Roberto estava decidido. Precisava fazer alguma coisa. Não suportava mais ver Alicia distante, evasiva, fugindo dos seus toques, dos seus carinhos, dos seus olhares apaixonados. Desde a volta da lua de mel ela estava diferente, e, embora ele tentasse fingir que não percebia, a verdade latejava no peito dele como uma ferida aberta: algo não estava certo. Ele se recusava a acreditar que fosse desamor. Alicia o amava. Ele tinha certeza disso. Talvez fosse o estresse do casamento, a mudança de rotina, saudade da família… qualquer coisa, menos falta de sentimento. Foi por isso que ele preparou o jantar. Fez questão de cuidar de cada detalhe. Reservou um restaurante lindo, à beira da praia, com vista para as luzes da cidade refletindo no mar. Pediu flores na mesa, champanhe gelado e uma sobremesa que ela adorava. Colocou a melhor camisa, passou o perfume que ela sempre dizia adorar, ajeitou o cabelo com cuidado. Ele queria reacender aquela chama. Precisava provar a si mesmo que tudo fica

O jantar seguia animado, música ambiente preenchendo o apartamento, taças tilintando, conversas paralelas. Mas Alicia não escutava nada. Estava atenta a outra frequência, uma vibração quase invisível entre ela e João. Um olhar mais prolongado. Um desvio rápido quando alguém percebia. E sempre aquele arrepio subindo pela espinha. Foi quando a tragédia pequena, mas perfeita, aconteceu: o vinho. Na tentativa de pegar um guardanapo, uma das convidadas esbarrou no braço de Alicia e a taça virou direto sobre seu vestido claro, manchando-o com um vermelho intenso. — Ai, meu Deus! — ela soltou num reflexo, tentando disfarçar o constrangimento. — Preciso trocar isso, senão vai fixar. — Vai lá, amiga. — Juliana disse, passando o braço pelas costas dela. — Quer ajuda? — Não, tranquilo. Eu troco rápido. — Alicia respondeu, desviando o olhar, quase aliviada por ter um pretexto para se afastar daquela tensão toda. Seguiu apressada pelo corredor, o som abafado da festa atrás de si, o coração b

A mesa estava posta com perfeição. Taças de cristal alinhadas, talheres reluzindo sob a luz quente dos lustres. Roberto organizara tudo com dedicação — um jantar intimista em seu apartamento para reunir a nova esposa e o pai. Segundo ele, era o momento ideal para fortalecer os laços familiares. Afinal, agora eram um só. Pai, filho e esposa. Família.Mas ninguém ali estava pronto para a farsa que aquele jantar seria.Alicia sentia o estômago revirar desde o convite. Durante o dia, tentou convencer Roberto a cancelar, alegando cansaço, compromisso no consultório, qualquer desculpa. Mas ele insistiu. — Vai ser bom pra gente. Um clima leve. — disse com aquele sorriso inocente e sincero de quem não fazia ideia do furacão que devastava a mulher ao lado.João chegou pontual. Camisa social impecável, os cabelos grisalhos penteados com precisão, um perfume forte e sofisticado que Alicia reconheceu de longe. O mesmo perfume que impregnava a lembrança da noite quente na Grécia. O mesmo perfume q

O peso da culpa estava dilacerando Alicia por dentro. Ela sentia a vida escorrendo pelos dedos, como areia fina, difícil de segurar. Quanto mais tentava manter o casamento funcionando, mais percebia o abismo entre ela e Roberto crescendo, silencioso, cruel, implacável.Nos últimos dias, Roberto estava diferente. Seus gestos, suas palavras… nada era como antes. Ele ainda tentava ser o marido perfeito, mas havia algo quebrado ali, uma linha invisível que os separava. Alicia não precisava de explicações — ela sabia que o motivo daquele afastamento era ela. A culpa escorria por sua pele, latejava no peito.Ela tentava, com todas as forças, agir normalmente. Preparava cafés, sorria em jantares, se deitava ao lado do marido fingindo serenidade. Mas a mentira pesava. Não era apenas uma mentira para ele. Era uma traição com ela mesma.As noites se tornaram mais longas, e os banhos mais demorados. Ela esfregava a pele como quem tentava apagar marcas invisíveis, mas não havia sabonete que lavas

O sol começava a se pôr quando Alicia chegou ao café discreto no centro da cidade, vestida com um casaco leve e os olhos escondidos por um par de óculos escuros. Ela estava nervosa. As mãos tremiam. As palavras, ensaiadas durante a noite inteira, pareciam ter evaporado no trajeto. O coração batia forte, pesado. Era o momento de enfrentar o homem que vinha ocupando seus pensamentos mais íntimos, mas também o homem que, sem querer, estava prestes a implodir a vida que ela mesma construiu.João chegou poucos minutos depois. Mesmo de longe, Alicia reconheceu seu caminhar firme e o peso que carregava nos ombros. Ele parecia mais magro, mais abatido. O olhar dele a encontrou através do vidro do café e, por um instante, tudo ao redor desapareceu. Quando ele entrou, o ar ficou mais denso, como se as paredes sussurrassem: "Enfim, juntos".— Alicia...— João.Eles se sentaram de frente um para o outro. Nenhum dos dois tocou nos cardápios. Um silêncio desconfortável pairou por segundos que parec