Carlos Eduardo Salvatore
Saí do meu escritório de arquitetura, sentindo o peso do dia de trabalho se dissipar com o sol brilhante do Rio. O ar orla estava fresco e cheirava a sal, e eu não pude resistir à tentação de passar pela praia antes de ir para casa. Eu precisava sentir o contato com o mar, deixar que o som das ondas e o vento no meu cabelo limpasse a minha mente. Peguei minha prancha de surfe no carro e caminhei em direção à areia. A praia estava movimentada, com pessoas aproveitando o final de tarde, mas eu sabia exatamente onde encontrar as melhores ondas. Eu havia crescido surfando nessas águas, e conhecia cada curva e cada corrente. Me preparei, ajustando a prancha e o cabresto, e então mergulhei nas ondas. O contato com a água fria foi revigorante, e eu senti meu corpo relaxar enquanto começava a remar. As ondas passaram por mim, e eu esperei pelo momento certo para pegar a próxima. Quando a onda certa veio, eu me levantei na prancha e comecei a surfar. O vento no meu rosto, o sol nos meus olhos e a sensação de liberdade enquanto deslizava sobre a água... era disso que eu precisava. Por alguns momentos, eu esqueci de tudo: o trabalho, das preocupações, das responsabilidades. Era apenas eu com a onda, o mar e o sol. Depois de algumas ondas, eu saí da água, sentindo-me renovado e pronto para enfrentar o resto do dia. Eu me sentei na areia, observando o sol se pôr sobre o horizonte, e pensei em como era bom viver no Rio. A cidade tinha um jeito de fazer você se sentir vivo, de fazer você se sentir parte de algo maior do que si mesmo. — E aí, Cadu! Beleza? — gritou um garoto que estava construindo um castelo de areia. — Beleza, irmãozinho! — respondi, sorrindo. Um grupo de amigos que estava jogando futebol na praia me chamou. — Cadu, vem jogar com a gente! — gritou um deles. — Não posso, pessoal! Tenho que ir embora — respondi, acenando para eles. Um velho cliente, que estava lendo um livro na areia levantou os olhos e me cumprimentou. — Olá, Cadu! Você está cada vez melhor na prancha! — Obrigado, seu Caio! — respondi, sorrindo. Me levanto e continuo caminhando pela praia, sentindo-me parte da comunidade. Todos me conhece, e eu conheço muitos deles. Era um sentimento agradável, saber que eu faço parte daquele lugar. Depois de alguns minutos, eu chego ao meu carro e guardo minhas coisas. Eu me sinto renovado e pronto para continuar a reforma no meu apê novo. A praia tinha um efeito mágico em mim, e eu sabia que sempre voltaria para ela. Dirijo pelas ruas, o vento fresco da noite no meu rosto e o velho e bom pagode toca no meu carro me fazendo batucar os dedos ao volante. Estava ansioso para trocar o piso do apartamento, o havia comprado há alguns meses, e estava determinado a transformá-lo em um lugar incrível. Chegando ao prédio, eu pego as ferramentas no carro para começa a trabalhar. O apartamento estava um caos, com paredes descascadas e pisos desgastados. Mas eu via o potencial, e estava determinado a fazer dele um lugar incrível. Entro não perco tempo e começo a organizar as coisas, tentando dar um sentido à bagunça deixada pelas caixas da mudança, retiro os itens da cozinha e coloco dentro do armário, depois de alguns minutos, percebo que havia esquecido de comprar açúcar na volta para casa, infelizmente esse é meu vício, uma formiga total para doce mas antes de decidir qualquer coisa, realmente preciso de um banho pra retirar o restante da areia do corpo. Já no banheiro, retiro a roupa suja da mochila e coloco no cesto, ligo o chuveiro, sentindo o jato de água quente relaxar seus músculos cansados. A areia da praia começou a escorrer pelo seu corpo enquanto me se ensaboo, sentindo-me novo em folha. O banho rápido foi exatamente o que eu precisava para se sentir fresco e preparado para bater à porta da vizinha do “308” e pedir que ela me salve mais uma vez. Coloco os chinelos e com a xícara em mãos, ando pelo corredor lembrando o quanto a senhora da porta ao lado foi simpática no dia da minha mudança. — TOC TOC TOC, torço para que ela ela atendesse, e eu não precise ir até o mercado. Escorado à porta e com a xícara dançando na mão, eu disse quando a porta finalmente se abriu: — Boa noite, para a vizinha mais gata do andar. Mas... — Fico totalmente surpreso ao ver que não era a Sandra, mas sim, uma mulher bem mais jovem diante de mim. Com uma cara estranha toda amassada, parecendo sonolenta, cabelos bagunçados e ajeitando os óculos no rosto mesmo assim muito linda. Ela me olhou com uma expressão confusa, como se não soubesse se já havia amanhecido ou não, ela foi acordada e não gostado nem um pouco disso. Seu olhar passou por mim, demorando-se na subida e parando na xícara que eu segurava, antes de finalmente focar em meu rosto.