Helena, os dedos entrelaçados, observando-a com uma adoração silenciosa. A guerra havia acabado. E, no rescaldo, a paz era mais bonita do que qualquer vitória.A chegada à Bahia foi um bálsamo. O ar quente e úmido, o cheiro do mar, a luz dourada que parecia abençoar tudo o que tocava. Eles deixaram Lúcia e Ricardo em Candeias, prometendo um almoço em família no dia seguinte, e seguiram para a casa na Vitória.Entrar na casa, que agora era inequivocamente o lar deles, foi como atracar em um porto

O sábado amanheceu na casa de Lúcia com o cheiro de cuscuz e o som da risada de Léo. A formalidade da "reunião do conselho" do dia anterior havia se dissolvido na intimidade de um café da manhã em família. Dante, sentado à pequena mesa de madeira, parecia ter encolhido de CEO de um império para apenas "o marido da Helena", um título que ele parecia usar com um orgulho imenso.— Então, Diretor Administrativo — brincou Helena, passando uma fatia de mamão para Ricardo. — Quais são as suas primeiras ordens para a nova escola?— Minha primeira ordem — disse Ricardo, o peito estufado com sua nova e séria responsabilidade — é que o café da manhã de sábado na casa da minha mãe seja obrigatório para todo o conselho.Lúcia sorriu, colocando a mão sobre a de Dante.— Ele tem boas ideias. Você escolheu bem, minha filha.Naquele momento, olhando para o homem que amava rindo com seu irmão, o filho deles balbuciando no colo de sua mãe, Helena sentiu uma onda de felicidade tão completa e tão sólida q

O domingo da festa de lançamento da pedra fundamental da escola amanheceu não com a calma silenciosa da casa da Vitória, mas com a feliz e barulhenta desordem da casa de Lúcia. Eles haviam decidido passar a noite ali, em Candeias, para estarem no coração do evento desde o primeiro momento. Dante acordou no pequeno quarto de hóspedes com o som de Lúcia cantando na cozinha e o cheiro de acarajé começando a fritar, mesmo às sete da manhã.Ele desceu e encontrou a casa em um estado de alegre pandemônio. Ricardo estava no quintal, tentando montar um pequeno palco de madeira. Lúcia comandava a cozinha como uma generala, orquestrando panelas gigantes de vatapá e caruru. E Helena, com Léo em um quadril e um telefone no outro, tentava confirmar a entrega das mesas enquanto impedia seu filho de mergulhar a mão em uma tigela de vinagrete.Dante parou na porta, observando a cena. Meses atrás, aquele nível de caos familiar o teria deixado tenso, um intruso em um mundo cujas regras ele não entendia