Laura sentiu o coração acelerar, mas tentou manter a compostura. A simples proximidade fazia sua presença parecer ainda maior.
— Sinto muito. De verdade. — ela disse sem arriscar olhar para ele. — Sente? — Ele voltou a posição, dando uma risada amarga. — Porque olhando para você agora, parece que está tudo resolvido na sua cabeça. Laura mordeu os lábios, segurando as lágrimas que ameaçavam cair. — Você não entende, Miguel. Fiz o melhor que pude na época. — Não, Laura. Você fez o que era mais fácil. Aquelas palavras atingiram-na como um golpe. Ela saiu do carro, afastando-se alguns passos. Ele foi atrás e ela finalmente virou-se para encará-lo. — Você acha que foi fácil deixar você? Abandonar tudo o que tínhamos? Você nunca entenderia. — disse vagamente. — Então me explique! Porque até hoje eu não sei o que aconteceu. Aquelas palavras pesaram no ar como uma acusação irrefutável. Ela desviou o olhar, encarando a estrada vazia como se procurasse uma saída. Respirou fundo, e quando voltou a olhar para ele, seus olhos brilhavam com uma mistura de tristeza e determinação. — Meu pai estava doente, Miguel. Alzheimer. — Ela fez uma pausa breve, era doloroso revisitar aqueles momentos. — Ele estava piorando rápido e eu não sabia como lidar com tudo sem te arrastar junto. Miguel a encarou, o choque era evidente em seus olhos. Ele nunca havia imaginado que esse era o motivo, mas a revelação não foi reconfortante. Pelo contrário, parecia apenas aprofundar o vazio que ele carregava. — Talvez eu quisesse estar ao seu lado, Laura. A voz dele soava suave, mas intensa, repleta de uma angústia silenciosa. — Eu teria escolhido você, não importando as circunstâncias. — Esse era o problema, Miguel. — Ela disse parecendo convicta, mas os olhos estavam marejados. — Eu sabia que você ficaria por mim, e eu não podia te assistir se apagando, preso a uma vida que não era sua. Ele olhou para ela com dor nos olhos, mas sem raiva. — Então, você tirou meu direito de escolher e decidiu por mim. — Porque eu sabia qual seria a sua escolha. — ela sussurrou olhando para a estrada. — E você não considerou que talvez, só talvez, eu pudesse encontrar outra maneira? Que estar ao seu lado era mais importante do que qualquer sonho? Laura tentou responder, mas sua voz sumiu por um momento. Ela respirou fundo e finalmente o encarou novamente. — Não. Eu só conseguia pensar no meu pai. E te amava demais para deixar você se destruir por mim. Miguel sacudiu a cabeça, incrédulo. Ele ficou quieto, os olhos se fixando nos dela com uma intensidade que parecia incandescer, cheios de dor. Passou a mão pelo rosto, tentando segurar as lágrimas que estavam prestes a escorregar. — Você faz ideia de como foi para mim depois que você foi embora. — a voz dele era cheia de amargura. — Tive que me tornar outro homem, para não viver assombrado pelo fantasma de quem eu era com você. Ele deu um passo para trás, levantando as mãos para pedir que ela se afastasse. Precisava de espaço para processar tudo. Laura sentiu as palavras de Miguel atravessarem sua fachada como uma lâmina, atingindo direto o lugar que ela mais tentava proteger. Mas nada que dissesse poderia consertar o que estava quebrado. Ela respirou fundo, endireitando a postura como se vestisse uma armadura, e levantou o queixo, decidida a esconder qualquer vestígio de arrependimento que insistia em ameaçar sua compostura. Seu olhar encontrou o dele por um instante, e ela viu a mistura de dor e descrença naqueles olhos que antes eram um refúgio para ela. — Miguel, não vou me desculpar por uma escolha que, na época, parecia ser a única saída. As palavras soaram frias até para ela mesma, mas eram a única defesa que tinha contra a avalanche de emoções que ameaçava desmoronar. — E você seguiu em frente. Olha para você agora. O que aconteceu entre nós, já não importa mais. Eles se encararam, os olhos de ambos brilhando com emoções reprimidas. Antes que qualquer um deles pudesse dizer mais alguma coisa, o som de um caminhão se aproximando anunciou a chegada do guincho. Miguel desviou o olhar primeiro, voltando para o carro sem dizer mais nada. Laura fechou os olhos por um momento, tentando se recompor. Aquele confronto estava longe de terminar.